Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

aurelius

aurelius

“Escutai o que ele diz”

aureliano, 16.03.19

2º Domingo do Quaresma - C.jpg

2º Domingo da Quaresma [17 de março de 2019]

[Lc 9,28b-36]

O segundo domingo da quaresma apresenta-nos o relato da Transfiguração do Senhor. Antes de tudo é preciso notar que Jesus “subiu a montanha para rezar”. Lucas é o evangelista que mostra a particularidade da oração na vida de Jesus. E não vai rezar sozinho desta vez. Leva consigo alguns dos discípulos. Na oração, seu rosto se transfigura e sua roupa torna-se brilhante. Parece que este relato quer-nos dizer que nossa oração precisa nos transfigurar, nos encher de luz. Fomos iluminados no batismo. Essa luz precisa ganhar cada vez mais força. É a luz de Deus. O pecado quer sempre obscurecê-la. Por isso a necessidade da luta permanente contra o pecado, pois obscurece a mente e o coração.

A sonolência de Pedro e demais companheiros simbolizam nossa indolência diante da graça e da vida em Deus. Paulo, que compreendeu bem a oposição entre pecado e graça, trevas e luz, exorta: “Eis a hora de sairdes  do vosso sono; hoje, com efeito, a salvação está mais próxima de nós do que no momento em que abraçamos a fé. A noite vai adiantada, o dia está bem próximo. Rejeitemos as obras das trevas e revistamos as armas da luz. Comportemo-nos, honestamente, como em pleno dia, sem comezainas nem bebedeiras, sem licenciosidades nem devassidões, sem brigas nem invejas. Mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo” (Rm 13,11-13).

Diante da beleza contemplada, Pedro manifesta o desejo de ficar por ali: “Mestre, é bom estarmos aqui”. Mas ele “não sabia o que estava dizendo”. Pensava que era suficiente estar na montanha em oração. Não queria “descer para Nazaré”. As “Nazarés” da vida são o lugar de confronto com aquilo que rezamos no “monte”. Uma oração que não se encarna na realidade, no cotidiano da vida, não faz sentido. É oca, vazia, alienante como os ídolos que são um “nada” (1Cor 8,4; Sl 96,5). Buscamos a Deus para enfrentar os embates da vida e estes nos fazem buscar a Deus.

Além do mais, Pedro pensou em três tendas iguais. Não soube distinguir o rosto do Senhor. Moisés e Elias não estavam no mesmo nível de Jesus. Seus rostos não resplandeciam. É preciso distinguir o rosto do Senhor. A palavra do Pai é reveladora do seu Filho: alguém a quem se deve escutar: “Este é o meu Filho, o Eleito; ouvi-o” (Lc 9,35). Jesus deve ser sempre ouvido. Nossas decisões, atitudes, gestos devem se inspirar nele.

O rosto transfigurado de Jesus nos leva a pensar nos rostos desfigurados de tantos sofredores, oprimidos, esquecidos, “invisíveis”, marginalizados, vítimas das tragédias-crime. Sobretudo de rostos de jovens violentados, assassinados, desencaminhados, desesperançados, usados, desiludidos. Os rostos dos idosos abandonados, maltratados, incompreendidos, desprezados. O rosto da Mãe Terra, envenenada, maltratada, sucateada. Tanto a Casa Comum como as pessoas esperam por uma reconfiguração à imagem de Jesus. Essa missão é nossa. Como dar uma figura renovada a esses rostos? O que estamos fazendo?

A voz que brota da nuvem confirma Aquele que foi transfigurado: “Este é o meu Filho, o Escolhido. Escutai o que ele diz”. Jesus, transfigurado na montanha, mostrou aos discípulos a beleza de sua interioridade. Habitado pelo Pai e pelo Espírito Santo. Portanto, eles podiam ouvi-lo e segui-lo sem medo, pois é o Filho querido do Pai. Não vão se decepcionar nem se frustrar. É habitado pela divindade e quer transmiti-la àqueles que nele acreditam e o seguem. Quem se compromete com Jesus é tomado por essa Luz e será também transfigurado na ressurreição dos justos.

Ali estavam Moisés e Elias, figuras representativas da Antiga Aliança: a Lei e o Profetismo. A voz do Pai, porém, não pede para ouvi-los, e sim, o Filho. Escutar o que Jesus diz é o que dá identidade à fé cristã. Não basta olhar para Jesus. Não basta admirar-nos da vida que ele levou nem do que ele fez. É preciso nos comprometermos com ele, ouvindo e colocando em prática seus ensinamentos. Assumindo em nossa vida a forma de vida de Jesus (cf. Fl 2,5).

A escuta deve ser a primeira atitude do discípulo. Ouvir é interiorizar, colocar dentro do coração aquela realidade que cremos, em que esperamos. No meio da nuvem os discípulos ficaram com medo. E escutaram a “voz” que lhes trouxe conforto e esperança. Assim também ocorre conosco: em tempos nebulosos, e acometidos pelo medo, o Senhor sempre suscitará uma “voz” e pronunciará uma palavra que desperta a esperança e afugenta o medo. Em tempos de proclamação de muitas vozes, há que se retirar ao “monte” para ouvir e discernir a voz do Pai.  Jesus é a voz, a palavra do Pai. Escutemo-lo. Confiemos nele. Ele não nos decepciona!

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

1 comentário

Comentar post