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aurelius

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O amor é a medida da vida

aureliano, 28.10.23

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30º Domingo do Tempo Comum [29 de outubro de 2023]

[Mt 22,34-40]

Antes de mais nada, gostaria de chamar a atenção para as palavras do evangelho: “A fim de pô-lo à prova”. No texto do domingo passado temos uma expressão parecida: “Fizeram um conselho para tramar como apanhá-lo por alguma palavra”. Vejam como os inimigos de Jesus buscam sempre situações embaraçosas, como são ardilosos para tentar desviar Jesus de seu caminho que é fazer a vontade do Pai! A vida e as palavras de Jesus os incomodava, colocava-os em crise. Diante de tal situação, em vez de buscarem um caminho de conversão, querem eliminar Jesus para não serem incomodados.

O que aconteceu com Jesus acontece também conosco. Quando colocados à prova, de que lado ficamos? Como respondemos às situações embaraçosas? Quais são mesmo nossas convicções a respeito de Deus, de nossa fé, de nossa Igreja, de nossos princípios morais de justiça, de verdade, de honestidade, de lisura, de hombridade, de respeito pelos outros? Seria bom darmos uma olhadinha para a postura de Jesus! “Com os olhos fixos naquele que é o autor e realizador da fé, Jesus, que, em vez da alegria que lhe foi proposta, suportou a cruz, desprezando a vergonha, e se assentou à direita do trono de Deus. Considerai, pois, aquele que suportou tal contradição por parte dos pecadores, para não vos deixardes fatigar pelo desânimo. Vós ainda não resististes até o sangue em vosso combate contra o pecado!” (Hb 12,2-4).

O texto deste domingo relata uma situação de embaraço armada pelos fariseus a Jesus. Querem ver como Jesus resume a Lei, na qual eles contavam 613 prescrições: 248 mandamentos e 365 proibições, todos atribuídos a Moisés. Todos tinham o mesmo peso. Jesus, Sabedoria do Pai, aproxima estes dois mandamentos, amor a Deus (Dt 6) e ao próximo (Lv 19), formando assim como que dois gonzos de uma única porta.

A resposta de Jesus dá unidade a esses dois mandamentos. Não tem como amar a Deus sem amar o próximo, e vice-versa (1Jo 3,11-18). Não se conhece e nem se vive a vontade de Deus sem referência ao próximo. Quem ama a Deus procura conhecer sua vontade a respeito do próximo. Quem não admite Deus na sua vida coloca-se a si mesmo como senhor e deus. Por outro lado, se não se considera uma instância absoluta, Deus, não se consegue amar o próximo com amor de gratuidade. Assim, podemos cair na situação de amar-nos a nós mesmos no próximo: políticos ambiciosos, os que fazem o bem fazendo questão de anunciar aos quatro ventos o que fizeram; pessoas que fazem shows em cultos religiosos, que não buscam o louvor e a glória de Deus e o bem da comunidade, mas a autoafirmação, a fama, o sucesso, o dinheiro etc. São deuses de si mesmos!

O amor de que fala o texto de hoje não é um amor de sentimento, mas uma opção ética. Ou seja, a pessoa cheia de Deus, escolhe e decide orientar suas forças e energias para Deus e colocar-se sempre ao lado do mais necessitado, do mais fraco.

Nesse caminho de amor a Deus e ao próximo, o cristão sente-se interpelado a solidarizar-se com os mais pobres, pois é impossível amar a Deus a quem não se vê e não amar o próximo que se vê (cf. 1Jo 4, 20). E a verdadeira religião é dedicar-se aos necessitados (cf. Tg 1, 27). Porém não basta uma esmola, um prato de comida, um pão. Esse mandamento coloca o cristão na luta pela mudança das estruturas sociais, por políticas públicas que contemplem as reais necessidades de todos, sobretudo dos mais pobres. Para que todos tenham acesso aos mesmos bens da Criação, sem privilegiados e excluídos.

A propósito da destinação universal dos bens, ou seja, partindo da compreensão de que Deus criou esse mundo para todos e não somente para alguns privilegiados, trago uma palavra inquietante do Papa Francisco na Carta Fratelli Tutti: “Nos primeiros séculos da fé cristã, vários sábios desenvolveram um sentido universal na sua reflexão sobre o destino comum dos bens criados. Isto levou a pensar que, se alguém não tem o necessário para viver com dignidade, é porque outrem se está a apropriar do que lhe é devido. São João Crisóstomo resume isso, dizendo que, ‘não fazer os pobres participar dos próprios bens, é roubar e tirar lhes a vida; não são nossos, mas deles, os bens que aferrolhamos’. E São Gregório Magno di-lo assim: ‘Quando damos aos indigentes o que lhes é necessário, não oferecemos o que é nosso; limitamo-nos a restituir o que lhes pertence’” (FT, 119).

Uma pergunta intrigante: Para que amar a Deus? Não basta amar o próximo, cuidar dele sem referência a Deus?  Bem! Podemos dizer que, para amar o irmão na medida do evangelho, devemos também amar a Deus, aderir a Ele, porque acreditamos que Deus é o Absoluto, o que tem a última palavra, a última instância de nossa vida. Deus é amor. Fomos criados por Ele num ato de seu amor por nós: "Façamos o homem à nossa imagem, como nossa semelhança" (Gn 1, 26). Fomos salvos pelo seu amor: “Deus amou tanto o mundo que entregou seu Filho único, para que todo que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3,16). E seu Filho nos amou até o fim, até às ultimas consequências: “Tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até fim” (Jo 13,1).

Portanto, nossa vida é fruto do amor. Porque Deus, nosso Criador, é amor (1Jo 4,8).  E como sabemos que estamos vivos diante de Deus? Pelo amor: “Nós sabemos que passamos da morte para a vida, porque amamos os irmãos. Aquele que não ama permanece na morte” (1Jo 3,14). E se não empenharmos nossa vida numa dimensão amorosa, de saída de nós mesmos, de entrega como dom aos que precisam de nós, estamos negando a essência de nós mesmos. Sem relação com Deus nosso amor pode se desviar do que seja o verdadeiro amor. E cairmos em relações pegajosas, interesseiras, sufocantes, narcisistas. Ou mesmo num humanitarismo frágil porque vazio de sentido absoluto. Deus é amor, a fonte do amor. Não há como amar de verdade, na gratuidade, na generosidade sem beber dessa fonte cristalina, originante, sem medida. Nossa medida sem referência à medida amorosa de Deus, será sempre pequena, mesquinha, egoísta, autocentrada.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN