O Espírito de Jesus nos reúne
10º Domingo do Tempo Comum [09 de junho de 2024]
[Mc 3,20-35]
Estamos no capítulo 3º do evangelho de Marcos. Depois da eleição dos Doze, o evangelista retoma a controvérsia que contesta e questiona o poder de Jesus. O centro da questão é saber “quem é este? De onde vem o poder que manifesta?” Os parentes o acusam de louco; os escribas, de possuído pelo demônio.
Jesus é o vencedor dos poderes do mal. Ele tira o pecado do mundo. Traz nova perspectiva de vida para todos. Introduz novo horizonte de sentido na vida daqueles que o assumem como Salvador e Mestre. Quem se recusa a reconhecer isso peca contra o Espírito Santo e exclui-se da salvação.
Pecado contra o Espírito Santo é a atitude (não uma ação isolada) de recusa a ouvir e colocar em prática o ensinamento de Jesus. É encarquilhar-se no mal (cf. Dn 13,52). É fazer a opção fundamental por viver de modo egoísta, narcisista, fechado nas próprias ideias, recusando-se a fazer um caminho cotidiano de conversão. Pecado contra o Espírito Santo é recusar-se conscientemente a ver os sinais da graça e da luz de Deus na história. É não ver o bem nas pessoas, mas servir-se delas como objeto de prazer e de lucro. É entrar sempre mais numa vida de trevas, de consumismo, de ambição, de ganância, de mesquinhez, fugindo sempre da luz da graça de Deus.
Aqueles, porém, que reconhecem realidade da luz e da graça manifestadas nas palavras e nos gestos de Jesus, estão no caminho do cumprimento da vontade do Pai, entrando, consequentemente, para a família de Deus: “E repassando com o olhar os que estavam sentados ao seu redor, disse: ‘Eis a minha mãe e os meus irmãos. Quem faz a vontade de Deus, esse é meu irmão, irmã e mãe’” (Mc 3,34-35).
O relato do evangelho deste domingo nos mostra Jesus em pleno exercício da missão. Não desiste nem desanima mesmo diante da perseguição familiar e religiosa. Ninguém fá-lo desistir. Ele compreende a missão que o Pai lhe dera e a assume até às últimas consequências. Familiares e pessoas poderosas (politiqueiros, por exemplo) costumam nos ‘enredar’ (colocar numa rede) para nos afastar da vivência da fé cristã. Fazem promessas de facilidades ou armam ciladas para nos fazer cair. É preciso ser forte e cheio de Deus para que esses inimigos do evangelho (“inimigos da cruz de Cristo” na expressão do Apóstolo das Gentes - Fl 3, 18)), não nos façam fraquejar e desanimar ou mesmo mudar o foco. Há muitas pessoas que tiveram uma formação cristã, foram educadas em bons princípios e valores na família, na comunidade, na escola, mas que se descambaram para a uma vida perversa, mentirosa, corrupta, desonesta e violenta ao associar-se a gente pervertida: “Salvai-vos desta geração perversa” (At 2,40).
A atitude de Jesus em relação à família nos faz repensar nossas relações familiares. Ele rompe com uma cultura machista e patriarcalista que colocava o apego e defesa da raça, do sangue, da cultura acima dos valores do Reino. Jesus amplia o conceito de família. Na dinâmica do Reino trazido por Jesus, a família de Deus não se constitui de alguns privilegiados que passaram por um ritual ou por serem de uma mesma raça ou religião. Deus é maior do que a religião e laços familiares. Jesus não está preso a nenhuma religião nem a nenhum grupinho seleto. Para Jesus, o mais importante é “fazer a vontade do Pai”.
A ‘família de Deus’ é aquela que coloca os valores do Reino como prioridade em sua vida: a justiça, a verdade, a generosidade, o perdão, a solidariedade, a fraternidade, o serviço desinteressado, o cuidado com a pessoa e com o meio ambiente; a quebra dos preconceitos de raça, sexo, condição social, religião; a tolerância e convivência respeitosa com mentalidades, culturas e crenças diferentes, o diálogo respeitoso, a sensibilidade aos sofrimentos dos pobres etc.
Há muita gente que pensa somente nos “seus” familiares e amigos, nas “suas” coisas. Jesus nos ensina que precisamos sair dessa atitude bairrista, provinciana, de pensar somente em nós e na “nossa” família, para lançarmos um olhar mais além. O batismo nos faz irmãos uns dos outros, rompendo assim com a estratificação social. Portanto, não pode haver mais exclusão nem discriminação entre nós. Nosso cuidado não pode se restringir, então, apenas aos “da nossa casa”. Nosso olhar deve-se voltar para aqueles que estão perto de nós e precisam de nossa ação. Como aquela mãe de família, separada do marido, que trabalha com afinco para tratar de suas duas filhas. Percebendo que uma criança de seu local de trabalho (creche) não tem onde ficar com sua mãe (que trabalha durante o dia), abandonada pelo companheiro, levou ambas para dentro de sua casa a fim de ampará-las, mãe e filho, até que arranjassem uma forma de viver com o mínimo de dignidade. São gestos pequenos, mas significativos que ilustram o que Jesus disse no evangelho de hoje. Ultrapassam os laços de sangue.
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PECADOS CONTRA O ESPÍRITO SANTO
“Em verdade vos digo: tudo será perdoado aos homens, tanto os pecados como qualquer blasfêmia que tiverem dito. Mas quem blasfemar contra o Espírito Santo, nunca será perdoado, mas será culpado de um pecado eterno” (Mc 3,28-29).
Muitas pessoas ficam curiosas em saber que pecado é esse que não tem perdão. O que é mesmo o pecado contra o Espírito Santo? O contexto do evangelho de hoje o revela: um clima de fechamento, de resistência às palavras e às ações de Jesus. Falta de acolhida à novidade do Reino de Deus. Ora, Deus não salva ninguém à força. Santo Agostinho já o entendera bem: “Quem te criou sem ti, não te salvará sem ti”.
A falta de cultivo da vida interior, a busca frenética pelo bem-estar, o acúmulo de coisas, a busca de si e de seus próprios interesses em detrimento do bem da coletividade são realidades que fecham o coração e impedem a ação do Espírito de Deus em nós.
Seria bom, portanto, que cada um verificasse que importância está dando àquelas realidades que são o essencial de sua vida: a vida eclesial, a vida familiar, o cuidado com os mais sofridos, o zelo pela verdade e pela coerência de vida, a sinceridade e honestidade nas relações de trabalho e vizinhança, o carinho e cuidado para com os pais ou idosos, a abertura de coração. Confrontar a própria vida com a vida de Jesus que se deixou conduzir pelo Espírito.
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EXPULSAR DEMÔNIOS
Há muitos religiosos por aí “especialistas” em “expulsar demônios”. Se a pessoa não os tem, eles arranjam para ela. É uma forma de enganar e arrancar o dinheiro dos incautos e sofredores, além de mantê-los reféns de seu poder. Com o avanço das Ciências e da Medicina sabemos de muitas doenças que, no tempo de Jesus, eram consideradas possessões diabólicas, não passam de distúrbios ou deficiências mentais. É só procurar o psiquiatra ou o psicólogo que a pessoa vai ser tratada. Além, é claro, de se preparar um ambiente adequado que a ajude a viver. Não se trata de ‘possessões diabólicas’, mas de doenças mentais. Cuidado com os falsos pastores!
Os demônios que precisam ser expulsos têm nomes e estão dentro de nós: a mentira, a traição, a falsidade, a preguiça, a safadeza, a inveja, a ganância, a cobiça, a vingança, a ingratidão, o fechamento, o orgulho, o parasitismo, a corrupção, a grosseria, a incoerência, a dureza de coração etc. Esses demônios fazem um mal enorme. Em alguns eles agem com mais força; em outros, são enfraquecidos pelo esforço de se viver em Deus. Vamos exorcizar esses demônios! E eles são teimosos: não gostam nem querem sair de dentro de nós!
Senhor Jesus, ajuda-nos a compreender que nosso pecado, nossa omissão, nossas escolhas erradas, nosso egoísmo podem fazer muito mal e causar muito sofrimento. Dá-nos a graça de romper com o mal em nós e fora de nós para que nossa vida seja mais parecida com a tua. Que nossas palavras e ações sejam de mais abertura, acolhida, discernimento, tolerância e perdão. Faze de nós instrumentos de paz e de justiça para construirmos um mundo mais irmão e solidário, em que todos tenham acesso aos bens da criação, à vida digna e feliz, à “vida plena”.
Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN