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aurelius

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Que a inveja dê lugar à bondade

aureliano, 22.09.23

25º Domingo do TC - A - 20 de setembro.jpg

25º Domingo do Tempo Comum [24 de setembro de 2023]

[Mt 20,1-16]

“Meus pensamentos não são os vossos pensamentos; vossos caminhos não são os meus caminhos” (Is 55,8). O Profeta da ‘volta do exílio’ quer ajudar o povo a refletir que não se deve pensar em vingança contra os inimigos de outrora que os arrastaram para o exílio. É preciso passar da imagem de um Deus vingador a um Deus misericordioso que traz o povo de volta e quer salvar os malvados.

Para pensar como Deus é preciso conversão da mente e do coração. A lógica do Reino de Deus é diferente da nossa. Deus age sempre a partir da misericórdia.

Logo após trabalhar nos discípulos o desapego para se entrar no Reino: “Todo aquele que tiver deixado tudo... herdará a vida eterna” (Mt 19,29), Mateus relata a parábola dos trabalhadores da vinha. A justa distribuição do salário provoca mal-estar nos corações ambiciosos que ainda não tinham o pensamento de Deus.

O contexto da parábola são as comunidades judaicas das sinagogas que rejeitavam e expulsavam os judeus que se convertiam à fé cristã. Por se julgarem os primogênitos de Deus consideravam-se mais merecedores do que os outros, desprezando seus irmãos judeu-cristãos. Ainda outra realidade era a da comunidade judaico-cristã que tinha muita dificuldade em acolher os cristãos provenientes do paganismo. É sempre aquela história do “filho mais velho” da parábola do Pai misericordioso: quem está na casa há mais tempo julga-se sempre no direito de ser o primeiro, o mais importante, desprezando os outros.

“O teu olho é mau porque eu sou bom?” (Mt 20,15). Essa pergunta da parábola deve sempre nos acompanhar. Ela contrapõe a ambição humana à generosidade divina. Olhar as pessoas com um olhar de Deus pede de nós profunda conversão. Conversão é sair de nosso egoísmo, mudarmos a direção de nossos pensamentos e afetos para ordená-los segundo os critérios do Reino. O “contrato” de Deus não se baseia na relação de produção: “dou para que me dês”, mas na pura gratuidade. Deus ama tanto a uns como a outros, sem distinção ou discriminação. Deus nos ama, não por sermos ‘bonzinhos’, mas porque Ele é Bom. Ele faz aliança conosco de graça: é dom.

O olhar de ambição, de ganância é o grande mal da sociedade. O olhar de ambição e cobiça gera rixa, mal-estar, desentendimento na família, divisão e discórdia. Um olhar ganancioso gera dor, angústia e morte. Colocar a lente de Jesus para ver as coisas e as pessoas deve ser nosso ideal, nossa meta de todos os dias.

Outro elemento interessante da parábola é o fato de que a verdadeira recompensa não está na contrapartida do “salário” pelo trabalho na vinha, mas em ser chamado e admitido no Reino de Deus. O chamamento de Deus e nossa resposta generosa são mais importantes do que a espera de recompensa. O verdadeiro salário está em sermos chamados a participar da vida divina: “A fim de que assim vos tornásseis participantes da natureza divina” (2Pd 1,4).

Essa parábola revela também a preferência de Deus pelos pobres, pelos últimos. Eles são destinados a ser os primeiros, os eleitos. Todos que são chamados devem conservar clara a consciência de que tudo quanto receberam é puro dom: não se deve buscar retribuição ou privilégios.

Nesse clima de aprofundamento da desigualdade social em que vivemos: os ricos se enriquecendo ainda mais, com crescente aumento do número de empobrecidos e miseráveis, essa parábola nos ensina também que Deus não quer ninguém à toa, desempregado, à margem. Quer todos na vinha, no trabalho, na conquista do pão cotidiano.

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A ESSÊNCIA DE DEUS

A imagem de Deus é determinante em nossas relações. Se alimento a imagem de um deus que fica anotando no caderno meus atos bons e maus para me julgar depois da morte, certamente minha vida vai perfazer um caminho de muita angústia e rigidez ou descaso total da religião. Importa muito trabalharmos em nós e nos outros a imagem de Deus: o Deus de Jesus é essencialmente bondade, gratuidade. Ele nos vê no conjunto de nossa vida, no empenho de termos um coração bom e generoso, sensível à dor e ao sofrimento das pessoas, que seja capaz de partilhar, de amar. É o Deus da parábola desse evangelho. Por vezes resistimos em ver Deus aí, nessa atitude de bondade para com todos: com quem chega mais cedo e com quem chega mais tarde. Queremos que Deus julgue com nossos critérios. Ou seja, criamos um deus à nossa imagem e semelhança.

O administrador nesta parábola retrata o ser de Deus: Bondade - não se baseia no mérito de cada um, mas na Sua própria bondade.

A generosidade de Jesus é uma aposta no ser humano que, uma vez recebido o amor, se faça generoso e ‘chegue mais cedo’.

A Palavra de Deus nos ajuda a entender, também, que as pessoas não devem ser tratadas como merecem: devem ser amadas.

Senhor, ajuda-nos a pensar nossa vida, nossas atividades, nossa missão segundo os teus pensamentos. Ajuda-nos a vencer toda ambição e desejo de poder para que sejamos sinais luminosos de tua bondade na vida daqueles que convivem conosco. E ensina-nos a amar as pessoas para além do que elas merecem: gratuitamente, generosamente, por amor de Ti. Amém.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

Ter o pensamento de Deus

aureliano, 19.09.20

25º Domingo do TC - A - 20 de setembro.jpg

25º Domingo do Tempo Comum [20 de setembro de 2020]

[Mt 20,1-16]

“Meus pensamentos não são os vossos pensamentos; vossos caminhos não são os meus caminhos” (Is 55,8). O Profeta da ‘volta do exílio’ quer ajudar o povo a refletir que não se deve pensar em vingança contra os inimigos de outrora que os arrastaram para o exílio. É preciso passar da imagem de um Deus vingador a um Deus misericordioso que traz o povo de volta e quer salvar os malvados.

Para pensar como Deus é preciso conversão da mente e do coração. A lógica do Reino de Deus é diferente da nossa. Deus age sempre a partir da misericórdia.

Logo após trabalhar nos discípulos o desapego para se entrar no Reino: “Todo aquele que tiver deixado tudo... herdará a vida eterna” (Mt 19,29), Mateus relata a parábola dos trabalhadores da vinha. A justa distribuição do salário provoca mal-estar nos corações ambiciosos que ainda não tinham o pensamento de Deus.

O contexto da parábola são as comunidades judaicas das sinagogas que rejeitavam e expulsavam os judeus que se convertiam à fé cristã. Por se julgarem os primogênitos de Deus consideravam-se mais merecedores do que os outros, desprezando seus irmãos judeu-cristãos. Ainda outra realidade era a da comunidade judaico-cristã que tinha muita dificuldade em acolher os cristãos provenientes do paganismo. É sempre aquela história do “filho mais velho” da parábola do Pai misericordioso: quem está na casa há mais tempo julga-se sempre no direito de ser o primeiro, o mais importante, desprezando os outros.

“O teu olho é mau porque eu sou bom?” (Mt 20,15). Essa pergunta da parábola deve sempre nos acompanhar. Ela contrapõe a ambição humana à generosidade divina. Olhar as pessoas com um olhar de Deus pede de nós profunda conversão. Conversão é sair de nosso egoísmo, mudarmos a direção de nossos pensamentos e afetos para ordená-los segundo os critérios do Reino. O “contrato” de Deus não se baseia na relação de produção: “dou para que me dês”, mas na pura gratuidade. Deus ama tanto a uns como a outros, sem distinção ou discriminação. Deus nos ama, não por sermos ‘bonzinhos’, mas porque Ele é Bom. Ele faz aliança conosco de graça: é dom.

O olhar de ambição, de ganância é o grande mal da sociedade. O olhar de ambição e cobiça gera rixa, mal-estar, desentendimento na família, divisão e discórdia. Um olhar ganancioso gera dor, angústia e morte. Colocar a lente de Jesus para ver as coisas e as pessoas deve ser nosso ideal, nossa meta de todos os dias.

Outro elemento interessante da parábola é o fato de que a verdadeira recompensa não está na contrapartida do “salário” pelo trabalho na vinha, mas em ser chamado e admitido no Reino de Deus. O chamamento de Deus e nossa resposta generosa são mais importantes do que a espera de recompensa. O verdadeiro salário está em sermos chamados a participar da vida divina: “A fim de que assim vos tornásseis participantes da natureza divina” (2Pd 1,4).

Essa parábola revela também a preferência de Deus pelos pobres, pelos últimos. Eles são destinados a ser os primeiros, os eleitos. Todos que são chamados devem conservar clara a consciência de que tudo quanto receberam é puro dom: não se deve buscar retribuição ou privilégios.

Nesse clima de aprofundamento da desigualdade social em que vivemos: os ricos se enriquecendo ainda mais, com crescente aumento do número de empobrecidos e miseráveis, essa parábola nos ensina também que Deus não quer ninguém à toa, desempregado, à margem. Quer todos na vinha, no trabalho, na conquista do pão cotidiano.

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A ESSÊNCIA DE DEUS

A imagem de Deus é determinante em nossas relações. Se alimento a imagem de um deus que fica anotando no caderno meus atos bons e maus para me julgar depois da morte, certamente minha vida vai perfazer um caminho de muita angústia e rigidez ou descaso total da religião. Importa muito trabalharmos em nós e nos outros a imagem de Deus: o Deus de Jesus é essencialmente bondade, gratuidade. Ele nos vê no conjunto de nossa vida, no empenho de termos um coração bom e generoso, sensível à dor e ao sofrimento das pessoas, que seja capaz de partilhar, de amar. É o Deus da parábola desse evangelho. Por vezes resistimos em ver Deus aí, nessa atitude de bondade para com todos: com quem chega mais cedo e com quem chega mais tarde. Queremos que Deus julgue com nossos critérios. Ou seja, criamos um deus à nossa imagem e semelhança.

O administrador nesta parábola retrata o ser de Deus: Bondade - não se baseia no mérito de cada um, mas na Sua própria bondade.

A generosidade de Jesus é uma aposta no ser humano que, uma vez recebido o amor, se faça generoso e ‘chegue mais cedo’.

A Palavra de Deus nos ajuda a entender, também, que as pessoas não devem ser tratadas como merecem: devem ser amadas.

Senhor, ajuda-nos a pensar nossa vida, nossas atividades, nossa missão segundo os teus pensamentos. Ajuda-nos a vencer toda ambição e desejo de poder para que sejamos sinais luminosos de tua bondade na vida daqueles que convivem conosco. E ensina-nos a amar as pessoas para além do que elas merecem: gratuitamente, generosamente, por amor de Ti. Amém.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

É santo quem manifesta a bondade do Pai

aureliano, 21.02.20

7º Domingo do TC - A - 23 de fevereiro.jpg

7º Domingo do Tempo Comum [23 de fevereiro de 2020]

[Mt 5,38-48]

No Sermão da Montanha Jesus continua mostrando a grande novidade que veio trazer ao mundo para que se estabeleçam novas relações regidas pelo amor.

O judaísmo sempre entendeu a estreita relação existente entre o amor ao Senhor e ao próximo. Prova disso é a insistência do Ensinamento de Deus (Lei) em relação aos pobres: estrangeiro, viúva e órfão não podem ser afligidos, torturados como temos visto em nosso Brasil e pelo mundo afora (cf. Ex, 22, 20-23). A primeira leitura de hoje (Lv 19, 1-2.17-18) insiste em que não se guarde ódio nem se busque vingar de ninguém. A santidade se manifesta no amor ao próximo. Amor que se expressa no perdão, no cuidado, na solidariedade, na partilha, na correção fraterna etc.

O problema enfrentado por Jesus com seus irmãos na fé judaica foi que essa relação fraterna era guardada somente para com os correligionários (da própria religião e raça). Jesus quer universalizar essa relação de perdão e de não violência. Vai além: não enfrentar o malvado, ou seja, evitar toda violência, ainda que custe ao discípulo uma atitude de humildade: “Você é um bobo, um besta! Eu não aceitaria isso!”. É preciso ainda mais: amar o inimigo. Enquanto alguns contemporâneos de Jesus pregavam: “Ame o que Deus escolheu e odeie o que Deus rejeitou” (Essênios).

O que Jesus introduz de novo em tudo isso? – Seu discípulo deve manifestar sempre mais na sua vida as atitudes do Pai que ama a todos os seres humanos. “Sede perfeitos como vosso Pai celeste é perfeito”. A perfeição de que fala Jesus não é psicológica, legalista, cumpridora da lei pela lei. Mas Jesus quer dizer que o discípulo do Reino precisa ser perfeito no amor como o Pai que ama todas as pessoas, independente do que são: “faz chover sobre bons e maus”. O amor não está na linha do merecimento, mas da gratuidade, generosidade. Ou seja, é preciso superar a mentalidade mundana, e enxergar o mundo e as pessoas com o olhar de Deus.

O Papa Francisco tem uma palavra muito bonita sobre esse novo olhar de cuidado: “Cada ser humano é objeto da ternura infinita do Senhor, e Ele mesmo habita a sua vida. Na cruz, Jesus Cristo deu o seu sangue precioso por essa pessoa. Independentemente da aparência, cada um é imensamente sagrado e merece o nosso afeto e a nossa dedicação.  Por isso, se consigo ajudar uma pessoa a viver melhor, isso já justifica o dom da minha vida. É maravilhoso ser povo fiel de Deus. E ganhamos plenitude quando derrubamos os muros e o coração se enche de rostos e de nomes!” (EG, n. 274).

Faz-se necessário mudar o registro da mente e do coração. Entrar num processo de conversão. É poder dizer: “Pai, perdoai-lhes porque não sabem o que fazem” (Lc 23,33). O amor proposto por Jesus é o ágape: não há exclusividade no amor, ele é aberto. Parecido com aquele amor da Graça, mãe do Ronildo, por ocasião da morte do filho (lá em Vilas Boas, Guiricema): “Meu Deus, eu te entrego meu filho. Assim como o Senhor me deu ele, eu te devolvo”. E cuidou dele a vida inteira, gratuitamente, amorosamente!

Talvez nos ajude mais o conceito de santidade, presente no Levítico 19, 1-2. Santidade e pecado coabitam em nós: somos santos e pecadores. Mas perfeição e pecado, não. Perfeição é atributo divino. É um ideal, algo que dá ideia de completude. A Escritura, com exceção de Mateus, não diz que Deus é perfeito, mas que Deus é Santo. É separado das criaturas, não se confunde com elas. É o Criador. Se Deus, o Santo, ama a todos, aqueles que Ele criou à sua imagem e semelhança, também devem amar para participar da santidade de Deus e comunicá-la aos demais.

 

Num comentário magnífico ao relato sobre o paralítico colocado na presença de Jesus pelo telhado da casa (Mc 1,1-12), Papa Francisco diz, com toda simplicidade: “Sem dúvida, «o povo é pecador, como eu sou pecador, todos o somos». Mas o povo «procura Jesus, procura algo, procura a salvação». Ao contrário, aquele «grupo» de homens «parados estavam ali, na varanda, a olhar e a julgar» (Homilia em 13/01/17). Ou seja, ainda que a motivação inicial esteja eivada de algum egoísmo, a Graça pode transformar a pessoa. O importante é buscar, é sair da “varanda” e caminhar atrás de Jesus. O ideal cristão deve ser colocar os pés nos passos de Jesus.

Perfeição dá ideia de subida, de degraus. Santidade traduz descida, esvaziamento da auto-suficiência, de toda ambição e busca de riquezas, de prestígio, de projeção social, de dominação dos outros, de opressão. Santidade não é resultado matemático que possa ser contabilizado. É antes uma tendência para Deus, busca de se viver na presença de Deus, uma luta diária contra os desejos egoístas presentes no “homem velho”, para usar a linguagem paulina (Rm 6,6). É a verificação da própria indigência e, ao mesmo tempo, uma esperança confiante no amor, na graça, na salvação que vem de Deus. É um caminhar lentamente, passo a passo. “Caminheiro, não existe caminho. Passo a passo, pouco a pouco, o caminho se faz”. Não por nós, mas pela graça e perdão do Pai, com nossa resposta generosa, cotidianamente, pacientemente, confiantemente...

Assim como os filhos refletem a fisionomia dos pais, assim o discípulo de Jesus deve expressar, em suas relações, a santidade e o amor do Pai.

*Na próxima quarta-feira, dia 26, vamos dar início à Quaresma e abrir a Campanha da Fraternidade: Fraternidade e vida: dom e compromisso. “Viu, sentiu compaixão e cuidou dele” (Lc 10,33-34). Seria muito oportuno que cada um se preparasse para celebrar bem esse tempo de conversão, de graça, de intensa vida espiritual para sermos pessoas melhores, mais compassivas, solidárias, pacificadoras, comprometidas com a vida desde a concepção até o ocaso. - É dia de Jejum e Abstinência de carne. Busca de conversão para Deus e para os irmãos.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN