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Como você se relaciona com o dinheiro?

aureliano, 12.10.24

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28º Domingo do Tempo Comum [13 de outubro 2024]

   [Mc 10,17-30]

No evangelho do domingo passado refletimos sobre Jesus orientando a vida familiar. A relação conjugal não se fundamenta numa relação de dominação, mas de respeito, de corresponsabilidade, de ajuda mútua. Em síntese, marido e mulher são co-criadores com o Pai.

Neste domingo, prosseguindo a leitura do evangelho de Marcos, Jesus continua a instruir seus discípulos para que a vida deles seja um marco diferencial na sociedade e na história. O cristão precisa fazer a diferença. Agora Jesus ensina a se relacionar com os bens. Realidade muito próxima do casamento. A gente sabe que muitas crises no relacionamento conjugal brotam da relação e gestão dos bens, da casa, do dinheiro. Quantas brigas por conta de dívidas, por conta de diferença de salários, por conta de compra e venda! Quanta confusão, depois da separação, por causa de bens e de pensão! Quanta confusão e, por vezes, morte por causa de herança! Então vamos acompanhar a orientação de Jesus a respeito desse caminho que o discípulo deve fazer.

Esse moço que recorre a Jesus se preocupa com a vida eterna. Não lhe interessa tanto a vida presente uma vez que os bens já lhe estão garantidos. Primeiramente Jesus faz com que sua atenção se volte para o Pai e não tanto para Jesus: “Só Deus é bom”. Os mandamentos da Lei relativos ao próximo ele os tem observado. Notamos, porém, que os Dez Mandamentos não foram citados. Apenas alguns e mesmo assim naquela conotação negativa: “não”. Então lhe faltava a dimensão positiva da vida. Ele observava a Lei, mas não sabia partilhar. Não tinha gratuidade. Não tinha plena consciência e conhecimento do que estava fazendo. Observava a lei por costume e tradição. Como aqueles casos muito comuns entre nós: “Por que você quer batizar seu filho?” Ou “Por que você é católico?” A resposta normalmente ecoa: “Porque todo mundo batiza” Ou “Porque meu pai é católico”. Ou simplesmente: “Por que nasci numa tradição católica”. E por aí se vai. Uma fé sem fundamento, sem gratuidade, sem generosidade, sem conhecimento, sem razão, sem convicção e decisão livre e consciente.

Jesus quis ajudar aquele homem a dar um passo decisivo na vida. É algo que faz parte integrante da fé cristã: o desapego dos bens e o espírito de partilha. “Vai, vende tudo o que tens. Dá o dinheiro aos pobres. Depois vem e segue-me”. Não basta, pois, dividir os bens com os pobres. É preciso seguir a Jesus. O seguimento de Jesus é que caracteriza o cristão. Poder-se-iam distribuir os bens por vaidade. E nesse aspecto Paulo já alertara: “Ainda que eu desse todos os meus bens aos pobres; se não tivesse amor, isso de nada valeria” (1Cor 13,3).

No desenrolar do texto Jesus percebe a dificuldade de o rico entrar no Reino. Jesus não está falando de vida depois da morte, não. Ele está falando do Reino de Deus. A vida eterna começa aqui, com a erupção do Reino de Deus. Quem não se desapega, como aquele moço que não teve coragem de se desvencilhar dos bens, não pode entrar na vida de Deus. A vida eterna é a vida em Deus.

A salvação é dom de Deus: “Para Deus tudo é possível”. Ninguém compra a vida de Deus, repartindo seus bens, fazendo caridade etc. Deus nos salva de graça. Porém nossos gestos de bondade, de generosidade, de partilha, de perdão, de tolerância, de respeito, de solidariedade são nossa resposta à bondade de Deus que nos salva. Quem vive preso às suas coisas, fechado em si mesmo, indiferente ao sofrimento alheio ou, pior ainda, buscando sempre oportunidades para aumentar suas posses, defraudando os outros, extorquindo, sonegando impostos, deixando de cumprir com as obrigações sociais de seus funcionários, está cada vez mais longe do Reino de Deus, da salvação. Sua vida está atravancando a ação salvadora de Deus. É uma pedra de tropeço, um escândalo, que impede a vida de florescer. Mata a alegria e as esperanças das pessoas.

Na prática, cada um de nós podia dar uma olhadinha no modo como lida com os bens e posses. O que fazemos com o dinheiro? Onde o guardamos? Em que o empregamos? Com que finalidade? O que estamos comprando? Para que compramos? Tem gente que renova as mobílias todos os anos. Compra sem necessidade nenhuma. Tem gente que está sempre na ponta da tecnologia. É necessário estar na “crista da onda”? Por outro lado, há pessoas que deixam de comprar coisas essenciais para a casa, que deixam de cuidar da saúde da família para guardar o dinheiro ou aumentar o patrimônio. E, muitas vezes, se endividando com prestações a perder de vista. Tem gente que nem consulta a família para fazer certos gastos. Tem gente que gasta o salário com jogos de azar, com prostituição e adultério, com bebedeira sem conta, com churrascada desmedida para amigos, com drogas de toda qualidade. Tem gente que vive uma vida miserável para aplicar o dinheiro em rendimentos bancários. Mas não é capaz de partilhar um centavo com os mais pobres!

Isso sem falar da agiotagem que assassina milhares de famílias. Um pecado que brada aos céus: o sujeito tem dinheiro; vê o irmão na pior; empresta-lhe a juros exorbitantes; escraviza o pobre coitado que nunca ou quase nunca consegue pagar (Cf. Sl 15,5). E o que dizer daqueles que transferem sua fortuna para os “paraísos fiscais”, deixando os pobres brasileiros a “ver navios”? Pior: muitos destes tais se dizem cristãos!

“A maneira sadia de lidar com o dinheiro é ganhá-lo de forma limpa, utilizá-lo com inteligência, fazê-lo frutificar com justiça e saber compartilhá-lo com os mais necessitados” (Pe. J. A. Pagola). O acúmulo de bens é idolatria. O reino pessoal, a busca de si mesmo não garante lugar no Reino de Deus.

Não está na hora de colocarmos a mão na consciência e rezarmos um pouco mais nosso ser cristão? Aquele homem do evangelho voltou triste porque possuía muitos bens. Conclui-se que a posse de muitos bens não traz alegria para ninguém. A verdadeira alegria está no bom uso dos bens, do dinheiro. Quando sabemos partilhar, distribuir, comprar ou vender dentro de critérios honestos e a partir de um diálogo respeitoso e cristão dentro de nossa casa, estamos no caminho do verdadeiro discipulado de Jesus. Então experimentaremos a verdadeira alegria que brota de uma vida vivida em Deus, na construção do Reino de partilha, de paz e de justiça.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

Onde está o teu coração

aureliano, 05.08.22

19º  Domingo do TC - C - 11 de agosto.jpg

19º Domingo do Tempo Comum [07 de agosto de 2022]

 [Lc 12,32-48]

No evangelho do domingo passado acompanhamos Jesus orientando seus discípulos a não depositarem sua confiança nos bens terrenos: “Tomai cuidado com todo tipo de ganância, porque, mesmo que alguém tenha muitas coisas, a vida de um homem não consiste na abundância de bens” (Lc 12,15). Essa admoestação de Jesus pode ter provocado nos discípulos alguma defecção, desistência, medo de assumir o projeto que o Mestre apresenta. Daí a palavra do evangelho de hoje: “Não tenhais medo, pequenino rebanho, pois foi do agrado do Pai dar a vós o Reino”. Parece que Jesus não contava com grande multidão de discípulos. Ele conta com poucos, porém destemidos, generosos, capazes de se desprenderem dos bens e posses e lutarem por um mundo mais fraterno e igualitário. Pequeno grupo que tenha como único tesouro o Reino. Um pequeno rebanho, porém que se constitui em grande sinal do Reino.

  1. “Onde está o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração”. O desprendimento dos bens em favor dos pobres traz ao discípulo a verdadeira liberdade. Note-se que não se trata, pura e simplesmente, de desprezo das coisas materiais. Isso seria uma maneira doentia, desumana de se relacionar com os bens da Criação, dons de Deus. Mas Jesus propõe um jeito novo: vender e dar em esmola. É a partilha evangélica. É o não-acúmulo, o sair de si em favor dos necessitados. Essa é a perspectiva cristã. Se nosso tesouro é o Reino de Deus, então nosso coração estará em paz, livre, empenhado naquelas realidades que não passam. O cuidado com as pessoas terá prioridade sobre o cuidado com as coisas.
  2. “Que vossos rins estejam cingidos e vossas lâmpadas acesas”. Jesus alerta para a necessidade de se estar atento, pronto. Rins cingidos significa estar preparado para agir. Aliás, o Papa Francisco lembra que a Igreja precisa sair, ir para às ruas, encontrar-se com os pobres, com os necessitados, com os sofredores: "Eu quero agito nas dioceses, que vocês saiam às ruas. Eu quero que a Igreja vá para as ruas, eu quero que nós nos defendamos de toda acomodação, imobilidade, clericalismo. Se a Igreja não sai às ruas, se converte em uma ONG. A igreja não pode ser uma ONG" (JMJ do Brasil, 2013). Na JMJ da Polônia (2016) o Papa insiste na necessidade de sair: “Queridos jovens, não viemos ao mundo para ‘vegetar’, para transcorrer comodamente os dias, para fazer da vida um sofá que nos adormeça; pelo contrário, viemos com outra finalidade, para deixar uma marca. É muito triste passar pela vida sem deixar uma marca. Mas, quando escolhemos a comodidade, confundindo felicidade com consumo, então o preço que pagamos é muito, mas muito caro: perdemos a liberdade”. E acrescentou: “O tempo que hoje estamos a viver não precisa de jovens-sofá, mas de jovens com os sapatos, ainda melhor, calçados com as botas”. - Lâmpadas acesas significa cuidar da fé. Esta é a luz que ilumina o caminho. Se nos descuidamos do óleo da caridade, das boas obras, da oração fervorosa, do cultivo de uma mística profunda, do cuidado com os pobres e sofredores, nossa fé pode esmorecer e nossa lâmpada se apagar. Então nosso caminho ficará em trevas e também aqueles que precisam de nossa luz.
  3. “Felizes os empregados que o senhor encontrar acordados quando chegar”. É preciso estar despertos. É muito fácil viver dormindo. É só fazer o que todo mundo faz. É deixar a vida correr ao sabor do vento: pra onde ventar a gente vai. É viver insensível ao sofrimento alheio. Quando se vive só para trabalhar, ganhar dinheiro, cumprir algumas normas, comer, dormir, se divertir é viver dormindo. As coisas mais importantes, fundamentais da vida passam longe. Teologicamente, “dormir” significa viver uma religião de tradição. É não querer perceber o agir de Deus na história, nas pessoas. É ser indiferente, despreocupado com o que realmente conta. Talvez se possam fazer muitas coisas, mas se permanece na superficialidade dessas coisas. Isso é viver dormindo. E Jesus admoesta que é preciso viver acordado. – Um grande risco é vivermos uma “religião adormecida”. Uma espiritualidade que anestesia, que leva para as nuvens. Que faz viver em torno de si, de seus próprios conflitos e desgraças. “Para viver despertos é importante viver mais devagar, cultivar melhor o silêncio e estar atento aos apelos do coração. Sem dúvida, o mais decisivo é viver amando. Só quem ama vive intensamente, com alegria e vitalidade, atento ao essencial. Por outro lado, para despertar de uma ‘religião adormecida’ só há um caminho: buscar para além dos ritos e das crenças, aprofundar-se mais em nossa verdade perante Deus e abrir-nos confiantemente ao seu mistério. ‘Felizes aqueles que o Senhor, ao chegar, encontrar vigiando’” (Pe. José Antônio Pagola, O caminho aberto por Jesus, p. 215).
  4. “A quem muito foi dado, muito será pedido; a quem muito foi confiado, muito mais será exigido”. São palavras que precisam nos acompanhar a vida toda. Quanto mais recebemos de Deus, maior nossa responsabilidade de repartir. Se Deus me deu muito, devo também dar muito. O Pai do céu não é injusto com ninguém: aqueles que receberam mais, precisam criar consciência de que devem distribuir com quem não tem. A Eucaristia nos ensina que a verdadeira riqueza é a aquela que se divide com os outros. O Deus que defende a vida justa e digna para os pobres não pode habitar num coração dominado pelo poder e pelo dinheiro.

*Neste primeiro domingo de agosto celebramos o Dia do Padre. É oportunidade de agradecermos a Deus pelos padres que passaram por nossa vida, nos ajudaram, nos deram os sacramentos. Alguns já partiram desta vida. Outros continuam no meio de nós. É dia também de rezarmos e refletirmos sobre as vocações sacerdotais. O que você tem feito pelas vocações? Você ajuda, reza, apoia os vocacionados? Você ajuda a nós padres a sermos mais pastores, mais próximos, mais dedicados? Não trate o padre como ‘coitadinho’, não! Ele escolheu essa vocação atendendo ao chamado de Deus e da Igreja. Colocou-se livremente a serviço do evangelho. Precisa ser ajudado a viver com fidelidade e dedicação. E você, cristão(ã) leigo(a), deve ajudá-lo a ser um verdadeiro colaborador e servidor das comunidades, rezando por ele, fazendo a correção fraterna quando necessário, sendo colaborativo nos serviços e ministérios da comunidade! Ajude-nos a ser mais pastores, mais misericordiosos, mais generosos, mais paternais, comprometidos com os pequenos e pobres. Ajude-nos a ser homens de Deus, santos.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

Cobiça: fonte de todos os males

aureliano, 30.07.22

18º Domingo do TC - C - 04 de agosto.jpg

18º Domingo do Tempo Comum [31 de julho de 2022]

[Lc 12,13-21]

 “A vida do homem não consiste na abundância de bens”. Essa palavra de Jesus deve nos acompanhar sempre.

Alguém poderia perguntar: ‘Por que Jesus não resolveu aquela situação que lhe foi apresentada pelo irmão que se sentia lesado na herança?’ A resposta é que Jesus não veio resolver questões de poder pelo poder. Ele não veio para se meter em confusão de distribuição de herança. Ele veio para mostrar que os bens precisam ser repartidos, distribuídos. A consciência moral é que precisa ser bem formada para que as pessoas e o Estado se sensibilizem diante do sofrimento alheio e reparta o pão com o necessitado. Para que ninguém passe necessidade (cf. At 4,34).

O relato do evangelho desse domingo nos convida a uma reflexão profunda, diria mesmo, a um exame de consciência sobre o modo como lidamos com os bens materiais; como lidamos com a “concupiscência dos olhos” (1Jo 2,16).

“Não cobiçarás...” (Ex 20,17). É o Décimo Mandamento da Lei de Deus. O Evangelho de hoje nos permite fazer uma visita aos Mandamentos da Lei de Deus, particularmente ao último. Eles andam tão esquecidos, ultimamente! Será que a Aliança de Deus é também temporária, descartável? Parece que não! Deus estabeleceu com seu Povo uma Aliança eterna, para sempre. E Ele permanece fiel!

O Catecismo da Igreja Católica nos lembra que “o apetite sensível nos faz desejar as coisas agradáveis que não temos”. Enquanto não nos conduzem à injustiça, tudo bem. O problema é quando esse desejo se converte em avidez que é o desejo de apropriação desmedida dos bens terrenos. Ou quando se converte em cupidez que é uma paixão imoderada pelas riquezas e pelo poder. Então o ser humano se desvia da relação filial com Deus.

Esse Mandamento quer ajudar a lidar com os bens e posses sem apegos desmedidos, sem acúmulos, sem idolatrar dinheiro e coisas. O sábio já dizia: “O avaro jamais se farta de dinheiro” (Eclo 5,9). E o Apóstolo exortava: “A raiz de todos os males é, de fato, o amor ao dinheiro” (1Tm 6,10).

O Congresso Nacional e o Governo Federal precisam implementar o chamado Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF). Cinco mil famílias brasileiras detêm o equivalente a 40% do Produto Interno Bruto. Tramita no Senado projeto de lei que prevê a criação de um imposto sobre grandes fortunas com o objetivo de arrecadar recursos para financiar ações em favor das populações mais vulneráveis acometidas pelas doenças e pela fome. A proposta é tributar os patrimônios acima de R$ 4,67 milhões. As estatísticas comprovam que a desigualdade social no país durante a pandemia se agravou: o Brasil teria iniciado o ano de 2021 com 7,9 milhões de brasileiros vivendo na extrema pobreza (2,8 milhões a mais do que antes da pandemia), enquanto o número de brasileiros bilionários teria crescido de 45 para 65 entre 2020 e 2021 ( cf. Agência Senado).

Notamos, porém, que não há nenhum empenho da classe política em aprovar projetos semelhantes porque ou suas fortunas seriam tributadas ou as fortunas daqueles que sustentam seus mandatos teriam que pagar os impostos, repartindo o bolo a que todos têm direito.  Uma calamidade nacional! Mas a mudança passa por aí. Todos têm direito ao pão na sua mesa, ao digno  tratamento de saúde, à segurança de ir e vir, à moradia digna. O Papa Francisco tem proclamado em alto e bom som que um dos maiores pecados da humandade é a desigualdade social: “No mundo de hoje, muito poucas pessoas ricas possuem mais do que o resto da humanidade. É uma injustiça que clama aos céus!”.

O que nos pode ajudar no caminho para não cairmos na idolatria do dinheiro é buscarmos uma vida de partilha. É o caminho da felicidade verdadeira. E a Igreja orienta: Todos os fiéis de Cristo “devem dirigir retamente seus afetos, para que, por causa do uso das coisas mundanas e do apego às riquezas contra o espírito da pobreza evangélica, não sejam impedidos na busca da caridade perfeita” (Lumen Gentium, 42).

É muito oportuno lembrar aquelas palavras de Jesus: “Onde está o teu tesouro, aí estará o teu coração” (Mt, 6, 21). Qual é mesmo o nosso verdadeiro tesouro? Que importância damos aos bens que contam realmente? Como temos administrado o dinheiro, os bens, o patrimônio que nos foi confiado? Como lidamos com o “bolsa-família”, com o “seguro-desemprego”, com o “auxílio emergencial”, com o cargo público e consequentes ordenados e privilégios, com o empréstimo de dinheiro, com a compra e venda de mercadoria, com o cumprimento dos horários de trabalho, com o cuidado com os bens que não são meus (privados ou públicos), com aqueles que também são meus, com a relação à justiça para com funcionários/colaboradores etc, etc?

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“Não podeis servir a Deus e ao dinheiro”

Recorde um pouquinho a Campanha da Fraternidade de 2010. O uso das coisas deste mundo deve ser de tal modo que nos torne “ricos para Deus”. O sentido da vida não está na posse de muitos bens, mas na administração deles de tal forma que sejam colocados a serviço de todos. Em outras palavras: os bens deste mundo foram criados para todos. É o princípio da “destinação universal dos bens”.

Vale a pena, nesta oportunidade, recordar o perigo da chamada ‘teologia da prosperidade’. O que é isso? Uma interpretação de textos aleatórios da Bíblia para defender a ideia de que Deus dá riqueza material a quem ele julga justo. E que a miséria é fruto da falta de fé e da consequente maldição da parte de Deus. A esse propósito trago uma palavra oportuna dos nossos Bispos ao tratar da realidade da cultura urbana: “Entristece ver que, em um mundo de individualismo consumista, até mesmo a religião é, às vezes, assumida sob a ótica comercial e da prosperidade financeira (Jo 12,2-17)” (Diretrizes Gerais 2019-2023, Nº 55).

Ora o que diz Jesus? “A vida do homem não é assegurada pela abundância de bens”. Não há dinheiro que garanta uma vida terrena imperecível, sem sofrimentos, sem morte. Jesus quer que vamos além. A vida que ele veio trazer é “plena”. É a vida junto dele que já tem começo aqui. Uma vida vivida no coração amoroso do Pai é a grande bênção que ninguém pode tirar.

O entendimento do progresso material, do enriquecimento como bênção e da pobreza como abandono da parte de Deus, leva a pessoa à prática da idolatria, assumindo os bens materiais como a coisa mais importante da vida, reduzindo sua relação com Deus a um nível puramente comercial e interesseiro. Afasta-se totalmente do ensinamento de Jesus que doou toda a sua vida e pediu que seguíssemos seu exemplo. Do contrário, do ponto de vista material, Jesus teria sido o homem mais rico e poderoso, que já existira, pois fora sempre fiel ao Pai. O erro aqui está na interpretação egoísta e interesseira da vida e dos textos bíblicos.

É fácil perceber o que é mesmo fundamental na vida humana quando nos deparamos com situações-limite. Aquela pessoa que está muito mal, prestes a morrer. O que parece mais importante para ela? O dinheiro? Seus bens materiais? Até mesmo a família e amigos entendem que há algo aí mais importante do que a dimensão econômica ou social. Percebe-se aí como é fundamental a dimensão espiritual, sua relação com Deus Pai Criador. Só essa realidade fundante é que lhe poderá dar sustento nesse momento. O que lhe dá conforto agora não são os bens que adquiriu, os negócios feitos com lucro, mas tudo o que ela fez e se tornou amor.

Um mal muito presente em nosso meio, fruto da cobiça, é a inveja. É um vício que dá origem a outros. “É a tristeza sentida diante do bem do outro e do desejo imoderado de sua apropriação” (Catecismo da Igreja Católica, 2539). Dela nascem o ódio, a maledicência, a calúnia, a alegria diante da desgraça do outro, o desprazer diante de sua prosperidade. Só uma vida vivida em Deus, num exercício de conversão cotidiana, de um esforço em viver na humildade, na simplicidade, no desapego é que possibilitará o combate a esse mal terrível.

“Insensato! Essa noite morrerás e para quem ficará o que acumulaste?”A grande bênção de Deus é a nossa capacidade de compartilhar com os irmãos, de nos compadecermos, de doarmos um pouco de nós, de nos fazermos dom. O resto é idolatria e egoísmo geradores de infelicidade para si e para os outros.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

Cobiça: fonte de todos os males

aureliano, 02.08.19

18º Domingo do TC - C - 04 de agosto.jpg

18º Domingo do Tempo Comum [04 de agosto de 2019]

[Lc 12,13-21]

 “A vida do homem não consiste na abundância de bens”. Essa palavra de Jesus deve nos acompanhar sempre.

Alguém poderia perguntar: ‘Por que Jesus não resolveu aquela situação que lhe foi apresentada pelo irmão que se sentia lesado na herança?’ A resposta é que Jesus não veio resolver questões de poder pelo poder. Ele não veio para se meter em confusão de distribuição de herança. Ele veio para mostrar que os bens precisam ser repartidos, distribuídos. A consciência moral é que precisa ser bem formada para que as pessoas e o Estado se sensibilizem diante do sofrimento alheio e reparta o pão com o necessitado. Para que ninguém passe necessidade (cf. At 4,34).

O relato do evangelho desse domingo nos convida a uma reflexão profunda, diria mesmo, a um exame de consciência sobre o modo como lidamos com os bens materiais; como lidamos com a “concupiscência dos olhos” (1Jo 2,16).

“Não cobiçarás...” (Ex 20,17). É o Décimo Mandamento da Lei de Deus. O Evangelho de hoje nos permite fazer uma visita aos Mandamentos da Lei de Deus, particularmente ao último. Eles andam tão esquecidos, ultimamente! Será que a Aliança de Deus é também temporária, descartável? Parece que não! Deus estabeleceu com seu Povo uma Aliança eterna, para sempre. E Ele permanece fiel!

O Catecismo da Igreja Católica nos lembra que “o apetite sensível nos faz desejar as coisas agradáveis que não temos”. Enquanto não nos conduzem à injustiça, tudo bem. O problema é quando esse desejo se converte em avidez que é o desejo de apropriação desmedida dos bens terrenos. Ou quando se converte em cupidez que é uma paixão imoderada pelas riquezas e pelo poder. Então o ser humano se desvia da relação filial com Deus.

Esse Mandamento quer ajudar a lidar com os bens e posses sem apegos desmedidos, sem acúmulos, sem idolatrar dinheiro e coisas. O sábio já dizia: “O avaro jamais se farta de dinheiro” (Eclo 5,9). E o Apóstolo exortava: “A raiz de todos os males é, de fato, o amor ao dinheiro” (1Tm 6,10).

O Congresso Nacional e o Governo Federal precisam implementar o chamado Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF). Cinco mil famílias brasileiras detêm o equivalente a 40% do Produto Interno Bruto. Notamos, porém, que não há nenhum empenho da classe política em regulamentar o artigo 153, inciso VII da Constituição Brasileira, porque ou suas fortunas seriam tributadas ou as fortunas daqueles que sustentam seus mandatos teriam que pagar os impostos, repartindo o bolo que deve ser de todos.  Uma calamidade nacional! Mas a mudança passa por aí.

O que nos pode ajudar no caminho para não cairmos na idolatria do dinheiro é buscarmos uma vida de partilha. É o caminho da felicidade verdadeira. E a Igreja orienta: Todos os fiéis de Cristo “devem dirigir retamente seus afetos, para que, por causa do uso das coisas mundanas e do apego às riquezas contra o espírito da pobreza evangélica, não sejam impedidos na busca da caridade perfeita” (Lumen Gentium, 42).

É muito oportuno lembrar aquelas palavras de Jesus: “Onde está o teu tesouro, aí estará o teu coração” (Mt, 6, 21). Qual é mesmo o nosso verdadeiro tesouro? Que importância damos aos bens que contam realmente? Como temos administrado o dinheiro, os bens, o patrimônio que nos foi confiado? Como lidamos com o “bolsa-família”, com o “seguro-desemprego”, com o empréstimo de dinheiro, com a compra e venda de mercadoria, com o cumprimento dos horários de trabalho, com o cuidado com os bens que não são meus (privados ou públicos), com aqueles que também são meus, com a relação à justiça para com funcionários/colaboradores etc, etc?

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Não podeis servir a Deus e ao dinheiro”

Recorde um pouquinho a Campanha da Fraternidade de 2010. O uso das coisas deste mundo deve ser de tal modo que nos torne “ricos para Deus”. O sentido da vida não está na posse de muitos bens, mas na administração deles de tal forma que sejam colocados a serviço de todos. Em outras palavras: os bens deste mundo foram criados para todos. É o princípio da “destinação universal dos bens”.

Vale a pena, nesta oportunidade, recordar o perigo da chamada ‘teologia da prosperidade’. O que é isso? Uma interpretação de textos aleatórios da Bíblia para defender a ideia de que Deus dá riqueza material a quem ele julga justo. E que a miséria é fruto da falta de fé e da consequente maldição da parte de Deus. A esse propósito trago uma palavra oportuna dos nossos Bispos ao tratar da realidade da cultura urbana: “Entristece ver que, em um mundo de individualismo consumista, até mesmo a religião é, às vezes, assumida sob a ótica comercial e da prosperidade financeira (Jo 12,2-17)” (Diretrizes Gerais 2019-2023, Nº 55).

Ora o que diz Jesus? “A vida do homem não é assegurada pela abundância de bens”. Não há dinheiro que garanta uma vida terrena imperecível, sem sofrimentos, sem morte. Jesus quer que vamos além. A vida que ele veio trazer é “plena”. É a vida junto dele que já tem começo aqui. Uma vida vivida no coração amoroso do Pai é a grande bênção que ninguém pode tirar.

O entendimento do progresso material, do enriquecimento como bênção e da pobreza como abandono da parte de Deus, leva a pessoa à prática da idolatria, assumindo os bens materiais como a coisa mais importante da vida, reduzindo sua relação com Deus a um nível puramente comercial e interesseiro. Afasta-se totalmente do ensinamento de Jesus que doou toda a sua vida e pediu que seguíssemos seu exemplo. Do contrário, do ponto de vista material, Jesus teria sido o homem mais rico e poderoso, que já existira, pois fora sempre fiel ao Pai. O erro aqui está na interpretação egoísta e interesseira da vida e dos textos bíblicos.

É fácil perceber o que é mesmo fundamental na vida humana quando nos deparamos com situações-limite. Aquela pessoa que está muito mal, prestes a morrer. O que parece mais importante para ela? O dinheiro? Seus bens materiais? Até mesmo a família e amigos entendem que há algo aí mais importante do que a dimensão econômica ou social. Percebe-se aí como é fundamental a dimensão espiritual, sua relação com Deus Pai Criador. Só essa realidade fundante é que lhe poderá dar sustento nesse momento. O que lhe dá conforto agora não são os bens que adquiriu, os negócios feitos com lucro, mas tudo o que ela fez e se tornou amor.

Um mal muito presente em nosso meio, fruto da cobiça, é a inveja. É um vício que dá origem a outros. “É a tristeza sentida diante do bem do outro e do desejo imoderado de sua apropriação” (Catecismo da Igreja Católica, 2539). Dela nascem o ódio, a maledicência, a calúnia, a alegria diante da desgraça do outro, o desprazer diante de sua prosperidade. Só uma vida vivida em Deus, num exercício de conversão cotidiana, de um esforço em viver na humildade, na simplicidade, no desapego é que possibilitará o combate a esse mal terrível.

“Insensato! Essa noite morrerás e para quem ficará o que acumulaste?”A grande bênção de Deus é a nossa capacidade de compartilhar com os irmãos, de nos compadecermos, de doarmos um pouco de nós, de nos fazermos dom. O resto é idolatria e egoísmo geradores de infelicidade para si e para os outros.

*Neste primeiro domingo de agosto celebramos o Dia do Padre. É oportunidade de agradecermos a Deus pelos padres que passaram por nossa vida, nos ajudaram, nos deram os sacramentos. Alguns já partiram desta vida. Outros continuam no meio de nós. É dia também de rezarmos e refletirmos sobre as vocações sacerdotais. O que você tem feito pelas vocações? Você ajuda, reza, apoia os vocacionados? Você ajuda a nós padres a sermos mais pastores, mais próximos, mais dedicados? Não trate o padre como ‘coitadinho’, não! Ele escolheu essa vocação atendendo ao chamado de Deus e da Igreja. Colocou-se livremente a serviço do evangelho. Precisa ser ajudado a viver com fidelidade e dedicação. E você, cristão leigo, deve ajudá-lo a ser um verdadeiro colaborador e servidor das comunidades, rezando por ele, fazendo a correção fraterna quando necessário, sendo colaborativo nos serviços e ministérios da comunidade! Ajudem-nos a sermos mais pastores, mais misericordiosos, mais generosos, mais paternais.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

Como lidar com os bens materiais

aureliano, 13.10.18

28º Domingo do Tempo Comum [14 de outubro 2018]

28º Domingo do TC - 14 de outubro.jpg

   [Mc 10,17-30]

No evangelho do domingo passado refletimos sobre Jesus orientando a vida familiar. A relação conjugal não se fundamenta numa relação de dominação, mas de respeito, de corresponsabilidade, de ajuda mútua. Em síntese, marido e mulher são co-criadores com o Pai.

Neste domingo, continuando a leitura do evangelho de Marcos, Jesus continua a instruir seus discípulos para que a vida deles seja um marco diferencial na sociedade. O cristão precisa fazer a diferença. Agora Jesus ensina a se relacionar com os bens. Realidade muito próxima do casamento. A gente sabe que muitas crises no relacionamento conjugal brotam da relação com o dinheiro. Quantas brigas por conta de dívidas, por conta de diferença de salários, por conta de compra e venda! Quanta confusão, depois da separação, por causa de bens e de pensão! Quanta confusão e, por vezes, morte por causa de herança! Então vamos acompanhar a orientação de Jesus a respeito desse caminho que o discípulo deve fazer.

Esse moço que recorre a Jesus se preocupa com a vida eterna. Não lhe interessa tanto a vida presente uma vez que os bens já lhe estão garantidos. Primeiramente Jesus faz com que sua atenção se volte para o Pai e não tanto para Jesus: “Só Deus é bom”. Os mandamentos da Lei relativos ao próximo ele os tem observado. Notamos, porém, que os Dez Mandamentos não foram citados. Apenas alguns e mesmo assim naquela conotação negativa: “não”. Então lhe faltava a dimensão positiva da vida. Ele observava a Lei, mas não sabia partilhar. Não tinha gratuidade. Não sabia o que estava fazendo. Fazia por fazer. Como aqueles casos muito comuns entre nós: “Por que você quer batizar seu filho?” Ou “Por que você é católico?” A resposta normalmente ecoa: “Porque todo mundo batiza” Ou “Porque meu pai é católico”. Ou simplesmente: “Por que nasci numa tradição católica”. E por aí vai. Uma fé sem fundamento, sem gratuidade, sem generosidade, sem conhecimento, sem razão.

Jesus quis ajudar aquele homem a dar um passo decisivo na vida. É algo que caracteriza a fé cristã: a partilha. “Vai, vende tudo o que tens. Dá o dinheiro aos pobres. Depois vem e segue-me”. Não basta dividir os bens com os pobres. É preciso seguir a Jesus. O seguimento de Jesus é que caracteriza o cristão. Poder-se-iam distribuir os bens por vaidade. E nesse aspecto Paulo já alertara: “Ainda que eu desse todos os meus bens aos pobres; se não tivesse amor, isso de nada valeria” (1Cor 13,3).

No desenrolar do texto Jesus percebe a dificuldade de o rico entrar no Reino. Jesus não está falando de vida depois da morte, não. Ele está falando do Reino de Deus. A vida eterna começa aqui, com a erupção do Reino de Deus. Quem não se desapega, como aquele moço que não teve coragem de se desvencilhar dos bens, não pode entrar na vida de Deus. A vida eterna é a vida em Deus.

A salvação é dom de Deus: “Para Deus tudo é possível”. Ninguém compra a vida de Deus, repartindo seus bens, fazendo caridade etc. Deus nos salva de graça. Porém nossos gestos de bondade, de generosidade, de partilha, de perdão, de tolerância, de respeito, de solidariedade são nossa resposta à bondade de Deus que nos salva. Quem vive preso às suas coisas, fechado em si mesmo, indiferente ao sofrimento alheio ou, pior ainda, buscando sempre oportunidades para aumentar suas posses, defraudando os outros, está cada vez mais longe da salvação. Sua vida está atravancando a ação salvadora de Deus. É uma pedra de tropeço, um escândalo, que impede a vida de florescer. Mata a alegria e as esperanças das pessoas.

Na prática, cada um de nós podia dar uma olhadinha no modo como lida com os bens e posses. O que fazemos com o dinheiro? Onde o guardamos? Com que finalidade? O que estamos comprando? Para quê compramos? Tem gente que renova as mobílias todos os anos. Compra sem necessidade nenhuma. Tem gente que está sempre na ponta da tecnologia. É necessário estar na “crista da onda”? Por outro lado, há pessoas que deixam de comprar coisas essenciais para a casa, que deixam de cuidar da saúde da família para guardar o dinheiro ou aumentar o patrimônio. E, muitas vezes, se endividando com prestações a perder de vista. Tem gente que nem consulta a família para fazer certos gastos. Tem gente que gasta o salário com jogatina, com prostituição e adultério, com bebedeira sem conta, com churrascada desmedida para amigos, com drogas de toda qualidade. Tem gente que vive uma vida miserável para aplicar o dinheiro em rendimentos bancários. Mas não é capaz de partilhar um centavo com os mais pobres!

Isso sem falar da agiotagem que assassina milhares de famílias. Um pecado que brada aos céus: o sujeito tem dinheiro; vê o irmão na pior; empresta-lhe a juros exorbitantes; escraviza o pobre coitado que nunca ou quase nunca consegue pagar (Cf. Sl 15,5).

“A maneira sadia de lidar com o dinheiro é ganhá-lo de forma limpa, utilizá-lo com inteligência, fazê-lo frutificar com justiça e saber compartilhá-lo com os mais necessitados” (Pe. J. A. Pagola).

Não está na hora de colocarmos a mão na consciência e rezarmos um pouco mais nosso ser cristão? Aquele homem do evangelho voltou triste porque possuía muitos bens. Conclui-se que a posse de muitos bens não traz alegria para ninguém. A verdadeira alegria está no bom uso dos bens, do dinheiro. Quando sabemos partilhar, distribuir, comprar ou vender dentro de critérios honestos e a partir de um diálogo respeitoso e cristão dentro de nossa casa, estamos no caminho do verdadeiro discipulado de Jesus. Então experimentaremos a verdadeira alegria que brota de uma vida vivida em Deus, na construção do Reino de partilha, de paz e de justiça.

Penso ser oportuno lembrar também os milhões roubados dos cofres públicos pela corrupção; os desvios sem conta de dinheiro público para os bolsos de gestores e políticos sem consciência; os privilégios garantidos por legislação injusta como auxílio-moradia, auxílio-doença, auxílio-transporte, verba indenizatória para quem já ganha salários exorbitantes: a lei pode garantir, mas não significa que seja justo; as privatizações das empresas estatais, o desejo de alguns mandatários de tomar as reservas indígenas e quilombolas para repassá-las a empresários que não têm mais onde guardar dinheiro. A distância entre ricos e pobres tende a aumentar cada vez mais em nosso País. E pior: com o aval do ‘sufrágio universal’ (votos nas urnas). A estatística confirma que, nas últimas eleições, cresceu no Congresso Nacional o número de milionários. Eles irão propor ou votar projetos que favoreçam os mais pobres em detrimento de aumentarem seu patrimônio? Vamos pensar nisso.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

“Não podeis servir a Deus e ao dinheiro”

aureliano, 16.09.16

25º Domingo do Tempo Comum [18 de setembro de 2016]

[Lc 16, 1-13]

No evangelho do último domingo (Lc 15, 11-32), vimos como aqueles dois filhos tinham perspectivas diferentes na administração dos bens. O filho mais novo pegou sua herança, antes de o pai morrer, e ‘queimou’ tudo. O filho mais velho não teve coragem de pedir um ‘cabrito’ para comer com seus amigos. Só trabalhava. O pai da parábola mostra que o ser humano está acima de qualquer valor monetário. O que importa mesmo é construir relações de perdão, de partilha, de fraternidade para que a vida possa brotar com mais exuberância.

No evangelho de hoje, Jesus conta a parábola do administrador infiel. É preciso notar que ele estava ‘dissipando os bens’ do patrão. Por isso ele foi demitido. Aquele fato de baixar a conta dos devedores está ligado ao costume daquele tempo de se permitir aos administradores emprestarem os bens do patrão e ganhar uma comissão com isso. Esse administrador do evangelho estava abrindo mão desse benefício com vistas a ser recebido nas casas daqueles beneficiados. Por isso foi elogiado pelo patrão.

O que interessa no texto de hoje é a má administração dos bens. Aquele administrador estava botando a perder os bens que o patrão possuía.

Tudo o que temos e somos são dons de Deus que devem ser administrados de acordo com o projeto do Pai. E a primeira tarefa é nos considerarmos administradores e não donos. Os bens não são nossos. Os filhos não são nossos. Os dons não são nossos. Tudo é do Pai! A consagração batismal nos remete a essa realidade: tudo que somos e temos foi consagrado ao Pai.

Tendemos a viver em função do ter e do poder. Pensamos valer pelo que temos. Há pessoas que buscam acumular cada vez mais dinheiro, vivendo, por vezes, uma vida miserável. Outros gastam demais. Gastam o que não têm. Vivem endividadas porque sentem necessidade de comprar e de exibir uma realidade que não são.

Em relação aos bens públicos então, é uma lástima! Há pessoas que não sentem nenhum escrúpulo em esbanjar as coisas públicas: combustível, veículos, energia, água, telefone etc. Desperdiçam, ‘deitam e rolam’ em cima do erário público sem nenhum constrangimento. É um absurdo os gastos desnecessários nos órgãos públicos! Como se desperdiça, como se gasta, como se desvia o dinheiro público!

E quando se trata de funcionalismo público então?! Resguardadas as honrosas exceções, há funcionários que não trabalham! Passam o tempo todo batendo papo, falando mal dos outros, articulando meios de tirar proveito de situação etc. Uma tristeza! O relato do evangelho de hoje quer lembrar a todos que o salário deve ser justo, mas também ganho com honestidade.

Jesus nos ensina a pensar e a viver de modo mais solidário a administração dos bens públicos e privados. Eles devem ser colocados a serviço de todos. Eles são para todos. Inclusive para aqueles que virão depois de nós!

Ao invés de abraçarmos a lógica da desonestidade, da mentira, da hipocrisia, deveríamos hoje nos perguntar: como estamos administrando os recursos que Deus nos deu? Como lidamos com os bens públicos que não são ‘nossos’, mas de todos? Quem ocupa mesmo o centro de minha vida, que orienta minha história e decisões: o Deus de Jesus ou Dinheiro iníquo?

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CUIDADO COM O DINHEIRO!

Alguém me abordou, nestes dias, pedindo uma explicação para a seguinte passagem do evangelho: “Usai o dinheiro injusto para fazer amigos, pois, quando acabar, eles vos receberão nas moradas eternas” (Lc 16,9). O que significa “dinheiro injusto”? É, de fato, um texto que impõe uma reflexão maior.

No tempo de Jesus, os pobres que moravam nas cidades usavam moedas para compra e venda, mas de estanho e de cobre. Com Herodes, começaram a circular moedas de ouro e prata. Portanto tinham um valor maior. Davam mais segurança. Daí que, para entender o que o texto quer dizer, é preciso ir à raiz da palavra que foi traduzida como “dinheiro”. O termo usado no tempo de Jesus era mammona. Vem da raiz aman que significa, em aramaico, confiar, apoiar-se. Era algo em que o indivíduo colocava sua confiança.

Enfim, o que Jesus quis dizer com “dinheiro injusto”? Parece que Jesus não conheceu “dinheiro limpo”. Podemos concluir que Jesus considerava sempre o dinheiro como algo injusto. As relações comerciais de seu tempo eram profundamente injustas, sobretudo a partir do Império Romano. Então o “dinheiro” se tornara um ídolo, ocupando o lugar de Deus. Quanto mais moedas de ouro e prata tanto mais rico e autossuficiente. Jesus então oferece uma saída: “fazer amigos com o dinheiro injusto”. Ou seja, empenhar-se sempre na partilha, no não-acúmulo para não cair na idolatria. Se o dinheiro era “sujo”, recomenda “lavá-lo” na distribuição e cuidado com os pobres. O dinheiro é fonte de intriga e divisão. É preciso, pois, trabalhar para que favoreça a amizade e a comunhão, a igualdade e a fraternidade.

Vale deixar aqui a palavra de São Basílio, a respeito do uso do acúmulo e riqueza: “Não és acaso um ladrão, tu que te apossas das riquezas cuja gestão recebeste?... Ao faminto pertence o pão que conservas; ao homem nu, o manto que manténs guardado; ao descalço, os sapatos que estão se estragando em tua casa; ao necessitado, o dinheiro que escondeste. Cometes assim tantas injustiças quantos são aqueles a quem poderias dar”.

E o que dizer da “teologia da prosperidade” que assola nosso povo religioso? – Aquele “assalto” para vender ou comprar bênçãos e milagres! Uma verdadeira afronta ao evangelho! Um pecado que “brada aos céus e pede a Deus vingança”! Pergunto, de novo: qual é a origem e qual é a destinação do dinheiro que entra no meu bolso? (cf. Amós 8,4-7).

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN