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aurelius

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O óbolo da viúva e a vaidade dos mestres

aureliano, 09.11.24

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32º Domingo do Tempo Comum [10 de novembro 2024]

   [Mc 12,38-44]

A Liturgia da Palavra de hoje nos apresenta duas viúvas em realidades diferentes, mas que se tornam inspiração de vida em Deus. Seus gestos são reveladores da bondade de Deus bem como modelos de como devemos atuar neste mundo. A viúva do evangelho (Mc 12,38-44) “entrega sua própria vida”, naquelas moedas. A viúva de Sarepta (1Rs 17,10-16) partilha seu único e último pão com o profeta. Sua partilha foi abençoada por Deus: “A farinha da vasilha não acabou, nem diminuiu o óleo da jarra” (1Rs 17,16). A viúva do evangelho mereceu um elogio do Salvador que ecoa ainda hoje em nossas consciências: “Esta pobre viúva deu mais do que todos os outros que ofereceram esmolas. Todos deram do que tinham de sobra, enquanto ela, na sua pobreza, ofereceu tudo aquilo que possuía para viver” (Mc 12,44).

Quantas vezes somos mesquinhos em nossa ‘doação’! Olhamos o guarda-roupas e o julgamos muito cheio. Então tomamos aquele ‘resto’ que está atrapalhando e doamos aos pobres. E o tempo? A falta de tempo hoje é um problema! Não se tem tempo para os outros: escutar alguém que precisa de nosso ombro, partilhar nosso saber, realizar um trabalho de catequese, reforço escolar, mutirão em algum evento, uma visita a alguém que está doente e sofrendo alguma dor, uma reunião para tratar de assuntos para o bem-estar da comunidade, presença otimizante junto aos filhos ou aos pais idosos etc. O ‘óbolo’ da viúva passa por aí!

Quando retomamos o evangelho de hoje, notamos que há uma contraposição: os doutores da Lei de um lado e a pobre viúva, de outro. Isso deve ser levado em conta para percebermos aonde o evangelista quer chegar quando faz essa narrativa, o que ele quer iluminar com o gesto e as palavras de Jesus.

Na verdade, o texto não pretende condenar os doutores do judaísmo, mas os doutores do cristianismo. Este começa a germinar, a crescer, mas junto cresce o joio da vanglória. Já naqueles tempos surgiam aqueles que se colocavam como mestres arrogantes, vestindo uma capa de fidelidade, mas com desejos de cobiça e inebriados pelo halo da vaidade e do orgulho encravados no coração. Portavam-se como exploradores da boa-fé do povo.

Jesus não pretende condenar a quantidade de esmola dos escribas. Ele está condenando suas atitudes. Há uma busca gananciosa de bens e de privilégios por parte daqueles que deveriam ajudar o povo a entender e a viver o Ensinamento de Deus. Quanto mais se tem, mais se quer possuir.

Assistimos, os últimos dias, à necessidade e articulação para o “corte de gastos” da máquina pública. Ninguém abre mão de nada. Quem já tem, quer ter mais ainda. Poder econômico é poder político. É possibilidade de fazer dos pobres “massa de manobra” para se manter no poder. Não nos esqueçamos da advertência do Apóstolo das Gentes: “A raiz de todos os males é, de fato, o amor ao dinheiro” (1Tm 6,10).

Marcos pretende mostrar que os líderes da comunidade, aqueles que têm o ministério de dirigir a comunidade e ministrar-lhe a Palavra, precisam assumir a atitude da viúva. As palavras de Jesus: “Eles devoram as casas das viúvas, fingindo fazer longas orações. Por isso eles receberão a pior condenação” (Mc 12,40) são muito graves. Uma vida descomprometida com os pobres e exploradora do pouco que estes têm, é um golpe na proposta do Reino de Deus que Jesus veio implantar.

Jesus mostra aos líderes das comunidades, a começar pelos bispos e padres (teólogos-doutores), que precisam cuidar-se para não caírem naquela situação dos escribas que buscavam-se a si mesmos no que faziam. Tal forma de agir impede a comunidade de fazer um encontro transformador com Jesus Cristo. São os tais clericalismo e carreirismo clerical condenados veementemente pelo Papa Francisco. Diga-se de passagem a corrida às vestes litúrgicas luxuosas e extravagantes que muitas vezes desviam a atenção do mistério celebrado: “A ambição e a atitude dos “mestres da Lei” não se extinguirão nunca, nem sequer nas comunidades cristãs. Ainda hoje, a figura do “mestre da lei” continua atuante, sobretudo quando os “ministros” (ordenados e não-ordenados) insistem no uso exagerado de vestimentas exóticas que tem sua origem no modo de vestir dos poderosos do império romano. Tal insistência parece indicar a necessidade, consciente ou inconsciente, de manifestar posição de poder ou uma carência de interioridade. A “cultura da exterioridade” e da busca do reconhecimento revelam o “complexo de pavão”, quando predomina a preocupação com as aparências, o espetáculo visual, a insistência em ser o centro das atenções nas celebrações, em buscar o elogio e serem admirados por todos” (Pe. Adroaldo Palaoro, SJ).

Outro ensinamento da liturgia de hoje é a importância que Deus dá aos pequenos gestos realizados com simplicidade e humildade. O espírito de grandeza destrói a pessoa e a comunidade por dentro. Apodrece tudo. Enquanto que o espírito de simplicidade constrói, anima, conforta, atrai.

Há líderes que só pensam em como trabalhar na comunidade um jeito de ganhar mais dinheiro. Muitos preocupam-se mais com o dízimo e ofertas do que com a pastoral, com as necessidades reais das pessoas e da comunidade. A propósito disso: qual a porcentagem do dízimo é destinada às causas sociais? – Há gente que busca aparecer a todo custo. Uma busca frenética de poder, de aplausos e de sucesso. É uma realidade triste! Longe de nós tais preocupações! Elas nos distanciam de Deus. Aproximemo-nos das viúvas da liturgia de hoje e aprendamos delas a partilhar e a valorizar os pequenos gestos.

Concluímos com um comentário muito oportuno do Pe. Konings: “Mas, e o lucro que é o “céu”? “Deus te pague”, “Dar ao pobre é investir no céu”... Essas maneiras de falar, examinadas à lupa, mostram ainda muito egoísmo. Não devemos ser generosos para comprar o céu. Devemos ser generosos porque o céu já chegou até nós, porque Deus veio à nossa presença em Jesus. Em certo sentido já ganhamos o céu, porque Jesus se doou a nós. E é por isso que queremos ser generosos como a viúva da entrada do templo e a viúva de Sarepta. Por gratidão”.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN