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aurelius

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Que significa “tomar a cruz”?

aureliano, 29.08.20

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22º Domingo do Tempo Comum [30 de agosto de 2020]

[Mt 16,21-27]

Estamos no capítulo 16 de Mateus, exatamente no momento posterior à profissão de fé de Pedro: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”. Se antes era “bem-aventurado” (“Bem-aventurado és tu, Simão, filho de Jonas...”), agora Pedro é cognominado de “satanás”: “Afasta-te de mim, Satanás! Tu me serves de pedra de tropeço, porque não pensas as coisas de Deus, mas as dos homens” (Mt 16,23). Essa contradição no texto de Mateus sugere algumas possíveis interpretações: revela que Pedro proclamava o Messias Salvador pela força do Espírito, sem compreender ainda o que dizia; também pode ser algo revelador da fragilidade de Pedro, que não conseguiu manter-se firme diante da cruz; pode ainda expressar uma exaltação da instituição eclesial pela comunidade, tardiamente; segundo alguns autores, parece demonstrar a dificuldade que a Igreja tinha, representada na pessoa de Pedro, em assumir a cruz, a perseguição por causa do Evangelho.

Bem. Para além das questões exegéticas, muito embora importantes para fiel interpretação do texto, queremos que o relato que proclamamos hoje seja uma luz para nossa vida cristã. E um fato, sem dúvida, norteador do episódio de hoje é a cruz.

A cruz era o instrumento de suplício que os romanos aplicavam aos revoltosos contra o regime imperial. Era o pior castigo que uma pessoa podia receber: afixados à cruz, nus, à beira do caminho para que todos pudessem ver e se intimidar, deixados por lá até à morte. Muitos eram devorados pelas aves de rapina. A crucifixão, segundo o historiador Flávio Josefo, era um horror.

Quando Jesus fala da cruz como projeto de vida, ele não quer dizer com isso que gosta de ver seu discípulo sofrer; muito menos que ele mesmo quer sofrer. Seria uma insanidade! Jesus não é sado-masoquista, nem paranoia. Quer apenas dizer que o projeto do Pai que ele veio anunciar e realizar não visa ao sucesso, à realização pessoal apenas, mas implica rejeição, perseguição, dor e morte produzidas pela ganância de poder e de ter que pervade a sociedade. Em outras palavras, o seguimento de Jesus implica cruz por ser um projeto de vida num mundo imbuído de um projeto de morte. “Quem quiser salvar a sua vida, vai perdê-la, mas quem perder a sua vida por causa de mim, vai encontrá-la”. Deus não quer ‘sacrificar’ as pessoas (isso já o faz a sociedade idolátrica), mas quer testemunhas de seu projeto: mostrar que Deus ama a humanidade e quer que todos vivam esse amor.

Por vezes confundimos a cruz com qualquer desgraça que acontece na vida ou mal-estar produzido pelo nosso próprio pecado. Jesus não está falando desse tipo de sofrimento. Tomar a cruz aqui significa assumir nossa profissão de fé, encarnar na vida as palavras e atitudes de Jesus. Seria um erro confessar a Jesus “Filho do Deus vivo” e negá-lo na vida cotidiana.

Tomar a cruz é assumir a atitude cristã de doar-se, de deixar-se seduzir pelo amor de Jesus (cf. Jr 20,7), assumindo uma atitude de combate ao consumismo, à ambição, à destruição da mãe Terra, à violência contra as crianças, adolescentes e jovens, à violência e desrespeito às mulheres, ao desprezo e desrespeito para com os idosos.

Tomar a cruz é assumir na própria vida os sentimentos de Jesus. Olhar as pessoas com o olhar de Jesus, acolhendo as diferenças, aceitando com serenidade as críticas, enfrentando e vencendo os preconceitos, tendo coragem de andar na contramão da história por causa de Jesus. É estar atento àqueles que passam por dificuldades e colocar-se ao lado deles. “Ele (Jesus) sempre se mostrou cheio de misericórdia pelos pequenos e pobres, pelos doentes e pecadores, colocando-se ao lado dos perseguidos e marginalizados” (Prefácio da Oração Eucarística VI - D).

Tomar a cruz é assumir posturas e projetos que defendem a vida contra os projetos de morte. É renovar nossa maneira de ver e de julgar; renovar nossa mentalidade, deixando de pensar e de viver a lógica do mundo enquanto é injusto, ganancioso, mentiroso, perverso e enganador, para fazer a vontade de Deus (cf. Rm 12,2).

Assumir a cruz de cada dia é o nosso culto espiritual (cf. Rm 12,1). Numa nova mentalidade, pensar como Deus e não como os homens (Mt 16,23).     Isso é tarefa para todos os dias da vida!

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

As consequências da profissão de fé

aureliano, 22.08.20

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21º Domingo do Tempo Comum [23 de agosto de 2020]

[Mt 16,13-20]

Este relato do evangelho de Mateus é um marco muito importante, pois mostra dois modos de compreender a pessoa de Jesus: um modo confuso (messias milagreiro, resposta para todos os problemas); e uma confissão clara: “Tu és o Messias, o Filho do Deus vivo” (messianidadade de Jesus). Pedro, representando todos os discípulos, estabelece com sua resposta, uma nova fase no seguimento de Jesus. Com isso Jesus afasta a falsa concepção messiânica que habitava o coração dos fariseus, saduceus e mesmo dos discípulos. Demonstra que sua messianiadade se manifesta no sofrimento da cruz como entrega de sua vida, passagem "necessária” para a glória da ressurreição (cf. Mt 16,21-28).

A confissão de Pedro brotou da pergunta de Jesus a respeito da compreensão que tinham de sua própria identidade: “E vós, quem dizeis que eu sou?” Pedro, não pela própria força, mas por inspiração do Alto, faz a profissão de fé: “Tu és o Filho do Deus vivo”. A fé é dom do Pai que deve ser cultivado por aquele que crê pela relação de intimidade com o Mestre e Senhor.

Essa fé proclamada por Pedro precisa continuar ressoando dentro de nós. Que significado tem para nós confessarmos que Jesus é o Filho de Deus? Que lugar ele ocupa em minha vida, em minhas decisões, em minhas escolhas? Que sentido tem para minha vida ler a bíblia, ir ao templo, participar da celebração, fazer oração? A minha vida mudou a partir de minha fé? Minha oração me torna mais amável, mais solidário, mais comprometido com os pobres, mais respeitoso com os irmãos, com minha família?

Somos pessoas apaixonadas por Jesus mesmo no meio de indiferenças, injustiças, maldades? Continuamos fiéis a ele também quando a vida sorri para nós? As pessoas com as quais convivemos, trabalhamos podem perceber, notar, ver que realmente acreditamos nele? Nossas atitudes estão no caminho da coerência de vida, na simplicidade, na humildade, na honestidade, no gesto de misericórdia?

Fazemos caminho de discipulado buscando a conversão do coração? Procuramos ver a vida como Jesus? Conseguimos enxergar a imagem dele nos excluídos, nos pobres, nos doentes, nas crianças, nos idosos?

“Seguimos a Jesus colaborando com ele no projeto humanizador do Pai, ou seguimos pensando que o mais importante do cristianismo é preocupar-nos exclusivamente com nossa salvação, com nosso bem-estar? Estamos convencidos de que o modo de seguir a Jesus é viver cada dia fazendo a vida mais humana e mais esperançosa para todos?

Vivemos o domingo cristão celebrando a ressurreição de Jesus, ou organizamos nosso fim de semana vazio de sentido cristão? Aprendemos a encontrar a Jesus no silêncio do coração, ou sentimos que nossa fé vai-se apagando, afogada pelo ruído e vazio que há dentro de nós?

Cremos em Jesus ressuscitado que caminha conosco cheio de vida? Vivemos acolhendo em nossas comunidades a paz que deixou como herança aos seus seguidores? Cremos que Jesus nos ama com um amor que nunca acabará? Cremos em sua força renovadora? Sabemos ser testemunhas do mistério de esperança que levamos dentro de nós?” (Pe. José Antônio Pagola).

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CONTINUANDO A REFLEXÃO...

A profissão de fé de Pedro é a base da comunidade cristã: "Tu és o Cristo, o filho de Deus vivo". É nessa fé que a Igreja se firma e caminha. É o Espírito Santo que sustenta a caminhada da Igreja. Ela não se instituiu sobre "carne e sangue", mas no Amor gratuito do Pai revelado na entrega livre do Filho pela salvação da humanidade (cf. Jo 10,18).

As "chaves do Reino" que são confiadas a Pedro devem sempre abrir as cadeias e algemas daqueles que estão dominados pelo mal. Quanta gente presa nas amarras da mentira, da ambição, da corrupção, do ódio, do medo, do preconceito, da enganação! Nosso mundo precisa, cada vez mais,  das "chaves do Reino" para abrir a mais partilha, mais sentido de vida, mais perdão, mais fraternidade e compreensão.

Pedro foi encarcerado por causa da fé! Levou às últimas consequências sua profissão de fé: "Tu és o Cristo". Paulo também foi preso, ameaçado e perseguido pelos de dentro e pelos de fora. Mas levou até o fim sua missão: "Combati o bom combate, terminei a minha carreira, guardei a fé. (...) O Senhor me assistiu e me revestiu de forças, a fim de que por mim a mensagem fosse plenamente proclamada e ouvida por todas as nações" (2Tm 4, 6-7.17).

Essa profissão de fé proclamada por Pedro e repetida por nós todos os dias precisa encontrar ressonância dentro de nós e em nossa vida. Há muita gente pregando por aí a doutrina católica ou cristã, mas distanciada e descomprometida com Jesus Cristo. Uma “ortodoxia” que não nos compromete com Jesus de Nazaré, morto e ressuscitado, não tem sentido. É vazia e perigosa. Não podemos perder de vista aquelas palavras do juízo final: “Ao que lhes responderá o rei: ‘Em verdade vos digo: cada vez que o fizestes a um desses meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes’” (Mt 25,40).

Não adianta dizer que Jesus é o Senhor se Ele não tem espaço no meu coração, não é o centro da minha vida. Não adianta dizer que Jesus é o Mestre se não o sigo, se não procuro viver seu mandamento de amar uns aos outros, se vivo de costas para Ele, se não me faço discípulo dele. Não adianta proclamar que Jesus é o Salvador, se a vida e o ensinamento dele não são fundamento da minha vida.

Crer é assumir uma atitude de adesão a Jesus. É a busca de uma vida que se conforma cotidianamente à vida dele. É deixar-se seduzir por Ele na conversão cotidiana, transformando a maneira de pensar e de agir (cf. Rm 12,1).

Podemos nos perguntar: até que ponto damos conta de sustentar nossa fidelidade ao Evangelho, levando às últimas consequências nosso batismo? O que é mesmo que nos faz desanimar, abandonar a missão, a comunidade? O "conteúdo" de nossa vida é Jesus Cristo? Ou são as vaidades e posses da sociedade capitalista e consumista? O que preciso deixar e o que preciso abraçar com mais vigor para ser verdadeiro discípulo de Jesus?

*Neste dia dedicado às(aos) catequistas, queremos abraçar a todos(as) pelo serviço generoso de fazer ecoar o amor de Deus no coração de nossas crianças e jovens. Continuem firmes nesse caminho, pois mais do que busca de realização pessoal, vocês estão ajudando nossas famílias a encontrar Aquele que dá o verdadeiro sentido à vida. Jamais abandonem a Palavra de Deus que é fonte viva e eficaz para sua vida, em primeiro lugar, e para os catequizandos. Vale a pena “perder o tempo” (a vida) para doá-lo em favor de nossas crianças e jovens. Deus fortaleça cada catequista, sobretudo nesse tempo de pandemia em que se faz necessário muita criatividade e um jeito novo para tocar o coração dos catequizandos. Diz o Papa Francisco: “Quem é o catequista? É aquele que guarda e alimenta a memória de Deus; guarda-a em si mesmo e sabe despertá-la nos outros”.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

“O Senhor fez em mim maravilhas”

aureliano, 14.08.20

Assunção de Nossa Senhora - 16 de agosto de 2020

Assunção de Nossa Senhora [16 de agosto de 2020]

[Lc 1,39-56]

A solenidade da Assunção de Maria foi celebrada pela Igreja desde eras antigas. O nome da festa era Dormição de Maria. Isto é, Maria, depois de sua peregrinação neste mundo, ‘repousou no Senhor’. A celebração deste acontecimento está intimamente associada à ressurreição de Jesus. A Páscoa da Virgem traz no centro, não a Mãe, mas o Filho, para quem o olhar do fiel se deve voltar. Aquela que colaborou para a Encarnação do Filho de Deus deve participar da sua Ressurreição. Na festa da Assunção de Maria se revela aquilo que todo homem e mulher anseiam: ser acolhidos inteiramente no céu.

O dogma da Assunção de Maria, festejado a 15 de agosto, tem nomes diferentes, como Nossa Senhora da Boa Viagem, Nossa Senhora da Glória, Nossa Senhora dos Prazeres etc. Foi proclamado por Pio XII, em 1950, com a Bula ‘Munificentissimus Deus’, com o seguinte texto: Definimos ser dogma divinamente revelado: que a imaculada mãe de Deus, sempre virgem Maria, cumprindo o curso de sua vida terrena, foi assunta em corpo e alma à glória eterna”.

A bíblia não fala nada a respeito do final da vida de Maria. São João mostra que ela, aos pés da cruz, foi dada, pelo Filho que entregava a sua vida, à comunidade como mãe (Jo 19, 27). Lucas nos diz que ela estava junto ao grupo que se preparava para a vinda do Espírito Santo, em Pentecostes (At 1,13s e 2,1). Então a bíblia não conta detalhes sobre o final da vida de Maria.

Nos primeiros séculos, os cristãos tinham o costume de guardar os restos mortais dos santos, especialmente dos apóstolos e mártires. Não há, porém, nenhuma notícia sobre o corpo de Maria. Os evangelhos chamados apócrifos, isto é, aqueles relatos sobre a vida de Jesus e dos atos apostólicos que não entraram na ‘lista’ (cânon) dos livros que a Igreja considerou inspirados por Deus, contam histórias da chamada Dormição de Maria. E assim, no século VIII, a devoção popular criou uma história para contar como se deu a morte e a ressurreição de Maria.

O dogma da Assunção só pode ser compreendido em relação à Ressurreição de Jesus. Maria, diferente de nós, não precisou esperar o fim dos tempos para receber um corpo glorificado. Depois de sua vida terrena ela já está junto de Deus com o corpo transformado, cheio de graça e luz.

Ainda mais. Não podemos entender a Assunção como se Maria subisse ao céu com o corpo que ela possuía aqui na terra, com ossos, pele, carne, sangue. Não é assim que a Igreja interpreta a ressurreição dos mortos. O corpo de Jesus ressuscitado e o de Maria assunta foram transformados e assumidos por Deus. Paulo deixa bem claro: “... O mesmo se dá com a ressurreição dos mortos: semeado corruptível, o corpo ressuscita incorruptível; semeado desprezível, ressuscita reluzente de glória; semeado na fraqueza, ressuscita cheio de força; semeado corpo psíquico, ressuscita corpo espiritual” (1Cor 15,42-44a).  Por isso cremos que Maria já está glorificada junto de Deus, toda inteira. Ela antecipa o que está prometido para cada um de nós: participar do banquete da Vida que o Senhor preparou para “aqueles que o amam” (cf. 1Cor 2,9).

O cântico de Maria no evangelho de hoje diz que o Senhor “olhou para a humildade de sua serva. Doravante todas as gerações me chamarão de bem-aventurada, pois o Todo-Poderoso fez grandes coisas em meu favor... Agiu com a força de seu braço, dispersou os homens de coração orgulhoso. Depôs os poderosos de seus tronos, e a humildes exaltou”. Aí está a ação de Deus na vida de Maria, a humilde serva do Senhor, que decidiu responder sim ao chamado de Deus para participar na obra da salvação da humanidade. Sua humildade e fidelidade ao projeto do Reino de Deus lhe valeram a participação na glória de Deus, ao lado de seu Filho. Maria é aqui figura da Igreja, que deve levar adiante, não obstante as perseguições e sua pequenez, a missão de Jesus.

O evangelho da liturgia de hoje traz dois relatos: a Visita de Maria a Isabel e o chamado ‘Cântico de Maria’. O primeiro mostra Maria como aquela que assumiu inteiramente o projeto do Pai na sua vida. Não mede esforços para prestar um serviço à sua parenta em necessidade. E no seu encontro com Isabel manifesta-se a sua fé profunda: “Feliz aquela que acreditou, pois o que lhe foi dito da parte do Senhor será cumprido”. Todo aquele que deposita sua confiança em Deus, colaborando na realização do sonho de Deus para a humanidade, é feliz. O relato manifesta também o reconhecimento por parte de Isabel de que aquele que Maria trazia no seio é o Senhor: “Donde me vem que a mãe do meu Senhor me visite?”. Maria é Mãe de Deus e bem-aventurada: “Bendita és tu entre as mulheres”.

O segundo relato é um hino inspirado no cântico de Ana (1Sm 2, 1-10) que canta a ação de Deus em favor da humanidade. É um hino jubiloso que proclama a derrubada dos poderosos e a elevação dos humildes pela ação de Deus em Jesus. É a oração dos pobres que confiam em Deus e no seu poder sobre o mal. Um hino que empenha o fiel nessa luta como Maria.

Quando lemos o evangelho e vemos Maria assumindo como primeira atitude, depois de ter acolhido em seu seio o Filho de Deus, a de levar seus préstimos para a prima Isabel, somos levados a pensar em nossas atitudes. Nossa sociedade se deixa levar cada vez mais por uma atitude egoísta que leva a terceirizar a caridade e os cuidados para com aqueles que, por vezes, de dentro da nossa casa, são considerados peso e empecilho para passeios, curtição, jogos, prazeres, baladas...

Mas é preciso ressaltar, porém, que ainda nos deparamos com famílias que cuidam dos seus com afeto, carinho, respeito e espírito cristão. Pessoas com necessidades especiais cuidadas com um zelo divinal, marial. Uma presença muito parecida com a de Maria: escuta do ancião que quer contar um caso; visita a um casal em dificuldade de relacionamento; uma palavra de conforto e uma oração com a família que vive a dor da perda de um ente querido; presença nos abrigos, asilos, orfanatos e hospitais onde se encontram pessoas passando por sofrimento, dores e dificuldades.

Para além dos gestos personalizados, faz-se necessário empenho na luta por políticas públicas que atendam às necessidades dos menos favorecidos. Participação em conselhos comunitários e associações que se empenham pelos direitos do cidadão e da comunidade, sobretudo nestes últimos tempos em que houve grandes perdas de direitos adquiridos. São gestos simples que nos colocam em sintonia com o ensinamento de Jesus e com as atitudes de fidelidade de Maria, sua Mãe. A recomendação permanente do Papa Francisco é que a Igreja se coloque “em saída”, como “hospital de campanha” que não pergunta pelo que conteceu, mas que se preocupa em cuidar, aliviar o sofrimento e curar as feridas.

A assunção de Maria foi o resultado do seu peregrinar à luz de Deus nesse mundo. Cada vez que ela dava novos passos para seguir a Jesus, para buscar a vontade de Deus, o Senhor assumia e transformava sua pessoa. Até que chegou o momento final. É o que está reservado para nós! Na vida de fé, cada passo novo que damos corresponde da parte de Deus a nos acolher, tomar pela mão, assumir e transformar. A nós resta-nos deixar que Deus nos tome pela mão e nos faça discípulos fiéis, dedicados, humildes e perseverantes como Maria, enquanto aguardamos a bendita esperança da ressurreição.

*Encerramos, hoje, a Semana Nacional da Família. Com o tema “Eu e minha família serviremos ao Senhor” a Igreja propôs uma reflexão para se fazer em casa sobre o sentido da família cristã: “Na alegria do Evangelho queremos viver plenamente a vontade do Senhor em nossas vidas, em nossas famílias, em nossas casas. Neste ano, o subsídio Hora da Família convoca todos os grupos de reflexão para vivenciarem a dimensão do serviço. O ‘Hora da Família’ se coloca a serviço da Igreja e da construção do Reino de Deus começando em nossas casas” (Dom Ricardo Hoepers). Vamos agradecer a Deus pela família que temos e pedir a Ele a graça de nos solidarizarmos e trabalharmos pelas famílias em dificuldade, particularmente nesses tempos sombrios e angustiantes da pandemia do coranavírus. Uma família animada pela espiritualidade cristã traz vida, alegria e esperança para a sociedade e para o mundo.

**Nosso abraço carinhoso às pessoas consagradas nesse seu dia: deixaram tudo para viver mais radicalmente o evangelho, numa vida semelhante à do Filho de Deus: pobre, casto e obediente. Um serviço generoso ao Reino “para que todos tenham vida”. Uma vida pobre na solidariedade com os empobrecidos e ‘sobrantes’ e na busca da partilha dos bens e dos dons: mesa comum. Uma vida obediente na solidariedade com os que não são ouvidos nem levados em conta: ouvidos atentos ao Pai e aos sinais dos tempos. Uma vida celibatária consagrada em solidariedade com aqueles e aquelas que sofrem por falta de amor, de afeto; com aqueles e aquelas que não podem experimentar a beleza e a alegria da colhida afetuosa e gratuita: abandonados, deserdados, abusados, explorados afetiva e sexualmente; uma contestação de uma sociedade baseada na busca do prazer e do lucro ao preço da dignidade da pessoa humana. Que Maria, nossa boa Mãe, nos ajude a viver com alegria nossa consagração para que seja um “sacrifício de louvor”.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

Atitude confiante: “Senhor, salva-me”

aureliano, 07.08.20

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19º Domingo do Tempo Comum [09 de agosto de 2020]

[Mt 14,22-33]

O relato de hoje está em continuidade com o relato da multiplicação dos pães (Mt 14,13-21). Aquele Jesus que multiplicou os pães, dando um sinal do Reino anunciado nas parábolas do capítulo 13 de Mateus, tem poder também sobre a tempestade do mar (como nos relatos teofânicos do Antigo Testamento). N’Ele se pode confiar. O discípulo pode assumir a participação em sua vida: “Dai-lhes vós mesmos de comer”, pois nas tempestades da vida, ele está junto, não abandona.

É interessante fazer a leitura da simbologia presente neste relato: o mar revolto, na mitologia antiga, representava o domínio das forças do mal. Aquilo que o homem não conseguia explicar ou dominar ele o atribuía a forças superiores: ou deuses, ou anjos, ou demônios, ou monstros marinhos. A noite significava o domínio das trevas. O barco, a realidade de cada um em meio aos desafios: ondas e ventos. Pode também significar a comunidade que faz experiências diferentes: sem a presença de Jesus, é tomada pelo medo; com Jesus, acalma-se e continua sua missão.

O evangelho de hoje nos ajuda a repensar muitas coisas. Primeiro, mostra Jesus orante. Mateus mostra Jesus orando apenas duas vezes: aqui, depois da multiplicação dos pães, e no Monte das Oliveiras, antes da sua prisão. Lucas já é mais farto em mostrar essa dimensão de Jesus. O fato é que Jesus reservava tempos fortes de oração ao Pai. E o fazia muitas vezes sozinho. Essa atitude de Jesus apresentado nos evangelhos nos faz perguntar: qual o tempo que reservo para a oração, a leitura orante da bíblia, para a celebração? Sem oração, vida de intimidade como o Pai, não se podem vencer as “tempestades” da vida.

Outro elemento é a relação de Jesus com os discípulos e com Pedro, particularmente: não os abandona à mercê das tempestades. Os discípulos quando viram Jesus, pensaram que fosse um fantasma e ficaram com medo. Ninguém podia dominar o mar, caminhar sobre ele! Jesus diz aquelas confortadoras palavras: “Tende confiança, sou eu, não tenhais medo”. A certeza de que Deus caminha conosco, que não nos abandona no meio das dificuldades é muito confortador! Sem a presença dele ficamos apavorados e com medo. Com ele ficamos serenos e confiantes. Pedro até arrisca caminhar sobre as águas! Mas a atitude de Pedro serviu de lição para si mesmo e também para nós. Jesus não pretende que seu discípulo caminhe sobre as águas, faça espetáculo, sinais mirabolantes. Por isso Pedro afunda. Todo aquele que confia em si mesmo, que busca o poder, assume atitude de dominação, assume atitudes de autossuficiência está na contramão do ensinamento de Jesus. E, consequentemente, afunda-se a si mesmo e aos outros. Nossa atitude deve ser sempre parecida com a de Jesus: confiar no Pai e estender a mão àqueles que estão afundando no mar da maldade, da injustiça, do sofrimento. Quantas pessoas a nos dizer todos os dias: “salva-me!”.

Um elemento que não pode passar despercebido é também a dimensão da fé. Muitas vezes entende-se fé como o conhecimento intelectual de um conjunto de verdades e doutrinas proclamadas e proferidas com os lábios. O relato do evangelho de hoje manifesta claramente que fé é um dom de Deus que precisa ser cultivado e que se manifesta em atitude de vida.  É uma abertura confiante a Jesus Cristo como sentido último da existência. É ter a coragem de “caminhar sobre as águas”. Ou seja, entregar-se confiante a Deus e não aos ídolos cotidianos que nos iludem, sugam nossas energias e desviam nossa atenção do caminho do bem. É viver sustentados não por nossas seguranças materiais e argumentos puramente racionais, mas por nossa confiança n’Aquele que nos toma pela mão. Aquele que nos move a dar a mão a quem está sendo sufocado pela maldade humana ou pelas dores da vida. É egoísmo rezar: “Senhor acalma minha tempestade”, quando não me sensibilizo diante da tempestade do outro que pode ser maior do que a minha. Ou pior ainda, quando sou motivo de tempestade na vida do outro trazendo-lhe dor, sofrimento, angústia, miséria.

Por outro lado, este relato dá margem para refletir sobre as incertezas e falta de fé muito presentes em nossa sociedade contemporânea. Hoje já se fala de sociedade pós-cristã. Experimentamos uma realidade social religiosa, porém sem fé cristã. Muitos buscam expressões e manifestações religiosas, mas não querem se comprometer com a fé proclamada. Fazem da religião uma espécie de supermercado. Cada um busca na religião o que lhe convém, aquilo que mais lhe agrada ou atende a seus anseios e sentimentos do momento. A falta de fé, as dúvidas, as incertezas não estão longe de nós. Estão dentro de nossas casas, de nossas comunidades, até mesmo dentro de nós ocorre experimentarmos aquele sentimento de Pedro e a atitude dos discípulos - medo, insegurança, incerteza - que mereceram a advertência de Jesus: “Homem fraco na fé, por que duvidaste?” (Mt 14,31). Por outro lado, Jesus o tomou pela mão, bem como dissera aos discípulos: “Tende confiança, sou eu, não tenhais medo” (Mt 14,27).

Finalmente, um grande ensinamento deste relato é o modo como Deus se manifesta: na brisa suave (1Rs 19, 9-13). Nosso Deus não é um Deus da ameaça, do medo, da punição, do castigo. De jeito nenhum. O Deus que Jesus revela é um Deus misericordioso, manso, que se dá a conhecer nas pequenas coisas. Isso não significa que seja um Deus de moleza, complacente, pois tem mais força do que o mar. Ele quer que não tenhamos medo, mas uma fé confiante. E essa fé não é de momento, de entusiasmo, como fogo de palha, mas constante, indo até Ele sem se deixar “levar pelas ondas”.

Senhor, salva-nos da corrupção, da falta de ética, da mentira, da perversidade de coração que ameaça milhões de brasileiros desempregados, injustiçados e invisíveis. Salva-nos, Senhor, de gente corrupta, mentirosa e depravada. Salva-nos, Senhor, quando a mesquinhez e a ganância ameaçam tomar conta de nosso coração. Salva-nos, Senhor, quando a fé, a confiança, a esperança se mostrarem enfraquecidas e ressequidas pelas ondas do materialismo, do hedonismo, do narcisismo, do desencanto e do relativismo. Salva-nos, Senhor! Toma-nos pela mão, sobretudo quando nos faltarem forças, quando o desânimo nos ameaçar, quando a escuridão embaçar nossos horizontes. Salva-nos, Senhor! Toma-nos pela mão! Tira todo medo de nosso coração. Ajuda a nossa pouca fé! Amém.

*Nesse mês consagrado às vocações seria bom intensificarmos nossa oração pelas vocações e também promovermos o trabalho vocacional em nossas comunidades. Muitas pessoas não assumem ministérios na comunidade ou mesmo não entram para a vida consagrada e presbiteral por falta de motivação, apoio. Que você tem feito pelas vocações?

**Comemoramos neste domingo o Dia dos Pais. Penso que seria oportuno lembrarmos, com mais piedade e carinho, de nossos pais, vivos ou falecidos. Fazer uma viagem na nossa própria história e descobrirmos aí motivos para agradecermos ao Pai do céu o dom de nossa vida cuidada pelos nossos pais. Quanta luta, quanto trabalho, quantas angústias nossos pais sofreram e enfrentaram para nos criar e educar! Também seria bom exercitarmos a atitude de perdão para com nosso pai se porventura temos motivo para isso: naquelas situações que nosso pai não exerceu com seriedade e responsabilidade a paternidade. Enfim, cada qual sabe como deverá se colocar diante de Deus para louvar e agradecer.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

Repartir o pão de Deus

aureliano, 01.08.20

18º Domingo do TC - A - 02 de agosto.jpg

18º Domingo do Tempo Comum [02 de agosto de 2020]

[Mt 14,13-21]

Mateus retrata dois relatos da multiplicação dos pães, a saber, o relato de hoje e também Mt 15, 32-39. O mesmo ocorre com Marcos. Somente João e Lucas relatam uma única vez. Marcos e Mateus fazem como que uma reprise da primeira, diferindo somente o lugar do acontecimento: a primeira, na Galiléia; a segunda, em território exclusivo dos gentios.

O discípulo está iniciado no Reino de Deus a partir do capítulo 13: as parábolas do Reino. O relato de hoje dá uma amostra para o discípulo de como deve ser o Reino de Deus: curar os doentes e dar pão aos famintos: “Dai-lhes vós mesmos de comer”. A missão da Igreja deve ser a de tomar a defesa dos famintos, distribuindo o pão da Palavra que leva à partilha do pão material, ao cuidado com os mais necessitados. Não adianta a comunidade se reunir para o culto da Palavra, para a oração do Terço, para a Adoração se essa oração não leva a atitudes concretas de comprometimento com o Reino de Deus. O fruto da Palavra, e esta vem primeiro, deve ser a partilha que brota de um coração compadecido como o de Jesus.

É importante observar no relato do evangelho alguns símbolos que nos ajudam a perceber por onde o autor do evangelho nos quer conduzir. O texto fala de 5 pães, de 2 peixes, de 12 cestos e 5 mil homens. O número 5 nos remete à Torá, os cinco primeiros livros da Bíblia, que contêm os Ensinamentos de Deus para todo judeu. Os 5 mil homens podem corresponder àqueles que ouvem e seguem a Lei de Deus. O peixe lembra a presença salvadora de Jesus. Nos primeiros séculos tornou-se o símbolo dos cristãos diante da perseguição romana. Isso porque, em grego, a palavra peixe se escreve IXTUS, como um acróstico para a formulação da fé cristã: Iesùs Xristòs Theòu Uiòs Soteèr, que significa “Jesus Cristo Filho de Deus Salvador”. O número 12, símbolo da plenitude, lembra as 12 Tribos de Israel e os 12 Apóstolos.

Outro elemento como o deserto, lembra o lugar da peregrinação do Povo de Israel e sua organização quando se liberta da escravidão do Faraó; lugar da provação, do encontro com Deus. Aqueles que vêm ao encontro de Jesus querem se libertar do poder opressor de Herodes que, no relato anterior, mandara executar João Batista. O sentar-se na grama também tem seu sentido: sentar-se, na tradição judaica, é sinal de acolhida, de dignidade, de soberania. O pão distribuído recorda o maná que alimentou o povo no deserto. Aqui aponta para a Eucaristia, o Pão que nos alimenta e nos impulsiona à partilha.

Por esses elementos percebemos que esse relato quer nos indicar a pessoa de Jesus como aquele que veio dar um novo sentido à vida. O povo estava como “ovelha sem pastor”’, sequioso de uma palavra, um gesto que enchesse seu coração. E Jesus lhes dirige a Palavra e dá-lhes o pão. Indica o caminho que deve seguir: dar de comer a quem tem fome (cf. Mt 25,31-46).

Não adianta permanecer num ritualismo estéril: preocupação com o que pode e não pode dentro da celebração, mas trazer para a celebração a vida das pessoas, seus anseios, alegrias e dores. É preciso dar um novo sentido às nossas celebrações. Os dois gestos significativos de Jesus quando cura os doentes e alimenta os famintos nos impelem a continuar sua ação no mundo: “Dai-lhes vós mesmo de comer”. A Eucaristia urge consequência em nossa vida.

A propósito da celebração eucarística, os bispos advertem: “É necessário promover uma liturgia essencial, que não sucumba aos extremos do subjetivismo emotivo nem tampouco da frieza e da rigidez rubricista e ritualística, mas que conduza os fiéis a mergulhar no mistério de Deus, sem deixar o chão concreto da história de fora da oração comunitária” (Diretrizes Gerais, 2019-2023, 162). E mais adiante recomendam não desligar fé e vida, culto e misericórdia: “Em tempo de individualismo extremo, em que o eu parece ser o centro de tudo, é preciso dar o salto para uma espiritualidade comunitária, na qual a oração pessoal e comunitária sejam abertas ao coletivo, especialmente aos que estão nas periferias sociais, existenciais, geográficas e eclesiais” (Ibidem, 163).

A multiplicação do pão material mostra que Jesus nos alimenta com o pão que vem de Deus, sua palavra, a mensagem do Reino. É um gesto que inaugura o Reino de Deus. O pão material é o primeiro fruto do pão da Palavra. O pão material não é o último dom, mas é o aperitivo do Reino. Por isso mesmo precisamos cuidar que ele tenha gosto de Deus e não do materialismo. Para isso, antes de realizar o sinal da multiplicação, Jesus “ergueu os olhos para o céu e pronunciou a bênção”. A propósito de remeter tudo o que temos a Deus, dizia um rabino dos primeiros séculos que ‘tomar o alimento sem dar graças é roubar o pão a Deus’. O reconhecimento de que o pão não é nosso, mas de Deus, portanto, para todos.

É missão da Igreja também denunciar toda forma de exploração e de usurpação dos direitos dos pequenos e pobres. A Igreja precisa dizer com Jesus: “Dai-lhes de comer”. Quando o Estado e/ou donos do poder exploram ou cometem qualquer tipo de injustiça que leve a faltar o pão na mesa dos pobres, a Igreja precisa levantar a voz profética, sob pena de ser perseguida e  seus líderes profetas serem assassinados.  “Na dúvida, fique do lado dos pobres” (Dom Pedro Casaldáliga).

É muito oportuno, quanto se trata do cuidado para com os pobres, lembrar algumas palavras do Papa Francisco por ocasião do Encontro Mundial dos Movimentos Populares em Roma (2014): “Terra, teto, trabalho. É estranho, mas quando falo sobre estas coisas, para alguns parece que o Papa é comunista. Não se entende que o amor pelos pobres está no centro do Evangelho.” E acrescenta Francisco que terra, casa e trabalho são “direitos sagrados”, “é a Doutrina social da Igreja”. E pronuncia esse apelo emblemático: “Nenhuma família sem casa. Nenhum camponês sem terra! Nenhum trabalhador sem direitos! Nenhuma pessoa sem a dignidade que o trabalho dá”.

*Neste primeiro domingo de agosto celebramos o Dia do Padre. É oportunidade de agradecermos a Deus pelos padres que passaram por nossa vida, nos ajudaram, nos deram os sacramentos. Alguns já partiram desta vida. Outros continuam no meio de nós. É dia também de rezarmos e refletirmos sobre as vocações sacerdotais. O que você tem feito pelas vocações? Você ajuda, reza, apoia os vocacionados? Você ajuda a nós padres a sermos mais pastores, mais próximos, mais dedicados? Não trate o padre como ‘coitadinho’, não! Ele escolheu essa vocação atendendo ao chamado de Deus e da Igreja. Colocou-se livremente a serviço do evangelho. Precisa ser ajudado a viver com fidelidade e dedicação. E você, cristão leigo/a, deve ajudá-lo a ser um verdadeiro colaborador e servidor das comunidades, rezando por ele, fazendo a correção fraterna quando necessário, sendo colaborativo nos serviços e ministérios da comunidade! Ajudem-nos a sermos mais pastores, mais misericordiosos, mais generosos, mais paternais.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN