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aurelius

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Na força do Espírito Santo

aureliano, 15.05.20

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6º Domingo da Páscoa [17 de maio de 2020]

[Jo 14,15-21]

Estamos no chamado ‘discurso de despedida’ de Jesus segundo o quarto Evangelho: capítulos 13 a 17.  Aí estão os relatos da “Hora” de Jesus: “Sabendo Jesus que a sua hora tinha chegado, a hora de passar deste mundo para o Pai, ele que amara os seus que estavam no mundo, amou-os até o extremo ” (Jo 13,1). Jesus então dá o seu testamento, aquilo que não poderão esquecer jamais, seu último desejo. E garante que não os abandonará. No evangelho deste domingo a Igreja nos apresenta o tema dos mandamentos de Jesus e o dom do Espírito.

Mandamentos de Jesus

Nós ouvimos sempre falar sobre os “Mandamentos da Lei de Deus” (cf. Ex 20, 1-17). Mas hoje estamos tratando sobre os mandamentos de Jesus que são: crer no Pai, crer em Jesus, guardar a sua palavra, permanecer nele, amar uns aos outros como ele amou, realizar as obras dele, praticar a verdade, trabalhar pelo alimento que permanece para a vida eterna. Esses mandamentos, no entanto, se resumem naquelas palavras que dirige aos seus, antes da paixão: “Como eu vos amei, assim também deveis amar-vos uns aos outros” (Jo 15, 35). A prova de que amamos a Jesus é vivência de seus mandamentos: “Se me amais, observeis meus mandamentos” (Jo 14,14).

Esse amor a Jesus não se dá de modo sensível. Ele não está mais no meio de nós como viveu em Nazaré. Ele continua conosco, mas ressuscitado. Esse amor se manifesta quando ‘guardamos sua palavra’. Ou seja, quando o vemos e o servimos na pessoa dos mais pobres e abandonados: “Tudo o que fizerdes a um desses mais pequeninos foi a mim que o fizestes” (Mt 25, 40).

O dom do Espírito Santo

A ausência física de Jesus é substituída pelo Espírito Santo, o Paráclito. É pela força deste Consolador, Advogado (advoga nossa causa contra o mundo) que nós continuamos a missão de Jesus. Essa força nós a recebemos no Batismo e se completa, se ‘confirma’ na Crisma, com o dom do Espírito Santo que nos amadurece e encoraja para a missão (cf. At 8, 5-8.15-17, primeira leitura de hoje).

Para muitos a passagem de Jesus pela história não fez diferença. A vida de Jesus não deixou nenhum rastro em sua vida. Não “viram” nem “conheceram” a Jesus (cf. Jo 14,17). Nossa missão é mostrar, com nossa vida, que a vida em Deus como Jesus a viveu faz a diferença no mundo. Mas somos incapazes de realizar essa missão por nós mesmos. É a força do Espírito Santo, consolador, advogado, defensor que nos sustentará na defesa da verdade manifestada, não em doutrinas, mas na vida e atuação de Jesus de Nazaré.

Dessa forma nossa vida, pela ação do Espírito, será um contínuo louvor a Deus, conforme ensinava  Santo Agostinho: “Na verdade, louvamos a Deus agora que nos encontramos reunidos na igreja. Mas logo ao voltarmos para casa, parece que deixamos de louvar a Deus. Não dixes de viver santamente e louvarás sempre a Deus. Deixas de louvá-lo quando te afastas da justiça e do que lhe agrada. Mas, se nunca te desviares do bom caminho, ainda que tua língua se cale, tua vida clamará; e o ouvido de Deus estará perto do teu coração. Porque assim como nossos ouvidos escutam nossas palavras, assim os ouvidos de Deus escutam nossos pensamentos” (Ofício das Leituras, sábado da 5ª semana da páscoa).

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O ESPÍRITO DA VERDADE NÃO NOS DEIXARÁ ÓRFÃOS

Elemento fundante de nossa fé cristã é a consciência de não sermos abandonados por Deus, jamais: “Ele (o Pai) vos dará outro Defensor que ficará para sempre convosco” (Jo 14,16). É importante notar que essa verdade tem consequências para nossa vida cotidiana: essa presença de Jesus em nós e em nosso meio precisa ser percebida, captada, vista por aqueles que nos rodeiam: “Vós sois uma carta de Cristo confiada a nosso ministério, escrita não com tinta, mas com o Espírito do Deus vivo; não em tábuas de pedra, mas em tábuas de carne, nos vossos corações” (2Cor 3,3). Em outras palavras, nossa vida deve manifestar nossa fé e a presença de Jesus pelo seu Espírito em nós.

Este Espírito que nos é dado é cognominado “Espírito da verdade”. Essa verdade de que fala Jesus não é uma verdade filosófica, científica, racional, mas teológica. Uma verdade que pode ser traduzida por ‘fidelidade’. Na relação com Deus, podemos afirmar que uma pessoa verdadeira é uma pessoa fiel. E essa fidelidade não tem consistência apenas na opção de vida ética da pessoa, mas no Dom do Pai. É o “Espírito da Verdade que o mundo não pode acolher” que garante a fidelidade do discípulo de Jesus.

A gente tem medo da verdade. Dizer a verdade, ouvir a verdade não é tarefa fácil. Por vezes preferimos levar uma vida falsa, de aparência, enganando-nos a nós mesmos a vida inteira por medo de enfrentar a realidade da verdade. A verdade tira a capa, desmascara. Dizer a verdade não é desrespeitar, ofender, gritar com os outros, agredir, machucar. Dizer e viver a verdade é sair do casulo, é buscar uma vida coerente, é reconhecer a própria pequenez, é dizer e expressar com sinceridade o que se sente e o que se pensa na busca de comunhão, de paz, de harmonia verdadeira. “Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará” (Jo 8,32).

Viver no ‘Espírito da Verdade’ não é tornar-se dono da verdade nem atacar e derrubar adversários nem alegrar-se pela queda do outro, mas viver como testemunha de Jesus. É manifestar o amor a Jesus ‘observando’ seus mandamentos.

O ‘Espírito da Verdade’ nos convida a viver a verdade no meio de uma sociedade mentirosa, enganadora, marcada por uma vida de aparência, em que a “fake news”, as notícias falsas prevalecem. Não nos deixemos levar pela mediocridade, pelo ‘todo mundo faz’, pela preguiça e comodismo que não nos deixam trabalhar nem ajudar a ninguém; por uma gatunagem descarada que leva alguns a valerem-se até mesmo da boa fé dos ‘pequenos’ para sugar-lhes as forças e o pouco que têm para sobreviver, ou mesmo da pandemia – covid-19 – que ceifa tantas vidas, para tirar vantagem política e financeira. Deus nos livre de uma mentalidade dessas!

Abramos nosso coração ao Defensor, Auxiliador enviado pelo Pai por meio de seu Filho, para que nele possamos nos fortalecer sempre mais contra as forças da mentira, da desilusão, da ganância, do mal que quer nos seduzir e arrancar de nosso coração os valores do Evangelho, os princípios morais e éticos, a coerência de vida que gera mais vida. Quem ama tem Deus no coração (cf Jo 14,21).

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

Amar como Jesus amou

aureliano, 04.05.18

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6º Domingo da Páscoa [06 de maio de 2018]

[Jo 15,9-17]    

Falar em amor nesses nossos tempos tornou-se difícil e ambíguo porque esse conceito tomou várias conotações. De modo geral equivale a relações afetivo-sexuais. Daí a expressão tão corriqueira que a ‘galera’ toda entende: “fazer amor”, que equivale a “fazer sexo”.

O evangelho de hoje nos ajuda a perceber a profundidade do sentido da palavra amor. “Como meu Pai me amou, assim também eu vos amei. Permanecei no meu amor” (Jo 15,9). Jesus fez a experiência do amor do Pai. O que ele viveu foi expressão de seu amor ao Pai e por nós. Ele não nos amou porque somos amáveis. Mas ele nos tornou amáveis por seu amor. Seu amor nos tornou seus amigos em vez de servos: “Já não vos chamo servos, (...) mas vos chamo amigos porque vos dei a conhecer tudo o que ouvi de meu Pai” (Jo 15, 15).

O amor que Jesus viveu e ensinou é um amor de doação, desinteressado. Ama pelo outro e não por si mesmo. É como aquela mulher que ama seu marido, mesmo que não tenha lá muitas qualidades, mas porque ela o escolheu como marido. Ou porque tem uma motivação maior, mais sublime: ser sinal da Aliança do Pai com a humanidade. Ou mesmo pelo cuidado e amor para com os filhos etc. Outra imagem também é a de Ricardo Pinheiro, rapaz que morreu na tragédia no Largo do Paissandu, São Paulo, no início da semana: antes de se salvar pela corda oferecida pelo Corpo de Bombeiros, estava ajudando a resgatar vizinhos. Em uma das vezes foi visto carregando quatro crianças. Mas acabou sendo consumido pelo desabamento do prédio. Outro exemplo é o da professora Helley de Abreu, da creche incendiada em Janaúba, norte de Minas. Salvou muitas crianças. Terminou vítima de sua própria doação.

O amor não significa antes de tudo que nós amamos a Deus, mas que Deus nos amou primeiro dando seu Filho por nós (cf. 1Jo 4, 10). É um amor de gratuidade, sem limites. Ele nos amou até o fim (cf. Jo 13, 1). Amar é iniciativa de Deus. Para que permaneçamos no amor precisamos de estabelecer uma intimidade profunda com Ele para que seu amor esteja em nós e não desanimemos de amar como Ele nos amou.

É interessante notar ainda que o mandamento do amor ao próximo já estava na Lei Antiga: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Lv 19,18). Que novidade então Jesus introduziu? A novidade do mandamento de Jesus está no “como eu vos amei”. Esse “como ele nos amou” é que torna esse mandamento diferenciado, significativo, cristão. É ter a coragem de sair de si e de dar a vida. É amar na gratuidade, sem esperar nada em troca. Nem o céu como recompensa!

Podemos falar então de um amor como dom e de um amor como missão. O amor como dom é a entrega generosa, gratuita de Deus por nós em Jesus. Já o amor como missão é nossa capacidade de amar, fundada no amor primeiro, o de Jesus. Ele nos dá a missão de fazer multiplicar seu amor no mundo. “Nisto meu Pai é glorificado: que deis muitos frutos e vos torneis meus discípulos” (Jo 15,8).

A dinâmica do amor de Deus também não é geral: amar todo mundo indistintamente, como uma massa informe. Não! Ele ama a todos e a cada um individualmente. Tem uma amizade criadora e íntima para cada um que acolhe seu amor manifestado em Jesus.

No amor de Jesus não há manipulação, dominação ou submissão. É um amor que liberta, que dá autonomia, confiança. Quando Jesus nos envia a produzir frutos não é uma carga pesada que ele coloca em nossos ombros, mas é participação na missão que Ele recebeu do Pai. É comunhão com Jesus e com os irmãos. Onde há comunhão, solidariedade, doação o peso fica mais leve.

Quando Jesus diz “permanecei no meu amor” ele não fala de permanecer em uma religião, mas no seu amor. Significa que, ser cristão não é questão de doutrina, mas de amor. O fundamental da fé cristã é não se desviar do amor. É “guardar seus mandamentos”. O seu mandamento é o amor fraterno. Esse mandamento não pode ser um peso, mas fonte de alegria.

Quando falta o verdadeiro amor, caímos no vazio, na falta de sentido para a vida, na tristeza. Jesus veio preencher nosso vazio de sentido com a alegria verdadeira gerada pelo amor sem medida. É o amor que gera alegria. Sem amor cultiva-se um cristianismo triste, ressentido, pesado, insuportável.

Por vezes em nossas comunidades cristãs sobra tristeza. O peso das normas e leis, da falta de acolhida, da incompreensão, do desejo e busca de poder e de dominação dentro da comunidade, do preconceito e desprezo aos mais pobres e pequenos deixa um rastro de dor, de tristeza, de desencanto. Sente-se também a falta de convicção na fé. É a convicção que nos leva a reproduzir na vida o modo de vida de Jesus, o seu mandamento: “Amai-vos uns aos outros”.

Vamos tornar mais leves nossas relações através de uma fé mais convicta, de um seguimento mais radical a Jesus, de uma atenção e compreensão a cada um na sua necessidade e dificuldade. “Para que a minha alegria esteja em vós”. A fé cristã precisa trazer mais alegria ao mundo e à vida das pessoas, começando pela nossa família, pelos companheiros de trabalho, pelas nossas comunidades.

13 de maio: Vamos celebrar, no próximo dia 13, a festa de Nossa Senhora do Santíssimo Sacramento. É a padroeira de nossa Congregação Sacramentina. A devoção a Maria com esse título começou em 1868, com São Julião Eymard, fundador dos Sacramentinos da Adoração Perpétua. Pe. Júlio Maria, nosso fundador, divulgou muito essa devoção. Dizia que “a Eucaristia é o prolongamento da Encarnação”. Com isso ele queria dizer que, aquele Jesus nascido de Maria, Filho de Deus, continua na Eucaristia alimentando e animando a missão da Igreja. João Paulo II vai dizer, mais tarde, que (embora os textos da Escritura não mencionem explicitamente) a Virgem Maria “não podia deixar de estar presente, nas celebrações eucarísticas, no meio dos fiéis da primeira geração cristã, que eram assíduos à ‘fração do pão’” (At 2,47) (EE, 53). Maria foi uma mulher eucaristizante. Sejamos também nós, a exemplo de Maria, pessoas eucaristizadas e eucaristizantes, trabalhando para um mundo mais humano, mais fraterno, para que todos tenham acesso aos bens da Criação.

                Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN.