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aurelius

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Como você se relaciona com o dinheiro?

aureliano, 12.10.24

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28º Domingo do Tempo Comum [13 de outubro 2024]

   [Mc 10,17-30]

No evangelho do domingo passado refletimos sobre Jesus orientando a vida familiar. A relação conjugal não se fundamenta numa relação de dominação, mas de respeito, de corresponsabilidade, de ajuda mútua. Em síntese, marido e mulher são co-criadores com o Pai.

Neste domingo, prosseguindo a leitura do evangelho de Marcos, Jesus continua a instruir seus discípulos para que a vida deles seja um marco diferencial na sociedade e na história. O cristão precisa fazer a diferença. Agora Jesus ensina a se relacionar com os bens. Realidade muito próxima do casamento. A gente sabe que muitas crises no relacionamento conjugal brotam da relação e gestão dos bens, da casa, do dinheiro. Quantas brigas por conta de dívidas, por conta de diferença de salários, por conta de compra e venda! Quanta confusão, depois da separação, por causa de bens e de pensão! Quanta confusão e, por vezes, morte por causa de herança! Então vamos acompanhar a orientação de Jesus a respeito desse caminho que o discípulo deve fazer.

Esse moço que recorre a Jesus se preocupa com a vida eterna. Não lhe interessa tanto a vida presente uma vez que os bens já lhe estão garantidos. Primeiramente Jesus faz com que sua atenção se volte para o Pai e não tanto para Jesus: “Só Deus é bom”. Os mandamentos da Lei relativos ao próximo ele os tem observado. Notamos, porém, que os Dez Mandamentos não foram citados. Apenas alguns e mesmo assim naquela conotação negativa: “não”. Então lhe faltava a dimensão positiva da vida. Ele observava a Lei, mas não sabia partilhar. Não tinha gratuidade. Não tinha plena consciência e conhecimento do que estava fazendo. Observava a lei por costume e tradição. Como aqueles casos muito comuns entre nós: “Por que você quer batizar seu filho?” Ou “Por que você é católico?” A resposta normalmente ecoa: “Porque todo mundo batiza” Ou “Porque meu pai é católico”. Ou simplesmente: “Por que nasci numa tradição católica”. E por aí se vai. Uma fé sem fundamento, sem gratuidade, sem generosidade, sem conhecimento, sem razão, sem convicção e decisão livre e consciente.

Jesus quis ajudar aquele homem a dar um passo decisivo na vida. É algo que faz parte integrante da fé cristã: o desapego dos bens e o espírito de partilha. “Vai, vende tudo o que tens. Dá o dinheiro aos pobres. Depois vem e segue-me”. Não basta, pois, dividir os bens com os pobres. É preciso seguir a Jesus. O seguimento de Jesus é que caracteriza o cristão. Poder-se-iam distribuir os bens por vaidade. E nesse aspecto Paulo já alertara: “Ainda que eu desse todos os meus bens aos pobres; se não tivesse amor, isso de nada valeria” (1Cor 13,3).

No desenrolar do texto Jesus percebe a dificuldade de o rico entrar no Reino. Jesus não está falando de vida depois da morte, não. Ele está falando do Reino de Deus. A vida eterna começa aqui, com a erupção do Reino de Deus. Quem não se desapega, como aquele moço que não teve coragem de se desvencilhar dos bens, não pode entrar na vida de Deus. A vida eterna é a vida em Deus.

A salvação é dom de Deus: “Para Deus tudo é possível”. Ninguém compra a vida de Deus, repartindo seus bens, fazendo caridade etc. Deus nos salva de graça. Porém nossos gestos de bondade, de generosidade, de partilha, de perdão, de tolerância, de respeito, de solidariedade são nossa resposta à bondade de Deus que nos salva. Quem vive preso às suas coisas, fechado em si mesmo, indiferente ao sofrimento alheio ou, pior ainda, buscando sempre oportunidades para aumentar suas posses, defraudando os outros, extorquindo, sonegando impostos, deixando de cumprir com as obrigações sociais de seus funcionários, está cada vez mais longe do Reino de Deus, da salvação. Sua vida está atravancando a ação salvadora de Deus. É uma pedra de tropeço, um escândalo, que impede a vida de florescer. Mata a alegria e as esperanças das pessoas.

Na prática, cada um de nós podia dar uma olhadinha no modo como lida com os bens e posses. O que fazemos com o dinheiro? Onde o guardamos? Em que o empregamos? Com que finalidade? O que estamos comprando? Para que compramos? Tem gente que renova as mobílias todos os anos. Compra sem necessidade nenhuma. Tem gente que está sempre na ponta da tecnologia. É necessário estar na “crista da onda”? Por outro lado, há pessoas que deixam de comprar coisas essenciais para a casa, que deixam de cuidar da saúde da família para guardar o dinheiro ou aumentar o patrimônio. E, muitas vezes, se endividando com prestações a perder de vista. Tem gente que nem consulta a família para fazer certos gastos. Tem gente que gasta o salário com jogos de azar, com prostituição e adultério, com bebedeira sem conta, com churrascada desmedida para amigos, com drogas de toda qualidade. Tem gente que vive uma vida miserável para aplicar o dinheiro em rendimentos bancários. Mas não é capaz de partilhar um centavo com os mais pobres!

Isso sem falar da agiotagem que assassina milhares de famílias. Um pecado que brada aos céus: o sujeito tem dinheiro; vê o irmão na pior; empresta-lhe a juros exorbitantes; escraviza o pobre coitado que nunca ou quase nunca consegue pagar (Cf. Sl 15,5). E o que dizer daqueles que transferem sua fortuna para os “paraísos fiscais”, deixando os pobres brasileiros a “ver navios”? Pior: muitos destes tais se dizem cristãos!

“A maneira sadia de lidar com o dinheiro é ganhá-lo de forma limpa, utilizá-lo com inteligência, fazê-lo frutificar com justiça e saber compartilhá-lo com os mais necessitados” (Pe. J. A. Pagola). O acúmulo de bens é idolatria. O reino pessoal, a busca de si mesmo não garante lugar no Reino de Deus.

Não está na hora de colocarmos a mão na consciência e rezarmos um pouco mais nosso ser cristão? Aquele homem do evangelho voltou triste porque possuía muitos bens. Conclui-se que a posse de muitos bens não traz alegria para ninguém. A verdadeira alegria está no bom uso dos bens, do dinheiro. Quando sabemos partilhar, distribuir, comprar ou vender dentro de critérios honestos e a partir de um diálogo respeitoso e cristão dentro de nossa casa, estamos no caminho do verdadeiro discipulado de Jesus. Então experimentaremos a verdadeira alegria que brota de uma vida vivida em Deus, na construção do Reino de partilha, de paz e de justiça.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

Felizes os pobres! Ai dos ricos!

aureliano, 12.02.22

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6º Domingo do Tempo Comum [13 de fevereiro de 2022]

[Lc 6,17.20-26]

No relato do evangelho do domingo passado (5º Domingo), vimos Jesus chamando os quatro primeiros discípulos. Quer que sejam “pescadores de homens”. E eles entendem que precisam se desapegar dos bens materiais para seguir a Jesus com liberdade e inteireza de coração (Lc 5,10-11). O relato transparece claramente que Jesus quer um novo modo de vida e de mentalidade para seus seguidores.

O relato do evangelho de hoje traz o “Sermão da Planície” em contraposição ao “Sermão da Montanha” de Mateus 5,1-12. Lucas tem perspectiva diferente de Mateus. Os destinatários são outros: comunidades provenientes da cultura grega, pagã. O conteúdo dos dois relatos é o mesmo. Mas aqui Jesus profere também uma maldição contra os ricos. Além disso, ao “descer a montanha”, Jesus quer mostrar a condescendência de Deus que vem até nós. Elemento fundante da nossa fé cristã é a revelação de um Deus que se faz um de nós (cf. Jo 1,14), que desceu e se tornou servo (cf. Fl 2,7). De rico que era, se fez pobre por nós (cf. 2Cor 8,9). Um Deus que “desce”.

A fé cristã provoca uma revolução no coração daquele que acredita. O encontro com Jesus Cristo transforma a pessoa, abre um horizonte novo, faz enxergar o mundo de modo diferente. Produz no coração do crente o desejo de Deus, o desapego, o espírito de partilha, de solidariedade, de cuidado com o outro e com a Casa Comum. Foi isso que aconteceu aos santos e santas: São Francisco de Assis, Beato Charles de Foucauld, Pe. Júlio Maria, Santa Teresa de Calcutá, Santa Dulce dos Pobres e tantos outros.

Mas convenhamos. Ouvir uma proclamação de felicidade para os pobres é muito bom! E todos gostam de ouvir e até de dizer. Mas ouvir que os ricos estão perdidos, não é coisa fácil: “Ai de vós, ricos, porque já tendes a vossa consolação”. O Profeta, na primeira leitura, visa a nos preparar para isso: “Maldito o homem que confia no homem e faz consistir sua força na carne humana” (Jr 17,5). Por outro lado, brota do coração de Deus uma palavra de consolo: “Bendito o homem que confia no Senhor, cuja esperança é o Senhor” (Jr 17,7).

Alguém poderia argumentar: “Deus criou os bens deste mundo para serem usufruídos”. É verdade! Porém há que se distinguir: uma coisa é possuir os bens e usufruí-los; outra coisa é ser possuído por eles, ser escravo dos bens materiais. E como se não bastasse, escravizar os outros para possuir sempre mais. Atentemos à advertência de São Paulo: “Eis o que digo, irmãos: o tempo se faz curto. Resta, pois, que aqueles que têm esposa, sejam como se não tivessem; aqueles que choram, como se não chorassem; aqueles que se regozijam, como se não regozijassem; aqueles que compram, como se não possuíssem; aqueles que usam deste mundo, como se não usassem plenamente. Pois passa a figura deste mundo” (1Cor 7,29-31). Os bens materiais não podem ocupar o primeiro lugar em nossa vida. Porque eles não trazem dentro de si a felicidade permanente, verdadeira, intransferível.

A Sagrada Escritura quer nos mostrar que nenhum bem material é definitivo. Na parábola do homem que construiu um grande armazém para guardar sua colheita e se locupletar sozinho, Jesus mostra que a vida e os bens só têm sentido na medida em que são vividos e empregados segundo os critérios do Reino de Deus: “Insensato, nessa mesma noite ser-te-á reclamada a alma. E as coisas que acumulaste, de quem serão?” (cf. Lc 12,16-21). A vida do ser humano não consiste em possuir muitos bens, em ter muito dinheiro, em ser reconhecido pelo que tem (cf. Lc 12,15). Há muita vaidade por aí. Há pessoas que pensam somente em trabalhar para ganhar dinheiro; ganhar dinheiro para comprar coisas; comprar coisas para se exibir. E por aí se vai. Depois vem a desavença, a rivalidade, a velhice, a doença, a morte. E Depois?...

O programa de vida de Jesus é “anunciar a boa nova aos pobres”. Deus ama o ser humano por si mesmo. Não faz parte de sua “agenda” admirar stutus quo, reconhecimento social, aparência, sucesso e aplausos. Deus ama o ser humano de graça. E quer que ele se faça simples , pequeno, pobre.

Além disso, quando Jesus proclama “Bem-aventurados vós, os pobres” não quer dizer que o pobre seja mais virtuoso do que o rico. É que Deus quis fazer sua “opção preferencial” pelos pobres. Com isso entende-se que a graça vem de Deus e não de algum favor humano. Os pobres não são felizes por causa de sua pobreza. Eles são felizes por saber que Deus está com eles. Seu sofrimento não durará para sempre. O Senhor lhes fará justiça. Jesus deixa claro: os que não interessam a ninguém são os que mais interessam a Deus. Deus quer estar com eles. E, para nós que vivemos na abundância, quando voltamos nosso olhar e nossa presença junto aos pobres, podemos ter aí uma grande oportunidade de fazer um caminho de conversão.

É bom ressaltar que Jesus não é contra os ricos. Por isso os exorta a mudar de mentalidade, a se esvaziarem de si mesmos, a se desapegarem de seus bens fazendo com que todos possam também usufruí-los. Os bens da criação devem ser distribuídos a todas as pessoas. Deus criou a terra e a deu ao ser humano para que cuidasse dela: “O Senhor Deus tomou o homem e o colocou no jardim de Éden para o cultivar e o guardar” (Gn 2,15). Basta ler o episódio de Jesus e Zaqueu (Lc 19, 1-10). O coração de Zaqueu encheu-se da salvação de Deus quando ele decidiu devolver o que roubara, e distribuir com os pobres parte dos bens: “Zaqueu, de pé, disse ao Senhor: ‘Senhor, eis que dou a metade dos meus bens aos pobres, e se defraudei a alguém, restituo-lhe o quádruplo’. Jesus lhe disse: ‘Hoje a salvação entrou nesta casa’” (Lc 19,8-9).

Senhor Jesus, desperta nosso coração para maior sensibilidade e solidariedade com os mais pobres. Ajuda-nos a ter um coração de pobre, um coração que saiba consolar, que saiba cuidar, que saiba chorar com os choram aquela dor doída. Inspira-nos palavras e ações para confortar os desanimados e oprimidos. E não deixes que a preocupação e a busca desenfreada dos bens materiais, do sucesso a todo custo, do lucro a qualquer preço tomem conta de nosso coração. Dá-nos enfim aquela coragem suficiente para anunciar teu Reino de amor e denunciar as perversidades contra os pequenos e sofredores da terra.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

Acúmulo de bens é idolatria

aureliano, 08.10.21

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28º Domingo do Tempo Comum [10 de outubro 2021]

   [Mc 10,17-30]

No evangelho do domingo passado refletimos sobre Jesus orientando a vida familiar. A relação conjugal não se fundamenta numa relação de dominação, mas de respeito, de corresponsabilidade, de ajuda mútua. Em síntese, marido e mulher são co-criadores com o Pai.

Neste domingo, continuando a leitura do evangelho de Marcos, Jesus continua a instruir seus discípulos para que a vida deles seja um marco diferencial na sociedade. O cristão precisa fazer a diferença. Agora Jesus ensina a se relacionar com os bens. Realidade muito próxima do casamento. A gente sabe que muitas crises no relacionamento conjugal brotam da relação com o dinheiro. Quantas brigas por conta de dívidas, por conta de diferença de salários, por conta de compra e venda! Quanta confusão, depois da separação, por causa de bens e de pensão! Quanta confusão e, por vezes, morte por causa de herança! Então vamos acompanhar a orientação de Jesus a respeito desse caminho que o discípulo deve fazer.

Esse moço que recorre a Jesus se preocupa com a vida eterna. Não lhe interessa tanto a vida presente uma vez que os bens já lhe estão garantidos. Primeiramente Jesus faz com que sua atenção se volte para o Pai e não tanto para Jesus: “Só Deus é bom”. Os mandamentos da Lei relativos ao próximo ele os tem observado. Notamos, porém, que os Dez Mandamentos não foram citados. Apenas alguns e mesmo assim naquela conotação negativa: “não”. Então lhe faltava a dimensão positiva da vida. Ele observava a Lei, mas não sabia partilhar. Não tinha gratuidade. Não sabia o que estava fazendo. Fazia por fazer. Como aqueles casos muito comuns entre nós: “Por que você quer batizar seu filho?” Ou “Por que você é católico?” A resposta normalmente ecoa: “Porque todo mundo batiza” Ou “Porque meu pai é católico”. Ou simplesmente: “Por que nasci numa tradição católica”. E por aí se vai. Uma fé sem fundamento, sem gratuidade, sem generosidade, sem conhecimento, sem razão.

Jesus quis ajudar aquele homem a dar um passo decisivo na vida. É algo que caracteriza a fé cristã: a partilha. “Vai, vende tudo o que tens. Dá o dinheiro aos pobres. Depois vem e segue-me”. Não basta dividir os bens com os pobres. É preciso seguir a Jesus. O seguimento de Jesus é que caracteriza o cristão. Poder-se-iam distribuir os bens por vaidade. E nesse aspecto Paulo já alertara: “Ainda que eu desse todos os meus bens aos pobres; se não tivesse amor, isso de nada valeria” (1Cor 13,3).

No desenrolar do texto Jesus percebe a dificuldade de o rico entrar no Reino. Jesus não está falando de vida depois da morte, não. Ele está falando do Reino de Deus. A vida eterna começa aqui, com a erupção do Reino de Deus. Quem não se desapega, como aquele moço que não teve coragem de se desvencilhar dos bens, não pode entrar na vida de Deus. A vida eterna é a vida em Deus.

A salvação é dom de Deus: “Para Deus tudo é possível”. Ninguém compra a vida de Deus, repartindo seus bens, fazendo caridade etc. Deus nos salva de graça. Porém nossos gestos de bondade, de generosidade, de partilha, de perdão, de tolerância, de respeito, de solidariedade são nossa resposta à bondade de Deus que nos salva. Quem vive preso às suas coisas, fechado em si mesmo, indiferente ao sofrimento alheio ou, pior ainda, buscando sempre oportunidades para aumentar suas posses, defraudando os outros, está cada vez mais longe da salvação. Sua vida está atravancando a ação salvadora de Deus. É uma pedra de tropeço, um escândalo, que impede a vida de florescer. Mata a alegria e as esperanças das pessoas.

Na prática, cada um de nós podia dar uma olhadinha no modo como lida com os bens e posses. O que fazemos com o dinheiro? Onde o guardamos? Com que finalidade? O que estamos comprando? Para que compramos? Tem gente que renova as mobílias todos os anos. Compra sem necessidade nenhuma. Tem gente que está sempre na ponta da tecnologia. É necessário estar na “crista da onda”? Por outro lado, há pessoas que deixam de comprar coisas essenciais para a casa, que deixam de cuidar da saúde da família para guardar o dinheiro ou aumentar o patrimônio. E, muitas vezes, se endividando com prestações a perder de vista. Tem gente que nem consulta a família para fazer certos gastos. Tem gente que gasta o salário com jogatina, com prostituição e adultério, com bebedeira sem conta, com churrascada desmedida para amigos, com drogas de toda qualidade. Tem gente que vive uma vida miserável para aplicar o dinheiro em rendimentos bancários. Mas não é capaz de partilhar um centavo com os mais pobres!

Isso sem falar da agiotagem que assassina milhares de famílias. Um pecado que brada aos céus: o sujeito tem dinheiro; vê o irmão na pior; empresta-lhe a juros exorbitantes; escraviza o pobre coitado que nunca ou quase nunca consegue pagar (Cf. Sl 15,5). E o que dizer daqueles que transferem sua fortuna para os “paraísos fiscais”, deixando os pobres brasileiros a “ver navios”? Pior: muitos destes tais se dizem cristãos!

“A maneira sadia de lidar com o dinheiro é ganhá-lo de forma limpa, utilizá-lo com inteligência, fazê-lo frutificar com justiça e saber compartilhá-lo com os mais necessitados” (Pe. J. A. Pagola). O acúmulo de bens é idolatria. O reino pessoal, a busca de si mesmo não dá lugar ao Reino de Deus.

Não está na hora de colocarmos a mão na consciência e rezarmos um pouco mais nosso ser cristão? Aquele homem do evangelho voltou triste porque possuía muitos bens. Conclui-se que a posse de muitos bens não traz alegria para ninguém. A verdadeira alegria está no bom uso dos bens, do dinheiro. Quando sabemos partilhar, distribuir, comprar ou vender dentro de critérios honestos e a partir de um diálogo respeitoso e cristão dentro de nossa casa, estamos no caminho do verdadeiro discipulado de Jesus. Então experimentaremos a verdadeira alegria que brota de uma vida vivida em Deus, na construção do Reino de partilha, de paz e de justiça.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

Como lidar com os bens materiais

aureliano, 13.10.18

28º Domingo do Tempo Comum [14 de outubro 2018]

28º Domingo do TC - 14 de outubro.jpg

   [Mc 10,17-30]

No evangelho do domingo passado refletimos sobre Jesus orientando a vida familiar. A relação conjugal não se fundamenta numa relação de dominação, mas de respeito, de corresponsabilidade, de ajuda mútua. Em síntese, marido e mulher são co-criadores com o Pai.

Neste domingo, continuando a leitura do evangelho de Marcos, Jesus continua a instruir seus discípulos para que a vida deles seja um marco diferencial na sociedade. O cristão precisa fazer a diferença. Agora Jesus ensina a se relacionar com os bens. Realidade muito próxima do casamento. A gente sabe que muitas crises no relacionamento conjugal brotam da relação com o dinheiro. Quantas brigas por conta de dívidas, por conta de diferença de salários, por conta de compra e venda! Quanta confusão, depois da separação, por causa de bens e de pensão! Quanta confusão e, por vezes, morte por causa de herança! Então vamos acompanhar a orientação de Jesus a respeito desse caminho que o discípulo deve fazer.

Esse moço que recorre a Jesus se preocupa com a vida eterna. Não lhe interessa tanto a vida presente uma vez que os bens já lhe estão garantidos. Primeiramente Jesus faz com que sua atenção se volte para o Pai e não tanto para Jesus: “Só Deus é bom”. Os mandamentos da Lei relativos ao próximo ele os tem observado. Notamos, porém, que os Dez Mandamentos não foram citados. Apenas alguns e mesmo assim naquela conotação negativa: “não”. Então lhe faltava a dimensão positiva da vida. Ele observava a Lei, mas não sabia partilhar. Não tinha gratuidade. Não sabia o que estava fazendo. Fazia por fazer. Como aqueles casos muito comuns entre nós: “Por que você quer batizar seu filho?” Ou “Por que você é católico?” A resposta normalmente ecoa: “Porque todo mundo batiza” Ou “Porque meu pai é católico”. Ou simplesmente: “Por que nasci numa tradição católica”. E por aí vai. Uma fé sem fundamento, sem gratuidade, sem generosidade, sem conhecimento, sem razão.

Jesus quis ajudar aquele homem a dar um passo decisivo na vida. É algo que caracteriza a fé cristã: a partilha. “Vai, vende tudo o que tens. Dá o dinheiro aos pobres. Depois vem e segue-me”. Não basta dividir os bens com os pobres. É preciso seguir a Jesus. O seguimento de Jesus é que caracteriza o cristão. Poder-se-iam distribuir os bens por vaidade. E nesse aspecto Paulo já alertara: “Ainda que eu desse todos os meus bens aos pobres; se não tivesse amor, isso de nada valeria” (1Cor 13,3).

No desenrolar do texto Jesus percebe a dificuldade de o rico entrar no Reino. Jesus não está falando de vida depois da morte, não. Ele está falando do Reino de Deus. A vida eterna começa aqui, com a erupção do Reino de Deus. Quem não se desapega, como aquele moço que não teve coragem de se desvencilhar dos bens, não pode entrar na vida de Deus. A vida eterna é a vida em Deus.

A salvação é dom de Deus: “Para Deus tudo é possível”. Ninguém compra a vida de Deus, repartindo seus bens, fazendo caridade etc. Deus nos salva de graça. Porém nossos gestos de bondade, de generosidade, de partilha, de perdão, de tolerância, de respeito, de solidariedade são nossa resposta à bondade de Deus que nos salva. Quem vive preso às suas coisas, fechado em si mesmo, indiferente ao sofrimento alheio ou, pior ainda, buscando sempre oportunidades para aumentar suas posses, defraudando os outros, está cada vez mais longe da salvação. Sua vida está atravancando a ação salvadora de Deus. É uma pedra de tropeço, um escândalo, que impede a vida de florescer. Mata a alegria e as esperanças das pessoas.

Na prática, cada um de nós podia dar uma olhadinha no modo como lida com os bens e posses. O que fazemos com o dinheiro? Onde o guardamos? Com que finalidade? O que estamos comprando? Para quê compramos? Tem gente que renova as mobílias todos os anos. Compra sem necessidade nenhuma. Tem gente que está sempre na ponta da tecnologia. É necessário estar na “crista da onda”? Por outro lado, há pessoas que deixam de comprar coisas essenciais para a casa, que deixam de cuidar da saúde da família para guardar o dinheiro ou aumentar o patrimônio. E, muitas vezes, se endividando com prestações a perder de vista. Tem gente que nem consulta a família para fazer certos gastos. Tem gente que gasta o salário com jogatina, com prostituição e adultério, com bebedeira sem conta, com churrascada desmedida para amigos, com drogas de toda qualidade. Tem gente que vive uma vida miserável para aplicar o dinheiro em rendimentos bancários. Mas não é capaz de partilhar um centavo com os mais pobres!

Isso sem falar da agiotagem que assassina milhares de famílias. Um pecado que brada aos céus: o sujeito tem dinheiro; vê o irmão na pior; empresta-lhe a juros exorbitantes; escraviza o pobre coitado que nunca ou quase nunca consegue pagar (Cf. Sl 15,5).

“A maneira sadia de lidar com o dinheiro é ganhá-lo de forma limpa, utilizá-lo com inteligência, fazê-lo frutificar com justiça e saber compartilhá-lo com os mais necessitados” (Pe. J. A. Pagola).

Não está na hora de colocarmos a mão na consciência e rezarmos um pouco mais nosso ser cristão? Aquele homem do evangelho voltou triste porque possuía muitos bens. Conclui-se que a posse de muitos bens não traz alegria para ninguém. A verdadeira alegria está no bom uso dos bens, do dinheiro. Quando sabemos partilhar, distribuir, comprar ou vender dentro de critérios honestos e a partir de um diálogo respeitoso e cristão dentro de nossa casa, estamos no caminho do verdadeiro discipulado de Jesus. Então experimentaremos a verdadeira alegria que brota de uma vida vivida em Deus, na construção do Reino de partilha, de paz e de justiça.

Penso ser oportuno lembrar também os milhões roubados dos cofres públicos pela corrupção; os desvios sem conta de dinheiro público para os bolsos de gestores e políticos sem consciência; os privilégios garantidos por legislação injusta como auxílio-moradia, auxílio-doença, auxílio-transporte, verba indenizatória para quem já ganha salários exorbitantes: a lei pode garantir, mas não significa que seja justo; as privatizações das empresas estatais, o desejo de alguns mandatários de tomar as reservas indígenas e quilombolas para repassá-las a empresários que não têm mais onde guardar dinheiro. A distância entre ricos e pobres tende a aumentar cada vez mais em nosso País. E pior: com o aval do ‘sufrágio universal’ (votos nas urnas). A estatística confirma que, nas últimas eleições, cresceu no Congresso Nacional o número de milionários. Eles irão propor ou votar projetos que favoreçam os mais pobres em detrimento de aumentarem seu patrimônio? Vamos pensar nisso.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN