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Oração, Jejum e Esmola: um sentido de vida

aureliano, 04.03.25

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Quarta-feira de Cinzas [05 de março de 2025]

[Mt 6,1-6.16-18]

Não nos é dado saber com certeza data e local precisos do surgimento da Quaresma na vida litúrgica da Igreja. O que sabemos é que ela foi se formando progressivamente. Estava entranhada na consciência dos cristãos a necessidade de dedicar um tempo em preparação à celebração da Páscoa do Senhor. As primeiras alusões a um período pré-pascal estão registradas lá pelo século IV. Consta também que, na Quinta-Feira Santa, acontecia a reconciliação dos pecadores; e que na Vigília Pascal se realizavam os batizados dos catecúmenos (aqueles que estavam preparados para o batismo). Esses dois costumes, vividos desde a antiguidade da fé cristã, vem mostrar que esse tempo nos remete à renovação das promessas batismais ou preparação para o batismo e a práticas penitenciais que nos levem a uma conversão profunda do coração.

A propósito desse elemento da história, o Concílio Vaticano II recomenda: “Tanto na liturgia quanto na catequese litúrgica, esclareça-se melhor a dupla índole quaresmal, que, principalmente pela lembrança ou preparação do batismo e pela penitência, fazendo os fiéis ouvirem com mais frequência a Palavra de Deus e entregarem-se à oração, os dispõe à celebração do Mistério Pascal. Por isso, utilizem-se com mais abundância os elementos batismais próprios da liturgia quaresmal; segundo as circunstâncias, restaurem-se certos elementos da tradição anterior. Diga-se o mesmo dos elementos penitenciais” (SC 109).

É bom entender que a Quaresma não é um tempo de práticas penitenciais ultrapassadas, mas é um tempo de experiência de um Deus que está vivo no nosso meio e quer que todos vivam: “Eu vim para que todos tenham vida” (Jo 10,10). Um tempo em que somos chamados a participar dos sofrimentos de Cristo para participarmos também de sua glória (cf. Rm 8,17). O acento não está, portanto, nas práticas de penitência, mas na graça santificadora do Senhor que nos convida todos os dias à conversão.

Por possuir um caráter fundamentalmente batismal, a Quaresma nos convida a entrar numa dinâmica de permanente conversão para nos mantermos no caminho encetado pelo batismo. Mortos com Cristo, ressuscitamos com ele para uma vida nova. Quem ressuscitou com Cristo busca as “coisas do alto”. Compromete-se com a vida de todas as pessoas, particularmente com aqueles que não contam, que não são visíveis aos olhos da sociedade, os “sobrantes”.

As três práticas propostas pela Igreja, com raiz na tradição judaica são a oração, o jejum e a esmola. Elas nos ajudam no processo de conversão.

O JEJUM quer nos ajudar a deixar de lado o consumismo proposto por uma sociedade governada por ricos e poderosos que querem ganhar sempre mais à custa dos pobres. Querem arrancar o pouco que o pobre tem. Neste tempo é bom a gente aprender a viver com pouco, a reaproveitar as coisas, a levar uma vida mais simples, mais sóbria. Não se trata de passar necessidade ou fome, pois não é isso que Deus quer. Mas a gente pode viver de modo mais simples sem entrar no modismo da sociedade consumista que mata e exclui. Mais do que jejuar, talvez fosse muito proveitoso evitar o desperdício, jogar o lixo na lixeira, manter limpo os espaços públicos; cuidar das fontes e rios; usar a água tratada com mais consciência, como dom do Pai; reutilizar resíduos e água; preocupar-se e solidarizar-se com quem passa necessidade; superar toda forma de violência; ser mais terno e comedido nas palavras; evitar ofender, maldizer; ser mais paciente no trânsito; tomar as dores e defender aqueles que sofrem violência; promover a paz através do diálogo, da tolerância e do respeito às diferenças; maior empenho por uma educação que leve em conta a totalidade da pessoa humana; lutar por um sistema de saúde que trabalhe preventivamente e que cuide com zelo e responsabilidade dos doentes etc. Trata-se de um ‘esvaziar-se’ para encher-se dos sentimentos de Jesus; encher-se da bondade de Deus.

A ESMOLA quer despertar-nos para a solidariedade com os mais pobres. Uma conversão que nos torne capazes de partilhar com os outros os bens e os dons que temos. Que nos mobilize pelas causas justas, em favor dos menores, dos ‘invisíveis’, sem voz nem vez. É a luta contra a ganância que faz tantas vítimas em nosso meio. A esmola nos tira de nós mesmos e nos remete em direção dos irmãos pelo gesto da partilha solidária. Não se trata apenas de darmos algo de nós, mas darmo-nos a nós mesmos. A visita a um doente, idoso, pobre é um bom gesto que ajuda no processo de conversão. É a oferta do tempo que temos para nós e que doamos a alguém. A esmola ajuda a quebrar nosso orgulho, nos dispõe ao desapego dos bens e à partilha, nos aproxima de Deus. “Dar esmola é oferecer um sacrifício de louvor” (Eclo 35,2). E ainda diz a Escritura: “Quem dá a um pobre empresta a Deus, quem lho retribuirá senão ele?” (Pr 19,17).

A ORAÇÃO nos coloca numa profunda comunhão com o Pai. Sem uma vida orientada pela oração não podemos construir um mundo de acordo com o sonho de Deus. E a oração verdadeira é aquela que nos coloca em sintonia com o querer de Deus, que nos move em direção aos pobres e sofredores. Ele veio “para que todos tenham vida”. Aproveitar esse tempo para reforçar a leitura orante da bíblia. Rezar todos os dias algum texto bíblico! Oramos não porque Deus desconhece nossas necessidades, mas porque queremos nos entregar a Ele e descobrir a melhor forma de servi-lo nos irmãos. A Leitura Orante ilumina nosso caminho, nossa vida. Como reza um prefácio da Liturgia Eucarística: “Ainda que nossos louvores não vos sejam necessários, vós nos concedeis o dom de vos louvar. Eles nada acrescentam ao que sois, mas nos aproximam de vós” (Prefácio Comum, IV). Oramos para nos colocarmos na presença de Deus gratuitamente, generosamente. Talvez fosse bom redistribuir o tempo despendido às redes sociais: não deixar que os bate-papos e diversões da internet e séries de TV roubem o tempo da oração.

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A Campanha da Fraternidade deste ano tem como tema: “Fraternidade e Ecologia Intetral”, com o lema: “Deus viu que tudo era muito bom” (Gn 1,31). Vejamos alguns números que nos ajudam a perceber a importância da temática:

“Novamente, Deus nos chama a vivenciar a Quaresma. Desta vez, porém, com um apelo especial a louvá-lo pela beleza da criação, e fazer um caminho decidido de conversão ecológica e a vivenciar a Ecologia Integral. É preciso despertar para “a grandeza, a urgência e a beleza do desafio” de cuidar da Casa Comum (LS, n. 15). Assim, renovados pela força do Espírito Santo, aprendemos a falar “a língua da fraternidade e da beleza na nossa relação com o mundo” criado (LS, n. 11). Então, ao nos sentirmos intimamente unidos a tudo o que existe, brotarão do encantamento a sobriedade e a generosidade (cf. LS, n. 11). No dizer do Papa Francisco, “o mundo é  algo mais do que um problema a resolver; é um mistério gozosos que contemplamos na alegria e no louvor” (LS, n. 12). (Texto-Base, n. 5).

“Colaborar com pastorais, redes eclesiais e educacionais, organizações da sociedade civil, assumindo soluções concretas em defesa da nossa Casa Comum e dos mais pobres e vulneráveis.

Adotar um estilo de vida profundamente crítico e afastado do consumismo e mais focado em valores duradouros e definitivos, cientes de que o ato de comprar e consumir não é apenas econômico, mas um ato com exigentes implicações morais.

Priorizar a compra de produtos locais, orgânicos, vindos da agricultura familiar e agroecológica.

Optar por formas de transporte mais sustentáveis, como o transporte público e a mobilidade ativa, a carona solidária, a bicicleta e a caminhada” (Texto-Base, 156 A).

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

 

 

Agere sequitur esse

aureliano, 13.12.24

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3º Domingo do Advento [15 de dezembro de 2024]

[Lc 3,10-18]

Este 3º Domingo do Advento é considerado pela tradição litúrgica da Igreja, como Domingo Laetare, pela alegria que resplandece nos corações e nas mentes dos fiéis que aguardam para muito breve a celebração do Natal do Senhor: “Canta de alegria, cidade de Sião..., pois o Senhor está no meio de ti” (Sf 3,14-15). “Alegrai-vos sempre no Senhor; eu repito, alegrai-vos... O Senhor está próximo” (Fl 4,4-5). É a proclamação das leituras da Liturgia da Palavra.

Essa alegria que inunda o coração do fiel só é possível pelo perdão de Deus que é dado a quem faz um caminho de conversão. Pois o pecado é a grande fonte de tristeza e de dor para a humanidade. As alegrias da salvação que queremos alcançar, conforme a oração da missa deste domingo, estão profundamente vinculadas ao caminho que fazemos. Aqui podemos nos remeter ao início do capítulo 3º de Lucas (2º domingo do advento): João pregava um batismo de conversão para o perdão dos pecados (cf Lc 3,3). O perdão de Deus é gratuito. Mas Ele não tem como perdoar alguém que não quer se arrepender, não quer mudar de vida, não quer se converter. A conversão é a acolhida do perdão do Pai que, por sua vez, enche o coração de alegria divina.

O relato do evangelho deste domingo mostra os efeitos da pregação de João. Tocadas pelo testemunho e pelas palavras do profeta e asceta João, as pessoas começaram a perguntar: “Que devemos fazer?” Essa pergunta é reveladora do grande mistério que é o ser humano: “O ser humano supera o ser humano”, dizia Paschal. Ou seja, há uma fagulha divina dentro do ser humano que o deixa inquieto, incomodado diante da vida e da história. Ele pode fazer de conta que não existe nada, mas lá no núcleo mais secreto de sua consciência sente um apelo para algo maior do que ele mesmo e os bens que possui. É o sopro de vida insuflado pelo Criador em suas narinas, na criação (cf. Gn 2,7).

Aparecem no texto três categorias de pessoas fazendo a mesma pergunta. E o Batista lhes indica o caminho de acordo com a categoria a que pertencem. Não lhes recomenda jejum, oração, deserto ou outro ato ‘religioso’. Mas vai direto à recomendação de um agir moral, ético para resolver o problema da fome (repartir com os mais pobres), da nudez (vestir os nus: dar dignidade) e da corrupção (não aceitar propina nem sonegar ou desviar impostos) que acarretam dor e sofrimento.

Às multidões João recomenda: “Quem tiver duas túnicas, dê uma a quem não tem; e quem tiver comida, faça o mesmo”. Ou seja, a humanidade precisa preocupar-se, em primeiro lugar, para que ninguém passe fome nem fique ‘nu’. Que todos possam viver com dignidade através da partilha equitativa dos bens. Quantos freezers e guarda-roupas abarrotados, a ponto de não caber mais! Quantas contas bancárias gordas e quanto dinheiro em paraísos fiscais ou em bolsas de valores! Quanto dinheiro público desperdiçado, roubado, desviado! Quanta comida jogada fora, desperdiçada! Enquanto um terço da humanidade passa necessidade e fome! “Que devemos fazer?”

Aos cobradores de impostos, odiados pelos judeus, pois se enriqueciam às custas de seus correligionários, recomenda: “Não cobreis mais do que foi estabelecido”. João não lhes diz que precisam deixar o emprego. Mas que sejam honestos. Essa passagem nos faz lembrar a corrupção presente em nosso meio. É terrível conviver com gente desonesta, mentirosa, injusta, gananciosa. Desde o pobretão até o ricaço, há uma onda de desonestidade e de roubalheira escandalosa em nossa sociedade! De modo geral, se o sujeito tem oportunidade, rouba, engana, tira proveito, pede ou oferece ‘gorjeta’ para dar um “jeitinho”. Faz-se passar por bom, mas é um malvado, ganancioso que faz de tudo para enriquecer-se às custas de outros. Quem paga a conta são os pobres!

A terceira categoria que acorre a João na busca de um caminho de conversão são os soldados. João é enfático: “Não tomeis à força dinheiro de ninguém, nem façais falsas acusações; ficai satisfeitos com vosso salário”. É uma condenação à violência, à dominação, ao uso da força injusta e prevalecida para tirar da pessoa o que ela tem. Uma sociedade que se diz cristã e que emprega suas maiores forças econômicas na fabricação de armas é a maior prova da distância que ainda existe entre o dizer-se cristão e o ser cristão. Temos assistido às tragédias provocadas pela posse e porte de armas. Nesses dias o Congresso Nacional aprovou a tributação de produtos da cesta básica, mas deixou de fora dos tributos ao comércio de armas munição. Por aí se vê onde estão os interesses da maioria de nossos congressistas e legisladores. Sem falar dos espertalhões que se valem dos cargos, do conhecimento das leis, dos espaços de poder, do ‘jeitinho brasileiro’, para engordarem suas contas ou escamotearem suas dívidas e compromissos seja com o Estado seja com os cidadãos que trilham o caminho da paz, do bem e da justiça.

Esse relato do evangelho nos remete a Lc 19,1-10 que trata do encontro de Jesus com Zaqueu. Aquele homem queria se encontrar com o Senhor. Mas, inicialmente, não estava disposto a mudar de vida. Quando vê Jesus entrando em sua casa, refaz seu projeto de vida! Promete fazer um caminho de conversão: “Eu reparto aos pobres a metade dos meus bens e, se prejudiquei alguém, restituo-lhe o quádruplo”. Diante deste propósito do “fazer” de Zaqueu que lhe transforma o “ser”, Jesus lhe diz: “Hoje veio a salvação a esta casa”. A salvação está, de alguma forma, condicionada à conversão. O agir ético, a caridade fraterna, a partilha dos bens, a luta pela justiça, pela igualdade de direitos e pela paz, a luta do cristão por políticas públicas, por melhoria para a população mais pobre. Em uma palavra: a saída de si, como João Batista, o “ex-cêntrico”, isto é, aquele que colocou o Senhor como centro de sua vida, é um caminho de salvação no sentido de ser uma resposta ao amor de Deus que nos salvou em Jesus Cristo.

Uma adágio latino atribuído a Santo Tomás diz que "agere sequitur esse": o agir segue o ser. Ou seja, a essência do ser humano determina seu agir. Assim, se ele é uma pessoa boa, irá praticar atos de bondade; se é uma pessoa verdadeira, irá dizer sempre a verdade; se é uma pessoa gananciosa, irá usar todos os meios possíveis para obter lucro, fazer crescer seu patrimônio financeiro. Portanto, importa cuidar bem de nosso ser, de nossa essência, daquilo que nos define nesta vida como filhos de Deus, seguidores de Jesus, a fim de que nossas nossas ações sejam marcadas pela bondade, justiça e verdade.

“Que devemos fazer?” Ele está com a pá na mão. O Trigo recolherá no celeiro, mas a palha será lançada no fogo inextinguível. Sou trigo ou palha? Qual o meu conteúdo? O que estou fazendo de minha vida? O que cultivo dentro do coração?

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

 

Ouvir os profetas! Buscar a conversão!

aureliano, 06.07.24

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14º Domingo do Tempo Comum [07 de julho de 2024]

   [Mc 6,1-6]

A expressão “santo de casa não faz milagres” é muito comum entre o povo quando se refere a pessoas conhecidas da comunidade ou membros da própria família que deve fazer uma homilia na celebração ou proferir uma palavra profética sobre determinada situação que precisa tomar novo rumo, precisa ser acertada, mudada.

Parece que essa expressão tem raiz e confirmação no evangelho de hoje que mostra uma situação em que Jesus é rejeitado pelos seus: estando em sua cidade, ensinando aos seus correligionários, compatriotas e familiares na sinagoga, estes ficam admirados com sua sabedoria, mas recusam-se a acreditar nele. Jesus então profere a sentença: “Um profeta só não é estimado em sua pátria, entre seus parentes e familiares”. E Jesus “ficou admirado com a falta de fé deles”.

Parece haver aqui dois equívocos: por um lado, prevalecia uma espécie de orgulho e vaidade que só levava a dar crédito em quem tivesse posses, conhecimento profundo das ciências, fosse de família rica, reconhecida, mestre no conhecimento da Escritura, parecendo que Deus chama somente esse tipo de pessoas para anunciar seu Reino. Por outro lado havia também um sentimento de inferioridade que levava as pessoas a se recusar ouvir uma palavra sábia de quem fosse de origem simples, pobre, (semi-)analfabeto, comum como os demais.

O fato é que, para ser ouvido na assembleia, precisava ser pessoa que gozasse de reconhecimento social, de influência política, membro reconhecido da hierarquia.

Talvez seja essa também a nossa dificuldade, ainda hoje. Se a pessoa não tem influência política, religiosa e econômica, não é ouvida. É muito difícil reconhecer a presença de Jesus e uma palavra profética num ‘Seu Zé’ ou numa ‘Dona Maria’ que nos diz que precisamos olhar com mais cuidado para nossos irmãos mais pobres e sofredores. Que precisamos descer do trono e acolher o pequeno, o doente, o embriagado, o presidiário. Que precisamos ser mais honestos e justos nos nossos negócios. Que precisamos ser mais comprometidos com a família e com a comunidade. Que precisamos aprender a partilhar os dons e os bens. Que precisamos zelar pela Mãe-Terra, não apoiando nem votando em candidatos políticos que contrariam os cuidados com o meio ambiente e não se empenham por políticas públicas em favor da população carente. O “Seu Zé” e a “Dona Maria” muitas vezes nos dão uma lição de vida cristã que nos deixa envergonhados!

O que é que nos faz mudar de atitude? Uma fé autêntica em Jesus que se fez pobre para nos enriquecer com sua pobreza (Cf. 2Cor 8,9). Acreditar, isto é, entregar-se a esse homem que passou trinta anos numa vida oculta tão simples que, quando inicia sua missão e diz uma palavra profética, dizem dele: “Este homem não é o carpinteiro, filho de Maria...?” Não se prevaleceu de ser igual a Deus, mas humilhou-se, fazendo-se um de nós (Cf. Fl 2, 5-11).

Para quem não quer crer, a vida de Jesus nada revela. Jesus só transforma a vida daquele que dele se aproxima com humildade, simplicidade e de coração aberto. Ele não buscou aplausos, reconhecimento social, sucesso, posses de bens e poder político. Ele buscou, acima de tudo, a vontade do Pai. É o que mais lhe interessava. E a vontade do Pai era salvar a todos, particularmente, os mais pequeninos (Cf. Jo 6,39).

É essa fé de Jesus que devemos alimentar em nós. Mais do que ter fé em Jesus, precisamos ter a fé que o animava. Aquele espírito de entrega, de comunhão, de sacrifício, de oferta de si, de acolhida, de encantamento e entusiasmo pelo Reino. Jesus não desanimava, mesmo quando não era aceito ou reconhecido. Continuava seu caminho. Tinha firmeza porque confiava no Pai.

Será que não está faltando em nós um pouco mais de humildade para reconhecer a ação de Deus que nos fala nos gestos e palavras dos simples e humildes, pessoas que nós conhecemos, que moram na nossa rua, participam de nossa comunidade, ou mesmo parentes nossos? Será que não nos está faltando um pouco desse espírito que animava a vida de Jesus para que nossa participação na transformação da comunidade e da sociedade seja mais eficaz? Será que o espírito de grandeza não nos quer invadir quando buscamos ou proferimos belos discursos, porém, vazios de atitudes evangélicas? Ou mesmo quando nos recusamos ouvir e prestar mais atenção aos “santos de casa” para acolhermos melhor a Palavra de Deus que nos transmitem?

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O PECADO

Penso que o relato do evangelho de hoje (Mc 6,1-6), unido ao à primeira leitura: “corações empedernidos” (Ez 2,2-5), leva-nos a considerar um pouco a realidade do pecado na Igreja e no mundo.

O que notamos nos contemporâneos e correligionários de Jesus é a recusa em ver naquele Homem de Nazaré a manifestação do querer de Deus. Um profeta que aponta caminhos novos, mudança de hábitos, atitudes que expressem uma fé vivencial e não apenas cultual, ritual.

A história do povo de Israel revela uma caminhada de muitas vicissitudes. A idolatria sempre foi uma grande tentação: abandono do projeto de Deus para atender aos instintos egoístas do poder, do ter e do prazer. Eram tentados a seguir as práticas dos povos vizinhos que viviam segundo os ídolos. Eram levados a acreditar que as alianças com grandes reis e nações pagãs lhes trariam segurança e riqueza. Além do mais, aqueles que ocupavam os altos cargos do poder imitavam nos povos vizinhos submetendo os agricultores e trabalhadores à escravidão e cobrando altos impostos para sustentar as regalias da vida palaciana. Assim iam se afastando cada vez mais do único e verdadeiro Deus que os libertara da escravidão do Egito. A liderança do povo de Israel perfazia um caminho de incredulidade que, por sua vez, levava todo o povo à infidelidade.

Estas considerações são importantes para compreendermos a reação da liderança dos judeus do tempo de Jesus diante de seus gestos e palavra proféticos. A liderança judaica dava continuidade à tradição perversa dos pais. Era o pecado da rejeição, da recusa à conversão. Diante da quebra de suas expectativas perversas se recusam a aceitar e acolher a manifestação de Deus na pessoa de Jesus que os conclamava à conversão.

Portanto, as influências da sociedade – “povos vizinhos” - podem nos afastar do caminho de Deus. As ideologias, os ódios guardados, o desejo de vingança, as propinas, o dinheiro fácil, a má companhia, a busca de si e dos próprios interesses, o uso do outro em benefício próprio, o consumismo desenfreado, o suborno, a mentira, a incoerência de vida, as “rachadinhas”, o dinheiro desonesto, a instrumentalização da religião e da boa fé das pessoas simples, os adultérios e as fornicações sem escrúpulo etc. São algumas das tentações que seduzem o cristão e o homem de bem, afastando-o de uma vida em Deus para um mundanismo destruidor da vida.

O pecado é a recusa de comunhão com Deus, provocando a desagregação da humanidade. Uma força de gravidade que nos afasta do bem, da luz, da verdade, da justiça, de Deus. Leva à alienação do ser humano em relação aos verdadeiros valores que consolidam a unidade e o sentido da vida humana. Pecar é dizer não ao amor de Deus oferecido a nós na entrega de seu Filho amado. Pecar é optar pelo autocentramento, pela autorreferencialidade, pela busca de si mesmo, pela não-mudança de hábitos e atitudes contrários ao amor de Deus.

Rejeitar a atitude profética de Jesus de Nazaré leva a humanidade a um descaminho desagregador e autodestruidor. Por isso o cristão, ainda que atormentado pela necessidade de lutar contra o pecado e suas consequências todos os dias, busca força e sustentação na oração, na Eucaristia, na Palavra proclamada, refletida e rezada, na comunidade, para alimentar sua esperança, pois esta “não decepciona, porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado” (Rm 5,5).

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

Quaresma: conversão para vencer o mal

aureliano, 16.02.24

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1º Domingo da Quaresma [18 de fevereiro de 2024]

[Mc 1,12-15]

Estamos iniciando a Quaresma. Como nosso processo catequético é bastante fraco, certamente muitas pessoas não sabem o que significa esse tempo litúrgico da Igreja. O termo quaresma nos remete ao número quarenta, pleno de significado na Sagrada Escritura. Encontramos Jesus que passa quarenta dias e quarenta noites no deserto preparando-se para a missão que o Pai lhe confiara. Assemelha-se a Moisés que jejuou durante quarenta dias e quarenta noites no monte Horeb (Ex 24, 18; 34, 28; Dt 9,11). Também Elias, alimentado pelo pão do céu caminhou quarenta dias e quarenta noites até o monte que o Senhor lhe indicara (1Rs 19,8). Outro elemento significativo foi a peregrinação do povo de Israel durante quarenta anos no deserto, rumo à terra prometida (Dt 2,7), alimentado e assistido pelo Senhor.

O evangelho de Marcos, mais resumido do que os outros, tem como propósito responder à pergunta: “Quem é Jesus?”. No início o Pai confirma: “Tu és o meu Filho bem amado” (Mc 1,11). No final, o centurião reconhece: “Verdadeiramente este homem era Filho de Deus” (Mc 15, 39). Portanto, os discípulos podem acreditar nele, segui-lo com confiança, pois ele é o Filho de Deus que veio salvar a humanidade.

Jesus deve enfrentar as forças do mal. Por isso é conduzido pelo Espírito Santo ao deserto a fim de se preparar para essa grande missão. À semelhança do povo de Israel no deserto que foi tentado muitas vezes, Jesus resume em sua pessoa essa caminhada e experiência, vencendo, pela sua fidelidade, as tentações do maligno, garantindo assim, aos que crêem na sua Palavra, a ressurreição e a vida, a Terra Prometida.

Nessa caminhada quaresmal acompanhemos Jesus na sua entrega por nós. É tempo de reafirmar a fé e o compromisso batismais. As primeiras palavras de Jesus no evangelho de Marcos nos devem acompanhar ao longo deste tempo de preparação para a Páscoa: “O tempo já se completou e o Reino de Deus está próximo. Convertei-vos e crede no evangelho” (Mc 1,15). Conversão e entrega confiante à Boa Nova é a meta do cristão.

Conversão, do grego metanoia: meta significa revolução, inversão de caminho; noia signfica mente, pensamento. Então conversão nos convida a tomar um caminho novo a partir de Jesus Cristo. Zaqueu assumiu caminho novo a partir do encontro com Jesus Cristo: devolveu o que havia roubado e distribuiu com os pobres parte de seus bens (cf. Lc 19,1-10). A pecadora que encontrara Jesus na casa de Simão deixou para trás sua vida de pecado a partir da experiência do amor de Deus que ela encontrara em Jesus Mestre (cf. Lc 7,36-50). Então, conversão é deixar aquelas realidades de pecado, de maldade, de fofoca, de mentira, de palavras agressivas, de gestos ofensivos, de ganância pelos bens e sucesso, de conluio para prejudicar a outros, de fuga das responsabilidades, de preguiça em servir, de busca de satisfação dos instintos egoístas, de bebedeiras e noitadas, de amizades perversas, de fechamento às propostas da Igreja. Precisamos rever nossa vida, nossa entrega, nossa disponibilidade para servir generosamente. É tempo de conversão. O sino que nos convida à conversão vai nos chamar a participar da despedida de alguém. Um dia inevitavelmente tocará para nossa partida! O tempo se cumpriu! É tempo de conversão!

São João diz que “a vitória que vence o mundo é a nossa fé” (1 Jo 5,4). Esta é dom recebido no batismo. Ninguém crê no evangelho a partir de suas próprias forças, mas pelo dom de Deus recebido no batismo. Ensina Bento XVI: “Ao início do ser cristão, não está uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um acontecimento, com uma Pessoa que dá à vida um novo horizonte e, dessa forma, o rumo decisivo” (Deus é Amor, n. 01).

Nesse tempo quaresmal a Igreja nos convida a rever nossa caminhada de batizados, de comprometimento com a pessoa de Jesus e com a Igreja. Convida a olhar onde estamos na caminhada cristã. Em que precisamos nos converter para vivermos uma fé de verdade: reta, sincera, comprometida. Convida-nos a verificar quais são as tentações que mais nos acometem e nas quais mais caímos. Coloca em nossas mãos os recursos que nos fortalecem contra o espírito do mal.

A vida de Jesus foi marcada pelas tentações do maligno que queria fazê-lo desviar-se da vontade do Pai. Também nós somos acometidos por todo tipo de tentação que nos quer desviar do caminho de Jesus. Sozinhos não damos conta do mal. Mas com a força de Deus podemos vencê-lo. Então busquemos nesta fonte inesgotável as energias e o sustento que nos colocam em permanente estado de conversão a uma vida sempre mais parecida com a vida do Mestre Jesus.

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O DESERTO

“O Espírito levou Jesus para o deserto” (Mc 1,12). O deserto, na Sagrada Escritura, é um categoria teológica. É um lugar de oração, de encontro e escuta de Deus, mas também um lugar de provas e tentações: “Aí Jesus foi tentado por Satanás”.

É importante considerar que Jesus foi ‘levado’. Ele não foi por conta própria, por si mesmo. Também, nós cristãos, somos levados para o deserto da vida, para situações de incompreensão, de falta de fé, de desprezo da religião, ou mesmo de crises pessoais de fé e de sentido de vida. Quantas vezes somos questionados a respeito da religião e da fé! Qual é mesmo o sentido de participar de uma comunidade, de realizar essa ou aquela expressão de fé? Esses embates ajudam a amadurecer nossa fé: oportunidade de passar de uma fé infantil a uma fé adulta, responsável, comprometida.

No evangelho, Satanás é o mesmo que Adversário, Inimigo de Deus. Aquele que age sempre contra o bem e a justiça. Acompanhando o noticiário sobre a corrupção generalizada no nosso País, a disseminação do ódio (até mesmo dentro da Igreja, nas famílias e nas religiões), notamos a ação de Satanás, o Adversário, que leva o ser humano a agir egoisticamente, lesando o Estado, a comunidade, os pobres, por vezes a própria família, gerando divisão e discórdia. E sem peso de consciência! Sem nenhum escrúpulo.

A corrupção que não está somente nos altos escalões de governos e empresas, mas que se repete, guardadas as proporções, nos pequenos espaços e negócios de família, de vizinho, de trabalho, está instalada nas estruturas sociais. Vivemos uma espécie de cultura da corrupção e desonestidade. Para nossa tristeza, a afirmação “sem desonestidade não se pode sobreviver nesse País”, ganha força cada vez maior.

O deserto pode ser, pois, a escola, o ambiente de trabalho, a rua, a política, os espaços esportivos, o shopping, o roçado, até mesmo a comunidade eclesial. Enfim, aquelas realidades que podem nos aproximar de Deus bem como nos afastar dele. Espaços em que somos postos à prova.

O que importa é não perdermos de vista o Espírito Santo que nos leva ao deserto e que nos fortalece no combate contra o mal. Se no deserto havia os ‘animais selvagens’, ou seja, aquelas tentações que sempre ameaçam o projeto de Jesus, havia também os ‘anjos’ que o serviam, ou seja, o cuidado e carinho de Deus Criador para com aqueles que lhe são fiéis na prova. Importa crer que o Senhor não nos abandona jamais! Na força dele vencemos as forças do mal.

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Campanha da Fraternidade 2024

“O amor social se traduz em atos de caridade que criam instituições mais sadias e estruturas mais solidárias. Estruturar a sociedade, por exemplo, ‘de modo que o próximo não venha a se encontrar na miséria’ é um ato de caridade que, segundo o Papa, tem a conotação de ‘amor político’. A política é o mais alto grau da caridade, afinal dar de comer a um desempregado é expressão de amor, mas assegurar o direito de trabalho a muitos, pela ação política, é expressão intensa de amor, porque os emancipa e os dignifica. Embora a caridade política englobe a todos, ‘o núcleo do autêntico espírito da política’ é o ‘amor preferencial pelos últimos’. Por isso, o Papa Francisco propõe à humanidade, particularmente às lideranças religiosas e políticas, a construção da cultura do diálogo, da reconciliação e da paz, atuando juntos em favor do bem comum e a promoção dos mais pobres” (Texto-Base, 21).

“‘Todos os homens devem estar livres de coração, quer por parte dos indivíduos, quer dos grupos sociais ou qualquer autoridade humana; e de tal modo que, em matéria religiosa, ninguém seja forçado a agir contra a própria consciência (...) O direito à liberdade religiosa se fundamenta na própria dignidade da pessoa humana, que a Palavra revelada de Deus e a própria razão dão a conhecer’ (Vaticano II, DH, 2).  Precisamos estar atentos: entre os cristãos, que deveriam ser conhecidos pelo amor mútuo (cf. Jo 13,35), têm sido difundidas palavras e atitudes de difamação, perseguição, calúnia e ódio, estabelecendo relações de inimizade a partir das quais uma pessoa se vê como maior e melhor que a outra. Entre nós não deve ser assim, ensina-nos Jesus (cf. Mt 20,26)” (Texto-Base, 36).

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

 

Eis o tempo de conversão

aureliano, 13.02.24

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Quarta-feira de Cinzas [14 de fevereiro de 2024]

[Mt 6,1-6.16-18]

Não nos é dado saber com certeza data e local precisos do surgimento da Quaresma na vida litúrgica da Igreja. O que sabemos é que ela foi se formando progressivamente. Estava entranhada na consciência dos cristãos a necessidade de dedicar um tempo em preparação à celebração da Páscoa do Senhor. As primeiras alusões a um período pré-pascal estão registradas lá pelo século IV. Consta também que, na Quinta-Feira Santa, acontecia a reconciliação dos pecadores; e que na Vigília Pascal se realizavam os batizados dos catecúmenos (aqueles que estavam preparados para o batismo). Esses dois costumes, vividos desde a antiguidade da fé cristã, vem mostrar que esse tempo nos remete à renovação das promessas batismais ou preparação para o batismo e a práticas penitenciais que nos levem a uma conversão profunda do coração.

A propósito desse elemento da história, o Concílio Vaticano II recomenda: “Tanto na liturgia quanto na catequese litúrgica, esclareça-se melhor a dupla índole quaresmal, que, principalmente pela lembrança ou preparação do batismo e pela penitência, fazendo os fiéis ouvirem com mais frequência a Palavra de Deus e entregarem-se à oração, os dispõe à celebração do Mistério Pascal. Por isso, utilizem-se com mais abundância os elementos batismais próprios da liturgia quaresmal; segundo as circunstâncias, restaurem-se certos elementos da tradição anterior. Diga-se o mesmo dos elementos penitenciais” (SC 109).

É bom entender que a Quaresma não é um tempo de práticas penitenciais ultrapassadas, mas é um tempo de experiência de um Deus que está vivo no nosso meio e quer que todos vivam: “Eu vim para que todos tenham vida” (Jo 10,10). Um tempo em que somos chamados a participar dos sofrimentos de Cristo para participarmos também de sua glória (cf. Rm 8,17). O acento não está, portanto, nas práticas de penitência, mas na graça santificadora do Senhor que nos convida todos os dias à conversão.

O Cardeal José Tolentino traz-nos uma reflexão que pode nos ajudar a entrar no sentido mesmo da quaresma: “Vamos começar a quaresma por quê? Não apenas por uma imposição do calendário litúrgico, mas porque precisamos renascer. Sentimos o inacabamento, percebemos que é-nos possível ser mais e que está ao nosso alcance viver com mais autenticidade a nossa condição de discípulos de Jesus. (...) Começamos a quaresma porque somos chamados a dar lugar ao Espírito em nossas vidas. (...) Começamos a quaresma porque acreditamos no amor de Deus. (...) As mudanças que contam em nossa vida não acontecem de um dia para o outro ou de forma espontânea. Acontecem no meio de um paciente combate interior. Temos de estar preparados para um caminho exigente e através de muitas tentações. É muito fácil sermos crentes de bancada, cristãos de sofá, fregueses do templo”.

Por possuir um caráter fundamentalmente batismal, a Quaresma nos convida a entrar numa dinâmica de permanente conversão para nos mantermos no caminho iniciado pelo batismo. Mortos com Cristo, ressuscitamos com ele para uma vida nova. Quem ressuscitou com Cristo busca as “coisas do alto”. Compromete-se com a vida de todas as pessoas, particularmente com aqueles que não contam, com os invisíveis da sociedade, os “sobrantes”, os descartados.

As três práticas propostas pela Igreja, com raiz na tradição judaica, são a oração, o jejum e a esmola. Devidamente compreendidas e vividas podem nos ajudar no processo de conversão.

O JEJUM quer nos ajudar a deixar de lado o consumismo proposto por uma sociedade governada por ricos e poderosos que querem ganhar sempre mais à custa dos pobres. Querem arrancar o pouco que o pobre tem. Neste tempo é bom a gente aprender a viver com pouco, a reaproveitar as coisas, a levar uma vida mais simples, mais sóbria. Não se trata de passar necessidade ou fome, pois não é isso que Deus quer. Mas a gente pode viver de modo mais simples sem entrar no modismo da sociedade consumista que mata e exclui. Mais do que jejuar, talvez fosse muito proveitoso evitar o desperdício, jogar o lixo na lixeira, manter limpo os espaços públicos; cuidar das fontes e rios; usar a água tratada com mais consciência, como dom do Pai (não deixando a torneira aberta sem necessidade); reutilizar lixo e água; preocupar-se e solidarizar-se com quem passa necessidade; superar toda forma de violência; ser mais terno e comedido nas palavras; evitar ofender, maldizer; ser mais paciente no trânsito; tomar as dores e defender aqueles que sofrem violência; promover a paz através do diálogo, da tolerância e do respeito às diferenças; maior empenho por uma educação que leve em conta a totalidade da pessoa humana; lutar por um sistema de saúde que trabalhe preventivamente e que cuide com zelo e responsabilidade dos doentes etc. Trata-se de um ‘esvaziar-se’ para encher-se dos sentimentos de Jesus; encher-se da bondade de Deus. “Jejum não é somente privar-se do pão, é também dividir o pão com o faminto” (Papa Francisco).

A ESMOLA quer despertar-nos para a solidariedade com os mais pobres. Uma conversão que nos torne capazes de partilhar com os outros os bens e os dons que temos. Que nos mobilize pelas causas justas, em favor dos menores, dos ‘invisíveis’, sem voz nem vez. É a luta contra a ganância que faz tantas vítimas em nosso meio. A esmola nos tira de nós mesmos e nos remete na direção dos irmãos pelo gesto da partilha solidária. Não se trata apenas de darmos algo de nós, mas darmo-nos a nós mesmos. A visita a um doente, idoso, pobre é um bom gesto que ajuda no processo de conversão. É a oferta do tempo que temos para nós e que doamos a alguém. Papa Francisco ensina que não basta doar, mas é preciso doar-se: “A caridade sempre supõe uma doação oblativa da própria vida. Isso será significativo, além de uma ação concreta, quando oferecer à pessoa uma porta aberta para uma vida nova” (Papa Francisco à Caritas, em 05/09/22).

A ORAÇÃO nos coloca numa profunda comunhão com o Pai. Sem uma vida orientada pela oração não podemos construir um mundo de acordo com o sonho de Deus. E a oração verdadeira é aquela que nos coloca em sintonia com o querer de Deus, que nos move em direção aos pobres e sofredores. Ele veio “para que todos tenham vida”. Aproveitar esse tempo para reforçar a leitura orante da bíblia. Rezar todos os dias algum texto bíblico! Oramos não porque Deus desconhece nossas necessidades, mas porque queremos nos entregar a Ele e descobrir a melhor forma de servi-lo nos irmãos. A Leitura Orante ilumina nosso caminho, nossa vida. Oramos para nos colocarmos na presença de Deus gratuitamente, generosamente. Talvez fosse bom redistribuir o tempo despendido às redes sociais: não deixar que os bate-papos e diversões da internet roubem o tempo da oração.

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A Campanha da Fraternidade deste ano tem como tema: “Fraternidade e Amizade Social”, com o lema: “Vós sois todos irmãos e irmãs” (Mt 23,8). Vejamos alguns números que nos ajudam a perceber a importância da temática:

“Os tempos atuais e o Papa Francisco nos desafiam a ‘ir além dos grupos de amigos e construir a amizade social, tão necessária para a boa convivência (...) [fugindo] da inimizade social, que só destrói (...). Isso nem sempre é fácil, principalmente hoje, quando parte da sociedade e da mídia se empenha em criar inimigos para derrotá-los em um jogo de poder” (Texto-base, 07).

“Amizade social é o amor que ultrapassa as barreiras da geografia e do espaço. Amizade social é uma fraternidade aberta, que permite reconhecer, valorizar e amar todas as pessoas, independentemente da sua proximidade física. Amizade social é um amor desejoso de abraçar a todos. Amizade social é comunicar com a vida e o amor de Deus, recusando impor  doutrinas por meio de uma guerra dialética. Amizade social é viver livre de todo desejo de domínio sobre os outros. Amizade social é o amor que estende para além das fronteiras, para todo ser vivo. Amizade social é a nossa vocação para formar uma comunidade feita de irmãos que se acolhem mutuamente e cuidam uns dos outros”(TB, 16).

“O pecado nos distancia do projeto de Deus e faz-nos enxergar as diferenças, divergências e oposições não como riquezas, oportunidades ou mesmo obstáculos a serem superados, mas como características dos inimigos a serem abatidos. É preciso que fique muito claro que a subjetividade é um valor, as diferenças não são um problema e a solução não é a homogeneidade de pensamento” (TB, 27).

“É interessante notar que, desde o Gênesis, o mal que penetra no mundo tem suas raízes na quebra das relações fraternas” (TB, 96).

“É importante encontrar e criar oportunidade para propor a reflexão da CF 2024 nas celebrações comunitárias, nas catequeses, nos conselhos diocesanos, paroquiais e comunitários, nos encontros e reuniões de grupos pastorais e movimentos eclesiais, nas escolas e nas câmaras legislativas. O que importa é insistir no que é a CF em si mesma, um instrumento de comunhão eclesial, de formação das consciências e do comportamento cristão e de edificação de uma verdadeira fraternidade cristã e amizade social entre os brasileiros” (134).

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

 

Tempo, conversão e seguimento

aureliano, 19.01.24

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3º Domingo do Tempo Comum [21 de janeiro de 2024]

[Mc 1,14-20]

A liturgia deste domingo nos convida a refletir, isto é, a nos dobrarmos (re-flectere) sobre três elementos constitutivos da caminhada cristã: o tempo, a conversão e o seguimento a Jesus.

No domingo passado, a partir do evangelho de João, refletimos a respeito da vocação, chamado de Deus para a comunhão com ele e para uma missão. O encontro com Jesus é determinante na busca pelo sentido da vida. Quando fazemos com ele um encontro de verdade, nossa vida toma nova direção, novo sentido. E transbordamos para os outros a experiência que fizemos: André chama seu irmão Simão e o apresenta a Jesus (cf. Jo 1, 40-42). Se nossa missão não proceder de um transbordamento da experiência do encontro com o Senhor, não é cristã. Poderá ser vaidade, fanatismo, prepotência, autoengano. Pois a missão não é nossa, mas de Deus (Missio Dei). Vamos conferir como anda a realização da missão que o Senhor nos confiou. Que rastros temos deixado, que tipo de semente temos semeado?

O TEMPO: Na liturgia da palavra de hoje encontramos referências ao tempo. Na primeira leitura, lemos: “dentro de quarenta dias”; na segunda leitura temos: “O tempo está abreviado... A figura deste mundo passa”; e no evangelho: “O tempo já se completou e o Reino de Deus está próximo”.

Podemos considerar o tempo em três dimensões: o tempo cósmico, regulado pelos ciclos da natureza; o tempo histórico, regulado pelo fluxo dos acontecimentos; e o tempo teológico, vivido à luz da fé num Deus para quem não existe passado nem futuro, mas um eterno presente: “Nasceu para vós, hoje, o Salvador” (cf. Lc 2,11). “Hoje, a salvação entrou nesta casa” (cf. Lc 19,9). “Hoje mesmo estarás comigo no paraíso” (cf. Lc 23,43).

O tempo cósmico, entrelaçado ao tempo histórico, ajuda a perceber os dias e as horas, os acontecimentos que vão determinando novos rumos para a humanidade, novo modo de se relacionar etc. Assim, quando a pessoa vai ficando mais velha, vai percebendo que fica mais limitada e precisa se relacionar com a natureza e com as pessoas de modo diferente. Percebe que a juventude se foi. Já para o jovem trabalhador ou estudante, a dinâmica se dá de modo diferente. Precisa correr contra o tempo para não “sobrar”.

Do ponto de vista da história, com o passar do tempo, os acontecimentos na política, na economia, na cultura vão modificando as relações. Elementos novos vão surgindo e medidas novas precisam ser tomadas para que a história se construa de maneira a ajudar o ser humano a encontrar sentido para sua vida. Fazendo memória da política brasileira podemos identificar onde estão as forças perversas e geradoras de morte: desvio dos recursos destinados ao combate do corona vírus; falta de empenho na produção e compra da vacina; falta de cuidado com os acometidos pela enfermidade. Olhando para a história de nossa Igreja podemos ver aí os sinais de vida trazidos pela renovação do Concílio Vaticano II e as forças retrógradas insistindo em “voltar atrás”. Culturalmente falando vivemos um momento terrível: se, por um lado, crescem os avanços da técnica e da ciência, por outro, paradoxalmente, a perplexidade diante do futuro aumenta, pois a vida está sempre mais ameaçada.

Minha intenção é ressaltar o tempo chamado pelos gregos de kairós: tempo sem medida, sem relógio, tempo de Deus. O tempo teológico. Aqui não prevalecem dias, meses ou anos, mas a experiência de Deus que cada um faz. É um tempo que não comporta quantificação. Neste tempo a pessoa pode viver 80 anos ou mesmo 10 anos: não contam os anos, nem tampouco conhecimento, dinheiro, bens, poder. O que conta é a vida vivida em Deus e a partir d’Ele.

A CONVERSÃO: Chegou o tempo de Deus. Jesus quer dar um novo sentido à vida humana. Por isso ele convida à conversão. Converter-se é mudar de direção quando o rumo que encetamos  não confere com o projeto de Jesus. Converter-se é convergir a atenção e as forças para uma única direção: o Reino de Deus. É sair da dispersão que desperdiça as energias em muitas coisas que prejudicam o crescimento do Reino de Deus. Então aqui o tempo é breve: não se pode esperar muito. Não se trata de deixar para mudar de vida quando estiver mais velho, quando estiver aposentado, quando não tiver mais forças para continuar numa vida depravada ou perversa. Seria causar um enorme prejuízo ao Reino. Deus precisa de nossas forças, de nossas energias bem empregadas para fazer o Reino acontecer.

No próximo dia 25 celebramos a festa da Conversão de São Paulo. Um motivo a mais para repensarmos nossa vida, as possibilidades que o Senhor nos dá e empregá-las sempre para o bem do próximo. Para isto é preciso abertura de coração, coragem de mudar, abertura ao novo, ao inesperado de Deus que vem a nós, por vezes, através de um irmão ou acontecimento que nos surpreende. - De que preciso me converter? O que preciso mudar em minha vida para que eu seja mais fraterno, mais manso, mais amável, mais misericordioso, mais tolerante, mais justo, mais respeitoso? De que me acusa minha consciência?

O SEGUIMENTO: Jesus quer contar com colaboradores para revelar seu Reino ao mundo (re-velar é tirar o véu da maldade e do pecado que retardam a realização do Reino). Jesus é o profeta de Deus. Os sinais milagrosos que realiza servem para mostrar que Deus está com ele. Jesus não veio para fazer milagres, mas para mostrar que Deus nos ama e quer que participemos ativamente de seu projeto de amor.

Ao chamar os primeiros discípulos, conforme o evangelho de hoje relata, Jesus mostrou que não queria trabalhar sozinho. Ele quis contar com colaboradores. E estes deviam fazer alguns cortes em sua vida. Deviam se converter, tomar um novo rumo. Mudar de horizonte e de foco. Por isso deixam redes, barcas e família. Não temos nesse mundo morada permanente. “Os que têm mulher vivam como se não a tivessem” (1Cor 7,29). A vida do cristão deve ser vivida de modo kairológico, no tempo de Deus, para Deus.

Ao libertar o endemoninhado, Jesus mostra que Deus nos quer livres de todo mal que nos oprime e que é superior às nossas forças. Por isso precisamos da força de Deus manifestada em Jesus. Vivendo em comunidade, enfrentemos o mal na força e na palavra de Jesus. A conversão nos introduz na dinâmica de Jesus, de maneira que nosso modo de viver vai dando um novo jeito de ser ao mundo que nos cerca. As forças da maldade vão se dissipando pela presença da Graça e da Luz de Deus. Quando não revidamos com violência uma palavra ou atitude ofensiva. Quando não nos deixamos levar pela ganância. Quando nos solidarizamos com o sofrimento do ser humano e fazemos algo para lhe aliviar a dor, seja com atitudes individuais, seja organizando e somando forças para conseguir melhorias para a rua, o córrego, o bairro, a escola, o posto de saúde etc. É para isso que o Senhor nos chama e conta conosco.

Estes três elementos que destacamos na liturgia da Palavra de hoje querem nos ajudar a perceber que a vida é dom de Deus e deve ser vivida de tal maneira que ela seja um sinal do amor de Deus no mundo. Vivendo assim experimentaremos a alegria de viver, mesmo em meio a sofrimentos. Estes serão convertidos em fonte de vida, porque unidos à vida de Jesus.

O Servo de Deus, Pe. Júlio Maria, fundador de nossa Congregação Sacramentina, procurou fazer de sua vida um dom. Um homem que fez dos 66 anos de vida um Kairós, um tempo de Deus e para Deus no serviço aos irmãos e irmãs, tornando-se, assim, uma inspiração para nossa vida cristã.

O tempo é breve. A figura deste mundo passa. Então façamos o bem enquanto é tempo.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

A coerência de vida: não basta dizer

aureliano, 30.09.23

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26º Domingo do Tempo Comum [1º de outubro de 2023]

[Mt 21,28-32]

Neste e nos dois domingos subsequentes temos três parábolas de Mateus mostrando o que acontece àqueles que, embora conhecendo, rejeitam a graça de Deus. É próprio da liturgia, na aproximação do final do ano litúrgico, acentuar os temas da conversão e da graça, mostrando, com clareza, o final escatológico pelo qual deve passar todo ser humano. Quando o justo se desvia do caminho de Deus, ele se perde. Porém, quando o malvado se converte, ele se salva.

Na parábola de hoje não está em jogo a mudança de postura - ambos mudaram -, mas o objeto da adesão: a vontade do pai. Estamos acostumados a dizer “sim, senhor” a tudo. Há uma tendência dentro de nós em buscar sempre agradar para resolvermos nossa situação ou para não experimentarmos os dissabores por vezes provocados pela atitude coerente e verdadeira. Se atende a meus interesses, se me for vantajoso, faço o que o Evangelho propõe ou a Igreja pede, mas se exigir de mim esforço, conversão, mudança de mentalidade, então procuro dar o ‘jeitinho brasileiro’. Em outras palavras: costumamos dizer “sim”, mas fazemos o que queremos ou o que mais nos convém.

Jesus conta esta parábola aos chefes da religião: liderança religiosa. Estes eram peritos em explicá-la aos outros, em dizer o que Deus queria. Cuidavam do templo, das sinagogas, dos livros sagrados. Mas não viviam o que ensinavam. Uma religião de fachada. Ter a bíblia nas mãos, falar sobre a fé para os outros, frequentar o templo são atitudes muito comuns em nosso meio. Mas encontrar quem vive uma vida coerente com a fé professada é bastante raro. Parece que o problema do mundo não está na descrença, pois ‘crentes’ os há aos milhões. Parece mesmo que o problema é a falta de coerência de vida. Que sentido tem pronunciar com os lábios minha fé em Jesus se minha vida não expressa esforço em segui-lo? Corremos o risco de transformar a fé em ‘religião semanal’. Ou seja, nos cercamos de atos religiosos em casa ou no templo, mas não permitimos que Deus penetre e perpasse nossa vida, nossa família, nossas decisões, nossos negócios, nosso trabalho etc. É uma triste constatação, mas o que mais vemos por aí é uma religiosidade de conveniência: ser de uma outra religião enquanto atende aos próprios interesses.

As contundentes palavras de Jesus: “as prostitutas e os publicanos vos precederão no Reino de Deus” nos fazem pensar mais seriamente sobre nossa vida quando nos julgamos “bons” e “justos”. Os que estão à margem, aqueles que não contam, acolhem a Jesus, ao passo que as elites o rejeitam. Há mulheres que se prostituem para ganhar o pão de cada dia e dar de comer a seus filhos. E os “bons” compram seus ‘serviços’. Há ‘publicanos’ que subornam e sonegam porque há “bons” que usam seus serviços ou lhes favorecem a pilantragem. Há corruptos porque existem aqueles que se deixam corromper. Algum dia as meretrizes e os publicanos poderão descobrir que há outro caminho para viverem com dignidade e honestidade sua vida, se forem ajudados pelos que buscam fazer a vontade do Pai.

Percebemos pela parábola que os “bons” precisam de conversão para entrar no Reino. Aos pecadores talvez seja mais fácil fazer um caminho de conversão: não tem mesmo nada a perder nem de que se envergonhar. Aos “bons”, acostumados aos primeiros lugares, certamente custa muito deixar seu posto de “justos” para assumir um caminho de humildade, de simplicidade, de discipulado.

Não adianta ter o rótulo de justo dizendo que vai à missa, que recebe os sacramentos, que está em dia com os mandamentos de Deus e as leis da Igreja. Estar de bem com Deus não é direito adquirido. É preciso fazer a vontade de Deus, viver como Deus quer. A vida que agrada a Deus não se contabiliza por uma somatória de práticas e ritos realizados, mas a integração fé e vida. Ou seja: o sim da fé deve ser o sim da vida. A confissão dos lábios deve tornar-se ação e gestos das mãos. O “sim” e o “não” não passam pela observância externa das leis, mas através da vida. A verdade do ser humano se descobre por suas obras. É aí que ele se dá a conhecer. É pelos frutos que se conhece a árvore.

O futuro do ser humano, da família, da criação depende de como cada um responde e executa o apelo: “Filho, vai trabalhar hoje na vinha”. O cristão de verdade é reconhecido pelos seus atos e não pelas suas intenções. A salvação consiste em entrar no dinamismo do seguimento a Jesus, numa vida nova em Deus, num permanente “vestir-se da nova humanidade” (Ef 4,24), na acolhida cotidiana do Dom de Deus em nossa vida, acolhida que se concretiza no empenho pela vida dos pequenos e sofredores.

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*Hoje a Igreja celebra Santa Teresinha do Menino Jesus. Nasceu em Alençon (França) em 1873 e morreu no ano de 1897. Santa Teresinha não só descobriu que no coração da Igreja sua vocação era o amor, como também sabia que o seu coração – e o de todos nós – foi feito para amar. Nascida de família modesta e temente a Deus, seus pais (Luís e Zélia) tiveram oito filhos antes da caçula Teresa: quatro morreram com pouca idade, restando em vida as quatro irmãs da santa (Maria, Paulina, Leônia e Celina). Teresinha entrou com 15 anos no Mosteiro das Carmelitas em Lisieux, com a autorização do Papa Leão XIII. Sua vida se passou na humildade, simplicidade e confiança plena em Deus.

Todos os gestos e sacrifícios, do menor ao maior, oferecia a Deus pela salvação das almas e na intenção da Igreja. Ensinou um lindo e possível caminho de santidade: infância espiritual: colocar-se como criança nas mãos do Pai.

O mais profundo desejo do coração de Teresinha era ter sido missionária “desde a criação do mundo até a consumação dos séculos”. Sua vida nos deixou como proposta, selada na autobiografia “História de uma alma” e, como intercessora dos missionários sacerdotes e pecadores que não conheciam a Jesus, continua ainda hoje, vivendo o Céu, fazendo o bem aos da terra.

Morreu de tuberculose, com apenas 24 anos, no dia 30 de outubro de 1897. Queria tanto bem à humanidade, que dizia com frequência: “Quero passar o meu céu fazendo o bem sobre a terra”. É a padroeira principal das missões, pois era esse o desejo de seu coração: ser missionária, rezar pelos missionários.

**Estamos também iniciando o Mês das Missões. Na mensagem para o Dia Mundial das Missões deste ano de 2023, o Papa Francisco nos exorta a deixar que a Palavra dele faça “arder nosso coração”, que o “Pão partido” abra nossos olhos e que coloquemos nossos “pés a caminho”, como outrora os discípulos de Emaús que foram encantados pela presença do Senhor Ressuscitado. “Depois de abrirem os olhos, reconhecendo Jesus na fração do pão, os discípulos partiram sem demora e voltaram para Jerusalém (cf. Lc 24, 33). Esse sair apressado, para partilhar com os outros a alegria do encontro com o Senhor, mostra que “a alegria do Evangelho enche o coração e a vida inteira daqueles que se encontram com Jesus. Aqueles que se deixam salvar por Ele são libertados do pecado, da tristeza, do vazio interior, do isolamento. Com Jesus Cristo, renasce sem cessar a alegria” (Exort. ap. Evangelii gaudium, 1). Não é possível encontrar verdadeiramente Jesus Ressuscitado sem ser inflamado pelo desejo de contar a todos. Por isso, o primeiro e principal recurso para a missão são aqueles que reconheceram o Cristo ressuscitado nas Escrituras e na Eucaristia, e que trazem o Seu fogo no coração e a Sua luz no olhar. Eles podem dar testemunho da vida que não morre jamais, mesmo nas situações mais difíceis e nos momentos mais sombrios” (Mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial das Missões 2023).

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

 

Dimensão comunitária do sacramento da Reconciliação

aureliano, 09.09.23

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23º Domingo do Tempo Comum [10 de setembro de 2023]

[Mt 18,15-20]

O evangelho deste domingo nos remete a um elemento fundamental dos sacramentos da Igreja, mas que no decurso da história parece ter sido esquecido no sacramento da Reconciliação ou Confissão: sua dimensão eclesial ou comunitária. Em outras palavras, o sacramento da Penitência ou Confissão precisa retomar sua dimensão comunitária.

Já no AT os ritos de penitência eram comunitários. E, segundo consta, nos primórdios da Igreja, a confissão dos pecados era pública, ou seja, feita na comunidade. Percorrendo, porém, a história desse sacramento, constata-se ter havido uma passagem progressiva da celebração penitencial de toda a comunidade à confissão individual. Isso levou à alienação do rito do perdão nos relacionamentos da comunidade, tornando-o um ato quase mágico. Tal procedimento também desvinculou o pecado de sua dimensão comunitária, como se o pecado fosse de responsabilidade e proporções apenas individuais sem consequência na vida da comunidade.

O pecado atinge de cheio a comunidade: os corruptos e ladrões de nosso País roubam o pão dos pobres, os medicamentos e atendimento médico-hospitalar dos doentes, o direito a uma educação de qualidade crianças e jovens, a merenda escolar, os recursos do saneamento básico, os incentivos sociais das políticas públicas etc. Faz a miséria se instalar ainda mais na vida dos “invisíveis” e “descartáveis” sociais, daqueles que não contam na sociedade. Com ele crescem a violência e o ódio. O pecado destrói a família, desfaz a alegria de viver, quebra a amizade e a comunhão entre os irmãos. O pecado explora o meio-ambiente e descarta as vidas, as culturas, as pessoas. O pecado afoga o indivíduo no seu próprio ego (narcisismo) e mata a quem está por perto, pois seus tentáculos atingem tanto mais pessoas quanto maior for sua gravidade.

Ora, a celebração dos sacramentos é a rememoração e atualização do evento salvífico de Deus na história, por Cristo, no Espírito Santo. Salvação essa que se dá como evento eclesial (embora Deus possa salvar também por outros meios). Tratando-se, pois, do sacramento da Reconciliação (sinal salvífico eclesial), não parece ter sentido realizá-lo como um ato isolado. Se o Batismo, sacramento primeiro da conversão e do perdão, é essencialmente comunitário, por que razão a Reconciliação, segunda penitência, foi privada de tal dimensão?

Torna-se, pois, urgente recuperar a dimensão comunitária, eclesial do sacramento da Reconciliação. Deus não salva o indivíduo no seu isolamento. Ele salva a comunidade e na comunidade. É, pois, em comunidade que deve ser operada a conversão e a busca do perdão. Na Igreja Católica, o padre ou o bispo, são os representantes da comunidade eclesial quando ministram esse sacramento. Portanto, na confissão sacramental, a pessoa é reconciliada com Deus e com a comunidade.

Se se forma o fiel cristão para o verdadeiro sentido da comunidade querida por Jesus, e para o sentido e necessidade da conversão na vida humana, se compreenderá por que Jesus centrou sua pregação na proclamação da penitência, da conversão (metanóia) como único caminho de entrada e participação no Reino de Deus: “Cumpriu-se o tempo e o Reino de Deus está próximo. Arrependei-vos e crede do Evangelho” (Mc 1,15).

Concluindo: o sacramento da Penitência ou Confissão se torna eficaz quando nos reconcilia com Deus e com os irmãos. Quando nos leva a uma verdadeira conversão do coração e mudança de vida. Quando nos reintroduz na vida e participação da comunidade. Quando nos leva a devolver o que roubamos, ou a alegria e paz de que privamos as pessoas. Sem busca de conversão do coração não adianta confissão dos pecados. Seria uma mera formalidade, um rito vazio de sentido. Deus não está interessado em “ouvir” pecados, mas na mudança de vida. Uma vida que deve estar cada vez mais conformada à de Jesus de Nazaré.

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A correção fraterna

Estamos no capítulo 18 de Mateus em que ele relata o discurso de Jesus sobre a comunidade. E o relato de hoje está imediatamente após a parábola da ‘ovelha perdida’. Essa observação é muito importante porque nos ajuda a compreender e a realizar a correção fraterna: deve-se buscar sempre trazer a pessoa de volta para a comunidade, pois a Igreja é a comunidade dos reconciliados: “Não é da vontade de vosso Pai, que está nos céus, que nenhum destes pequeninos se perca” (Mt 18,14). Cristo não nos salva somente pela sua morte na cruz, não. Ele quer nos salvar também pela comunidade na qual deseja que estejamos plenamente inseridos, em comunhão.

É muito comum entre nós falar mal dos outros, fofocar, condenar etc. Somos mestres em criticar  e condenar as pessoas. Dificilmente encontramos alguém que chame a pessoa que se julgue errada e lhe mostre o erro e o caminho de saída. Tem gente que se afasta da comunidade por causa desse ou daquele; tem gente que expulsa pessoas da comunidade por posturas julgadas inadequadas.

Pois bem, o Evangelho de hoje nos exorta a sairmos de um moralismo inconsequente  e ajudarmos o irmão que erra a fazer o caminho de volta. Chamá-lo em particular, para não humilhá-lo ou ridicularizá-lo. Numa segunda tentativa devem-se buscar testemunhas, ou seja, mostrar o interesse de outras pessoas, para que outros possam também manifestar-se em relação ao irmão que se desencaminhou. Finalmente, tendo mostrado que foram envidados todos os esforços, se não quis ouvir nem a pessoa em particular nem as testemunhas, deve-se comunicar à Igreja: a comunidade cristã é que tem o poder das “chaves”: ligar e desligar.

O que se ressalta deste texto é o desejo de Jesus que se empenhe com toda força na recuperação de quem está no caminho do mal. Lembre-se aqui do imperativo de Jesus: “Vai”. É preciso ir corrigir, e não ficar falando pelas costas, covardemente. A salvação que Jesus veio trazer passa pela comunidade. E esta precisa sempre mais se aproximar de Jesus para ser sinal de seu amor. A compaixão de Jesus, seus gestos de acolhida e de respeito, a quebra de todo preconceito, sua solicitude para com os pequenos e sofredores mostram como a comunidade cristã deve proceder.

Vale lembrar aqui, do ponto de vista político-social, a pouca-vergonha e canalhice de muitos quando sabem das roubalheiras, das propinas, dos desvios de verba, dos subornos, das sonegações de impostos, das “rachadinhas” e permanecem calados como se nada soubessem, ou mesmo buscando se beneficiar da situação. É tempo de acordar para o Evangelho da vida nessa cultura de morte que muitas vezes recorre à própria Palavra de Deus para justificar a podridão!

“Se ele te ouvir terás ganho teu irmão”. Esta palavra de Jesus deve ecoar forte dentro de nós. Assumirmos uma postura tal que o irmão seja capaz de nos ouvir. Toda atitude condenatória, rígida, arrogante, impetuosa afasta, espanta, irrita, distancia. O Papa Francisco adverte: “Nós, os católicos, como ensinamos a moral? Não podemos ensinar apenas preceitos como: ‘Você não pode fazer isso, tem que fazer aquilo; você pode, você não pode’. A moral nas atitudes é uma consequência do encontro com Jesus Cristo. Para nós, católicos, é uma consequência da fé. E para os demais, a moral é uma consequência do encontro com um ideal, ou com Deus, ou consigo mesmo, com a melhor parte de si mesmo. A moral é sempre uma consequência. […] Algumas pessoas preferem falar de moral em homilias ou em cursos de teologia. Há um grande perigo para os pregadores, que é cair na mediocridade… condenar somente a moralidade – desculpe-me – ‘da cintura para baixo’. Mas os outros pecados, que são mais graves, o ódio, a inveja, o orgulho, a vaidade, matar o outro, tirar a vida… não se fala tanto deles” (pt.aleteia.org – 04/09/2017).

Talvez fosse oportuno fazermos um exame de consciência: como lidamos com aqueles que se afastam ou erram em nossa comunidade? Nossa atitude se assemelha à de Jesus? Costumamos falar mal dos outros, fofocarmos, condenarmos? Deixamo-nos tocar pelo sofrimento e dor do outro, pela sua situação de angústia e medo? Impomos medo nas pessoas? Ameaçamos? Ou buscamos estabelecer uma relação de confiança e liberdade?

* Setembro Amarelo: São registrados cerca de 12 mil suicídios todos os anos no Brasil e mais de 01 milhão no mundo. Trata-se de uma triste realidade, que registra cada vez mais casos, principalmente entre os jovens. Cerca de 96,8% dos casos de suicídio estão relacionados a sofrimentos e transtornos mentais.

Em primeiro lugar está a depressão, seguida do transtorno bipolar e abuso de substâncias químicas. Com o objetivo de prevenir e reduzir estes números a campanha ‘Setembro Amarelo’ tem como objetivo mobilizar a sociedade para se empenhar na prevenção do suicídio. Um elemento fundamental é ouvir a pessoa que está em estado de sofrimento depressivo ou transtorno mental, sem juízo de valor. Acolher, estender a mão, estar junto. Com uma ação de generosa escuta e acolhida a gente pode salvar muitas vidas.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

Conversão: assumir atitudes novas

aureliano, 03.12.22

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2º Domingo do Advento [04 de dezembro de 2022]

[Mt 3,1-12]

Advento é tempo de conversão. “Arrependei-vos, porque o Reino dos Céus está próximo” (Mt 3,2). Com imagens em estilo apocalíptico, João Batista anuncia o Reinado de Deus. Essas imagens usadas por João escondem uma realidade: para Deus não há privilegiados – ‘sou católico’; ‘minha mãe reza o suficiente por mim’; ‘vou à missa todos os domingos’; ‘sou dizimista’; ‘tenho muita fé’ ou coisas do gênero –. É preciso fazer um caminho de conversão.

A conversão comporta dois elementos: o arrependimento, ou seja, um olhar para o passado com desejo de mudar de vida. É o pedido de perdão com a busca sincera de se emendar. O outro elemento, muito ligado a este, é a conversão: metanoia, ou seja, mudança de mentalidade. Significa que o seguidor de Jesus deve passar a pensar e a agir como Jesus. É assumir a forma de viver e de atuar de Jesus (cf. Rm 15,5; Fl 2, 5-11) .

Temos então o momento da consciência – um olhar retrospectivo com vontade de mudar de vida – e o momento da prática que é o comprovante de nossa mudança de vida, quando assumimos na nossa vida o ensinamento de Jesus.

Pelo que vamos entendendo sobre vida cristã, estritamente falando, Advento não é tempo para preparar a festa do Natal, mas para celebrar a Vinda do Senhor. Então saímos da corrente consumista que vê nas festas natalinas uma ocasião de gastar, de comprar, de vender, de comer e beber desbragadamente, sem limite. Agora é tempo de conferir como está nossa vida em Cristo e como estamos nos preparando para sua vinda.

Fé cristã não é ir ao templo para rezar, mas uma postura nova de vida a partir do que Jesus ensinou, sobretudo no tocante ao amor fraterno. Conversão não significa uma guinada de noventa graus na vida para durar uma, duas semanas, não! Conversão é um processo permanente de nos colocarmos diante de Deus com o coração aberto e dispostos a acolher o novo, as pessoas como elas são; sermos generosos no perdão, nos desculparmos com humildade quando erramos, derrubar os muros que nos separam uns dos outros, criar pontes de aproximação e perdão, vencer as barreiras que geram desencontros dentro de nossa própria casa; assumindo uma postura ética no trabalho, nos negócios, com as pessoas. Isso se dá com o tempo, ao longo da vida, e não de um dia para o outro.

Deus não se deixa impressionar por exterioridades. Celebrações vazias que não movem o coração e a mente nem dos participantes nem dos que as presidem, tornam a todos semelhantes aos fariseus e saduceus que foram pedir o batismo a João. Ouviram aquelas palavras terríveis: “Raça de víboras, quem vos ensinou a fugir da ira que está para vir? Produzi, então, fruto digno de arrependimento e não penseis que basta dizer: ‘Temos por pai Abraão’. Pois eu vos digo que mesmo destas pedras Deus pode suscitar filhos de Abraão” (Mt 3,8-9).

“Abre a porta, deixa entrar o Rei da Glória. É o tempo: ele vem orientar a nossa história”.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

Um encontro que transforma

aureliano, 29.10.22

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31º Domingo do Tempo Comum [30 de outubro de 2022]

[Lc 19,1-10]

No evangelho do domingo passado ouvimos o relato do publicano fazendo oração no Tempo. Hoje temos outro publicano. Aqui, porém vemo-lo encontrando-se com Jesus, o Templo vivo do Pai.

“Deus não quer a morte do pecador, mas que ele se converta e viva” (Ez 18,23). É por isso que vemos Jesus, caminhando para Jerusalém, realizando encontro com os pecadores, levando-os à conversão.

Note-se que esse relato de Lucas vem imediatamente depois da cura do cego na mesma cidade de Jericó que Jesus atravessa. O desejo do cego era poder ver, recuperar a vista (cf. Lc 18,41). E ao recuperá-la, “foi seguindo Jesus, dando glória a Deus” (Lc 18,43). O cego de Jericó quer ver. Zaqueu também “procurava ver quem era Jesus” (Lc 19,3). Portanto, o cego curado torna-se discípulo de Jesus. Zaqueu, convertido, também assume uma vida nova: “Pois bem, Senhor, eu reparto aos pobres a metade dos meus bens e, se prejudiquei alguém, restituo-lhe o quádruplo” (Lc 19,8).

Jesus caminha para Jerusalém, cidade que o rejeitará, o condenará, o matará. Jericó, ao contrário torna-se a cidade que o acolhe e lhe dá novos seguidores. Encontros transformadores de vida.

É muito interessante o relato de Lucas sobre o encontro de Jesus com Zaqueu. Este quer ver Jesus, mas esbarra em duas dificuldades: é baixinho e é publicano (chefe!): os vizinhos o detestavam. Por isso ele sobe numa árvore. Porém é um homem que busca: “procurava ver quem era Jesus”.

Jesus vale-se desta busca de Zaqueu e estabelece com ele um encontro. Não em cima da árvore, mas no “chão”. É preciso “descer”. Jesus não se relaciona conosco em situações distantes, nas nuvens, cheios de orgulho, arrogância e autossuficiência. Ele quer que desçamos para o chão de nossa história, de nosso cotidiano. É em nossa “casa” que ele quer entrar para nos transformar.

Jesus vai à casa de Zaqueu, homem rico, não para usufruir das benesses de sua riqueza, não para se aproveitar da oportunidade e ganhar alguma coisa. Não! Jesus não negocia sua hombridade. Ele vai à casa de Zaqueu para movê-lo à conversão. O convívio com os ricos pode nos levar a trair o evangelho de Jesus! O ambiente social marcado pelo luxo e pelo consumismo enfraquece da Palavra de Jesus: “Ai de vós, os ricos!” (Lc 6,24). Podemos desvirtuá-la, justificando nossas posturas incoerentes. Jesus veio para todos. Para os pobres, a fim de serem amparados; para os ricos a fim de que olhem para os pobres e repartam com eles os seus bens.

A verdadeira conversão, tanto do pobre como do rico, mexe com as estruturas do mal e torna o Reino mais próximo. A conversão da pessoa abala a estrutura da iniquidade. O episódio de Zaqueu, chefe dos publicanos, traz à baila a questão do poder: de modo geral, quando se chega ao poder, começa-se a se beneficiar dele, defraudando os outros. Por isso a necessidade da conversão verdadeira para se mudarem as estruturas de morte na sociedade a partir do encontro pessoal com Jesus de Nazaré. Ele é o modelo de homem acabado. Se nossos políticos entendessem isto, e fizessem mais encontros com Jesus de Nazaré, nosso mundo seria muito melhor. Vale o mesmo para as lideranças religiosas de nossas comunidades: a experiência do encontro verdadeiro e profundo com Jesus transforma nossa vida, nossas famílias e nossas comunidades. A isso se dá o nome de conversão.

A propósito, vem-me à memória um hino bastante cantado em alguns encontros por aí que pretende interpretar esse relato de Zaqueu. Mas esta música mutila e deturpa o evangelho que quer ressaltar o caminho da conversão. Ela é do jeitinho que os ricos gostam. Faz chorar de emoção os pobres e justifica a ganância dos ricos, pois não menciona o gesto concreto da conversão de Zaqueu: devolver o que roubou e partilhar com os pobres o que tem.

Sem um encontro verdadeiro com Jesus, num olhar que transforma por dentro, a salvação não entra na nossa casa. A iniciativa é de Deus, mas precisamos “procurar ver o Senhor”, como fizera Zaqueu. Oxalá pudéssemos dizer, depois da celebração eucarística, voltando para nossas casas: “Hoje a salvação entrou nesta casa!”. Deve ser uma experiência que nos encha de alegria: “Zaqueu desceu depressa e o acolheu com toda alegria” (Lc19,6).

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN