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aurelius

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A pequenez, lugar da manifestação de Deus

aureliano, 23.12.24

Natal 2019.jpg

Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo [25 de dezembro de 2024]

[Lc 2,1-14]

Durante quatro semanas viemos nos preparando para a celebração do Natal. A cada domingo uma vela era acesa na Coroa do Advento. O acender progressivo das velas – uma por semana – quis significar a Luz que brilhou progressivamente nas trevas. A expectativa dessa Luz vem de longa data. No século VIII a. C., o Primeiro Isaías já a anunciava: “O povo que andava na escuridão viu uma grande luz; para os que habitavam as sombras da morte uma luz resplandeceu” (Is 9,10).

As trevas são o egoísmo que insiste em impedir a entrada da Luz de Deus na história, no coração humano. A força da luz, porém, é maior do que as trevas do pecado. Embora este insista em prevalecer através da ganância, do consumismo, da competição desleal, da exploração, do desrespeito, da corrupção, do preconceito, da indiferença. Porém, “A graça de Deus se manifestou trazendo salvação para todos os homens” (Tt 2,11). Para que a luz vença as trevas é preciso, porém, que o ser humano abandone a “impiedade e as paixões mundanas” vivendo “neste mundo com equilíbrio, justiça e piedade” (Tt 2,12).

A sociedade pós-moderna e neoliberal sufoca o sentido do Natal. E os cristãos vão perdendo de vista seu sentido verdadeiro. As compras de presentes e mais presentes, despesas inúteis, gastos e festas com verniz de generosidade, bondade e emoção. Ações de momento que não trazem a libertação verdadeira do ser humano. Pelo contrário, costuma aprisioná-lo ainda mais nas malhas de uma ideologia assistencialista, por vezes marcada por um espiritualismo alienante ou uma fé fundada na magia ou na emoção que proclama: “Deus mandou isso para você!”. “Tenha fé que você vai conseguir!”. “Levante a mão quem aceita a salvação”. “Tive uma revelação: você está sendo curado nesse momento”. Fica parecendo que as dificuldades da vida se resolvem como num passe de mágica! Vamos sair dessa fé infantil e artificial e viver uma fé mais madura, mais consistente! Chega de enganar as pessoas ou de iludir-se a si mesmo! Há programas religiosos via rádio, televisão e redes sociais que se dizem cristãos, mas que não têm nada a ver com o Evangelho, com Jesus de Nazaré! Insistem em mensagens que alimentam uma fé infantil, mágica, uma fé com capa cristã, mas com miolo pagão.

O Jesus que celebramos neste Natal é gente de verdade. Um menino pobre, filho de um casal de trabalhadores anônimos da Galiléia. Experimenta a condição dos excluídos: nasce entre os pastores – pois não havia lugar na hospedaria da cidade – excluídos e odiados pelos citadinos porque o rebanho era ameaça às lavouras dos proprietários de terra residentes na cidade. Não veio justificar a exclusão e a miséria que atingia (e atinge ainda hoje) considerável parcela da humanidade. Nem muito menos endossar o assassinato de pequenos indefesos. – Isso foi atitude de Herodes, perseguidor de Jesus por medo de perder o poder –. Jesus, pelo contrário, veio para anunciar que o Reino de Deus é partilha, é respeito, é acolhida das diferenças, é vida em abundância para todos. E que todos nós que nos dizemos cristãos, só o seremos de fato quando nos comprometermos com o Evangelho que ele veio anunciar.

O “Filho de Davi” nasce entre os pastores na cidade de Belém, a cidade de Davi. Este rei, quando menino, era pastor. Foi consagrado para ser o pastor de Israel. Porém, assediado pelo poder, assumiu uma postura de rei poderoso. E perpetrou muitos atos de maldade e de infidelidade, muito embora tenha pedido perdão. Porém, aquele que devia ser a salvação de Israel descenderia de Davi. Ao nascer, o faz em meio aos pastores para lembrar que veio para ser pastor do rebanho, e não para servir-se das ovelhas (cf. Ez 34). – Quando olhamos para os dirigentes e legisladores de nosso País (e quase todos se dizem cristãos!), que metem a mão no dinheiro público para fazerem lobby (influência) junto ao grande capital e aos eleitores, somos acometidos por uma grande decepção e indignação: as ovelhas estão sendo devoradas e/ou abandonadas pelos lobos travestidos de pastores!

O sinal para identificar o menino é também interessante: “Um recém-nascido envolto em faixas e deitado numa manjedoura”. É o sinal da mudança de valores: aqueles que esperavam um Messias poderoso não poderão encontrá-lo. A salvação brota do meio dos marginalizados, dos simples, dos pequeninos. Os sinais para encontrá-lo não são luzes brilhantes, nem milagres estupendos, nem roupas de grife. Mas “um recém-nascido envolto em faixas”. Ademais os primeiros a visitá-lo não são os mestres e doutores, os prefeitos e governadores, mas os simples pastores. Sua presença como primeiras testemunhas do nascimento do Salvador evidencia a gratuidade e simplicidade de Deus, que dispensa aparatos oficiais.

Eis, pois, a grande Luz que nos enche de alegria. Experimentar e contemplar a salvação de Deus, em Jesus, deve ser motivo de profunda alegria para todos nós: “Eis que eu vos anuncio uma grande alegria”. Renunciando às trevas do egoísmo, colocamo-nos na grande Luz de Deus. Nesse encontro amoroso e gratuito com o Senhor, somos fortalecidos para continuar trabalhando em favor dos excluídos, dissipando as trevas com a luz que recebemos de Deus na participação da vida divina que nos mereceu Jesus pela sua morte e ressurreição. Então não precisamos temer as trevas, pois em Jesus recebemos “graça sobre graça” (Jo 1,16).

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POR QUE 25 DE DEZEMBRO?

Muita gente pensa que o dia 25 de dezembro é a data do aniversário de Jesus. Porém é preciso esclarecer que não se tem nenhum registro do dia nem do mês em que Jesus nasceu. O que se sabe com bastante certeza é que terá nascido entre os anos 04 e 06 antes da Era Cristã.

E como se estabeleceu o dia 25 de dezembro para celebrar o Natal do Senhor? É que na Roma Antiga, nesta data, se celebrava o “Nascimento do Sol Invicto”. Ou seja, na noite mais longa e no dia mais curto, devido à distância entre o sol e a linha do equador, acreditava-se que o sol “renascia”. Era o solstício do inverno, ou seja, o retorno do sol que marcava o fim do inverno e início do verão. Como o sol representava uma divindade pagã, 25 de dezembro era dia de festa religiosa. Ora, a Igreja, com a sabedoria que lhe é própria, valeu-se deste fato para introduzir os cristãos na celebração daquele que é o Sol que não tem ocaso, a Luz definitiva da vida do fiel, o “Sol Invicto”. Assim, os pagãos que se convertiam à fé eram introduzidos na celebração de Jesus Cristo, a “Sol nascente que brilha nas trevas” (cf. Lc 1, 78-79). A festa pagã foi cristianizada.

Se na Igreja Romana se celebra o Natal no dia 25 de dezembro pelas razões aludidas, a Igreja Oriental celebra esta mesma solenidade no dia 06 de janeiro, denominando-a Epifania, Manifestação do Senhor. Neste dia os cristãos de rito oriental celebram numa mesma liturgia o nascimento do Salvador e a visita dos Reis Magos (Dia de Reis).

O que tudo isso importa para nós? Que a liturgia da Igreja é sempre uma busca de inculturar a fé na realidade que vivemos. Símbolos e celebrações pagãs foram cristianizados e introduzidos na liturgia cristã para que o ensinamento e a vida de Jesus encontrem ressonância dentro de nós e nos ajudem a transparecer na vida cotidiana as realidades que celebramos na liturgia.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

A pequenez, lugar onde mora Deus

aureliano, 23.12.23

Natal 2019.jpg

Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo [25 de dezembro de 2023]

[Lc 2,1-14]

Durante quatro semanas viemos nos preparando para a celebração do Natal. A cada domingo uma vela era acesa na Coroa do Advento. O acender progressivo das velas – uma por semana – quis significar a Luz que brilhou progressivamente nas trevas. A expectativa dessa Luz vem de longa data. No século VIII a. C., o Primeiro Isaías já a anunciava: “O povo que andava na escuridão viu uma grande luz; para os que habitavam as sombras da morte uma luz resplandeceu” (Is 9,10).

As trevas são o egoísmo que insiste em impedir a entrada da Luz de Deus na história, no coração humano. A força da luz, porém, é maior do que as trevas do pecado. Embora este insista em prevalecer através da ganância, do consumismo, da competição desleal, da exploração, do desrespeito, da corrupção, do preconceito, da indiferença. Porém, “A graça de Deus se manifestou trazendo salvação para todos os homens” (Tt 2,11). Para que a luz vença as trevas é preciso, porém, que o ser humano abandone a “impiedade e as paixões mundanas” vivendo “neste mundo com equilíbrio, justiça e piedade” (Tt 2,12).

A sociedade pós-moderna e neoliberal sufoca o sentido do Natal. E os cristãos vão perdendo de vista seu sentido verdadeiro. As compras de presentes e mais presentes, despesas inúteis, gastos e festas com verniz de generosidade, bondade e emoção. Ações de momento que não trazem a libertação verdadeira do ser humano. Pelo contrário, costuma aprisioná-lo ainda mais nas malhas de uma ideologia assistencialista, por vezes marcada por um espiritualismo alienante ou uma fé emocionalista que proclama: “Deus mandou isso para você!”. “Tenha fé que você vai conseguir!”. “Levante a mão quem aceita a salvação”. “Tive uma revelação: você está sendo curado nesse momento”. Fica parecendo que as dificuldades da vida se resolvem como num passe de mágica! Vamos sair dessa fé infantil e artificial e viver uma fé mais madura, mais consistente! Chega de enganar as pessoas ou de iludir-se a si mesmo! Há programas religiosos de rádio e televisão que se dizem cristãos, mas que não têm nada a ver com o Evangelho, com Jesus de Nazaré! Insistem em mensagens que alimentam uma fé infantil, mágica, uma fé com capa cristã, mas com miolo pagão.

O Jesus que celebramos neste Natal é gente de verdade. Um menino pobre, filho de um casal de trabalhadores anônimos da Galiléia. Experimenta a condição dos excluídos: nasce entre os pastores – pois não havia lugar na hospedaria da cidade – excluídos e odiados pelos citadinos porque o rebanho era ameaça às lavouras dos proprietários de terra residentes na cidade. Não veio justificar a exclusão e a miséria que atingia (e atinge ainda hoje) a maior parte da humanidade. Nem muito menos endossar o assassinato de pequenos indefesos. – Isso foi atitude de Herodes, perseguidor de Jesus por medo de perder o poder –. Jesus, pelo contrário, veio para anunciar que o Reino de Deus é partilha, é respeito, é acolhida das diferenças, é vida em abundância para todos. E que todos nós que nos dizemos cristãos, só o seremos de fato quando nos comprometermos com o Evangelho que ele veio anunciar.

O “Filho de Davi” nasce entre os pastores na cidade de Belém, a cidade de Davi. Este rei, quando menino, era pastor. Foi consagrado para ser o pastor de Israel. Porém, inebriado pelo poder, assumiu uma postura de rei poderoso. E perpetrou muitos atos de maldade e de infidelidade, muito embora tenha pedido perdão. Porém, aquele que devia ser a salvação de Israel descenderia de Davi. Ao nascer, o faz em meio aos pastores para lembrar que veio para ser pastor do rebanho, e não para servir-se das ovelhas (cf. Ez 34). – Quando olhamos para alguns dirigentes e legisladores de nosso País (e quase todos se dizem cristãos!), que metem a mão no dinheiro público para fazerem lobby (influência) junto ao grande capital e aos eleitores, somos acometidos por uma grande decepção e indignação: as ovelhas estão sendo devoradas e/ou abandonadas pelos lobos travestidos de pastores!

O sinal para identificar o menino é também interessante: “Um recém-nascido envolto em faixas e deitado numa manjedoura”. É o sinal da mudança de valores: aqueles que esperavam um Messias poderoso não poderão encontrá-lo. A salvação brota do meio dos marginalizados, dos simples, dos pequeninos. Os sinais para encontrá-lo não são luzes brilhantes, nem milagres estupendos, nem roupas de grife. Mas “um recém-nascido envolto em faixas”. Ademais os primeiros a visitá-lo não são os dignitários da cidade, mas os simples pastores. Sua presença como primeiras testemunhas do nascimento do Salvador evidencia a gratuidade e simplicidade de Deus, que dispensa aparatos oficiais.

Eis, pois, a grande Luz que nos enche de alegria. Experimentar e contemplar a salvação de Deus, em Jesus, deve ser motivo de profunda alegria para todos nós: “Eis que eu vos anuncio uma grande alegria”. Renunciando às trevas do egoísmo, colocamo-nos na grande Luz de Deus. Nesse encontro amoroso e gratuito com o Senhor, somos fortalecidos para continuar trabalhando em favor dos excluídos, dissipando as trevas com a luz que recebemos de Deus na participação da vida divina que nos mereceu Jesus pela sua morte e ressurreição. Então não precisamos temer as trevas, pois em Jesus recebemos “graça sobre graça” (Jo 1,16).

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POR QUE 25 DE DEZEMBRO?

Muita gente pensa que o dia 25 de dezembro é a data do aniversário de Jesus. Porém é preciso esclarecer que não se tem nenhum registro do dia nem do mês em que Jesus nasceu. O que se sabe com bastante certeza é que terá nascido entre os anos 04 e 06 antes da Era Cristã.

E como se estabeleceu o dia 25 de dezembro para celebrar o Natal do Senhor? É que na Roma Antiga, nesta data, se celebrava o “Nascimento do Sol Invicto”. Ou seja, na noite mais longa e no dia mais curto, devido à distância entre o sol e a linha do equador, acreditava-se que o sol “renascia”. Era o solstício do inverno, ou seja, o retorno do sol que marcava o fim do inverno e início do verão. Como o sol representava uma divindade pagã, 25 de dezembro era dia de festa religiosa. Ora, a Igreja, com a sabedoria que lhe é própria, valeu-se deste fato para introduzir os cristãos na celebração daquele que é o Sol que não tem ocaso, a Luz definitiva da vida do fiel, o “Sol Invicto”. Assim, os pagãos que se convertiam à fé eram introduzidos na celebração de Jesus Cristo, a “Sol nascente que brilha nas trevas” (cf. Lc 1, 78-79). A festa pagã foi cristianizada.

Se na Igreja Romana se celebra o Natal no dia 25 de dezembro pelas razões aludidas, a Igreja Oriental celebra esta mesma solenidade no dia 06 de janeiro, denominando-a Epifania, Manifestação do Senhor. Neste dia os cristãos de rito oriental celebram numa mesma liturgia o nascimento do Salvador e a visita dos Reis Magos (Dia de Reis).

O que tudo isso importa para nós? Que a liturgia da Igreja é sempre uma busca de inculturar a fé na realidade que vivemos. Símbolos e celebrações pagãs foram cristianizados e introduzidos na liturgia cristã para que o ensinamento e a vida de Jesus encontrem ressonância dentro de nós e nos ajudem a transparecer na vida cotidiana as realidades que celebramos na liturgia.

A propósito da Carta do Papa Francisco sobre o Presépio, ele ensina: “Eu sublinhei uma palavra: a maravilha. Isso é importante. Se nós cristãos olharmos o presépio como uma coisa bonita, como uma coisa histórica e também religiosa e rezarmos, isso não é suficiente. Diante do mistério da encarnação do Verbo, diante do nascimento de Jesus é necessária a atitude religiosa da maravilha. Se eu diante dos mistérios não chego a esta maravilha, a minha fé é simplesmente superficial. Uma fé de informática. Não se esqueçam disso” (Carta Apostólica Admirabile Signum).

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

 

 

A pequenez, lugar onde mora Deus

aureliano, 23.12.22

Natal 2020.JPG

Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo [25 de dezembro de 2022]

[Lc 2,1-14]

Durante quatro semanas viemos nos preparando para a celebração do Natal. A cada domingo uma vela era acesa na Coroa do Advento. O acender progressivo das velas – uma por semana – quis significar a Luz que brilhou progressivamente nas trevas. A expectativa dessa Luz vem de longa data. No século VIII a. C., o Primeiro Isaías já a anunciava: “O povo que andava na escuridão viu uma grande luz; para os que habitavam as sombras da morte uma luz resplandeceu” (Is 9,10).

As trevas são o egoísmo que insiste em impedir a entrada da Luz de Deus na história, no coração humano. A força da luz, porém, é maior do que as trevas do pecado. Embora este insista em prevalecer através da ganância, do consumismo, da competição desleal, da exploração, do desrespeito, da corrupção, do preconceito, da indiferença. Porém, “A graça de Deus se manifestou trazendo salvação para todos os homens” (Tt 2,11). Para que a luz vença as trevas é preciso, porém, que o ser humano abandone a “impiedade e as paixões mundanas” vivendo “neste mundo com equilíbrio, justiça e piedade” (Tt 2,12).

A sociedade pós-moderna e neoliberal sufoca o sentido do Natal. E os cristãos vão perdendo de vista seu sentido verdadeiro. As compras de presentes e mais presentes, despesas inúteis, gastos e festas com verniz de generosidade, bondade e emoção. Ações de momento que não trazem a libertação verdadeira do ser humano. Pelo contrário, costuma aprisioná-lo ainda mais nas malhas de uma ideologia assistencialista, por vezes marcada por um espiritualismo alienante ou uma fé emocionalista que proclama: “Deus mandou isso para você!”. “Tenha fé que você vai conseguir!”. “Levante a mão quem aceita a salvação”. “Tive uma revelação: você está sendo curado nesse momento”. Fica parecendo que as dificuldades da vida se resolvem como num passe de mágica! Vamos sair dessa fé infantil e artificial e viver uma fé mais madura, mais consistente! Chega de enganar as pessoas ou de iludir-se a si mesmo! Há programas religiosos de rádio e televisão que se dizem cristãos, mas que não têm nada a ver com o Evangelho, com Jesus de Nazaré! Insistem em mensagens que alimentam uma fé infantil, uma fé com capa cristã, mas com miolo pagão.

O Jesus que celebramos neste Natal é gente de verdade. Um menino pobre, filho de um casal de trabalhadores anônimos da Galiléia. Experimenta a condição dos excluídos: nasce entre os pastores – pois não havia lugar na hospedaria da cidade – excluídos e odiados pelos citadinos porque o rebanho era ameaça às lavouras dos proprietários de terra residentes na cidade. Não veio justificar a exclusão e a miséria que atingia (e atinge ainda hoje) a maior parte da humanidade. Nem muito menos endossar o assassinato de pequenos indefesos. – Isso foi atitude de Herodes, perseguidor de Jesus por medo de perder o poder –. Jesus, pelo contrário, veio para anunciar que o Reino de Deus é partilha, é respeito, é acolhida das diferenças, é vida em abundância para todos. E que todos nós que nos dizemos cristãos, só o seremos de fato quando nos comprometermos com o Evangelho que ele veio anunciar.

O “Filho de Davi” nasce entre os pastores na cidade de Belém, a cidade de Davi. Este rei, quando menino, era pastor. Foi consagrado para ser o pastor de Israel. Porém, assediado pelo poder, assumiu uma postura de rei poderoso. E perpetrou muitos atos de maldade e de infidelidade, muito embora tenha pedido perdão. Porém, aquele que devia ser a salvação de Israel descenderia de Davi. Ao nascer, o faz em meio aos pastores para lembrar que veio para ser pastor do rebanho, e não para servir-se das ovelhas (cf. Ez 34). – Quando olhamos para os dirigentes e legisladores de nosso País (e quase todos se dizem cristãos!), que metem a mão no dinheiro público para fazerem lobby (influência) junto ao grande capital e aos eleitores, somos acometidos por uma grande decepção e indignação: as ovelhas estão sendo devoradas e/ou abandonadas pelos lobos travestidos de pastores!

O sinal para identificar o menino é também interessante: “Um recém-nascido envolto em faixas e deitado numa manjedoura”. É o sinal da mudança de valores: aqueles que esperavam um Messias poderoso não poderão encontrá-lo. A salvação brota do meio dos marginalizados, dos simples, dos pequeninos. Os sinais para encontrá-lo não são luzes brilhantes, nem milagres estupendos, nem roupas de grife. Mas “um recém-nascido envolto em faixas”. Ademais os primeiros a visitá-lo não são os dignitários da cidade, mas os simples pastores. Sua presença como primeiras testemunhas do nascimento do Salvador evidencia a gratuidade e simplicidade de Deus, que dispensa aparatos oficiais.

Eis, pois, a grande Luz que nos enche de alegria. Experimentar e contemplar a salvação de Deus, em Jesus, deve ser motivo de profunda alegria para todos nós: “Eis que eu vos anuncio uma grande alegria”. Renunciando às trevas do egoísmo, colocamo-nos na grande Luz de Deus. Nesse encontro amoroso e gratuito com o Senhor, somos fortalecidos para continuar trabalhando em favor dos excluídos, dissipando as trevas com a luz que recebemos de Deus na participação da vida divina que nos mereceu Jesus pela sua morte e ressurreição. Então não precisamos temer as trevas, pois em Jesus recebemos “graça sobre graça” (Jo 1,16).

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POR QUE 25 DE DEZEMBRO?

Muita gente pensa que o dia 25 de dezembro é a data do aniversário de Jesus. Porém é preciso esclarecer que não se tem nenhum registro do dia nem do mês em que Jesus nasceu. O que se sabe com bastante certeza é que terá nascido entre os anos 04 e 06 antes da Era Cristã.

E como se estabeleceu o dia 25 de dezembro para celebrar o Natal do Senhor? É que na Roma Antiga, nesta data, se celebrava o “Nascimento do Sol Invicto”. Ou seja, na noite mais longa e no dia mais curto, devido à distância entre o sol e a linha do equador, acreditava-se que o sol “renascia”. Era o solstício do inverno, ou seja, o retorno do sol que marcava o fim do inverno e início do verão. Como o sol representava uma divindade pagã, 25 de dezembro era dia de festa religiosa. Ora, a Igreja, com a sabedoria que lhe é própria, valeu-se deste fato para introduzir os cristãos na celebração daquele que é o Sol que não tem ocaso, a Luz definitiva da vida do fiel, o “Sol Invicto”. Assim, os pagãos que se convertiam à fé eram introduzidos na celebração de Jesus Cristo, a “Sol nascente que brilha nas trevas” (cf. Lc 1, 78-79). A festa pagã foi cristianizada.

Se na Igreja Romana se celebra o Natal no dia 25 de dezembro pelas razões aludidas, a Igreja Oriental celebra esta mesma solenidade no dia 06 de janeiro, denominando-a Epifania, Manifestação do Senhor. Neste dia os cristãos de rito oriental celebram numa mesma liturgia o nascimento do Salvador e a visita dos Reis Magos (Dia de Reis).

O que tudo isso importa para nós? Que a liturgia da Igreja é sempre uma busca de inculturar a fé na realidade que vivemos. Símbolos e celebrações pagãs foram cristianizados e introduzidos na liturgia cristã para que o ensinamento e a vida de Jesus encontrem ressonância dentro de nós e nos ajudem a transparecer na vida cotidiana as realidades que celebramos na liturgia.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

 

Uma grande alegria: Deus está no meio de nós

aureliano, 24.12.21

Natal 2019.jpg

Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo [25 de dezembro de 2021]

[Lc 2,1-14]

Durante quatro semanas viemos nos preparando para a celebração do Natal. A cada domingo uma vela era acesa na Coroa do Advento. O acender progressivo das velas – uma por semana – quis significar a Luz que brilhou progressivamente nas trevas. A expectativa dessa Luz vem de longa data. No século VIII a. C., o Primeiro Isaías já a anunciava: “O povo que andava na escuridão viu uma grande luz; para os que habitavam as sombras da morte uma luz resplandeceu” (Is 9,10).

As trevas são o egoísmo que insiste em impedir a entrada da Luz de Deus na história, no coração humano. A força da luz, porém, é maior do que as trevas do pecado. Embora este insista em prevalecer através da ganância, do consumismo, da competição desleal, da exploração, do desrespeito, da corrupção, do preconceito, da indiferença. Porém, “A graça de Deus se manifestou trazendo salvação para todos os homens” (Tt 2,11). Para que a luz vença as trevas é preciso, porém, que o ser humano abandone a “impiedade e as paixões mundanas” vivendo “neste mundo com equilíbrio, justiça e piedade” (Tt 2,12).

A sociedade pós-moderna e neoliberal sufoca o sentido do Natal. E os cristãos vão perdendo de vista seu sentido verdadeiro. As compras de presentes e mais presentes, despesas inúteis, gastos e festas com verniz de generosidade, bondade e emoção. Ações de momento que não trazem a libertação verdadeira do ser humano. Pelo contrário, costuma aprisioná-lo ainda mais nas malhas de uma ideologia assistencialista, por vezes marcada por um espiritualismo alienante ou uma fé emocionalista que proclama: “Deus mandou isso para você!”. “Tenha fé que você vai conseguir!”. “Levante a mão quem aceita a salvação”. “Tive uma revelação: você está sendo curado nesse momento”. Fica parecendo que as dificuldades da vida se resolvem como num passe de mágica! Vamos sair dessa fé infantil e artificial e viver uma fé mais madura, mais consistente! Chega de enganar as pessoas ou de iludir-se a si mesmo! Há programas religiosos de rádio e televisão que se dizem cristãos, mas que não têm nada a ver com o Evangelho, com Jesus de Nazaré! Insistem em mensagens que alimentam uma fé infantil, uma fé com capa cristã, mas com miolo pagão.

O Jesus que celebramos neste Natal é gente de verdade. Um menino pobre, filho de um casal de trabalhadores anônimos da Galiléia. Experimenta a condição dos excluídos: nasce entre os pastores – pois não havia lugar na hospedaria da cidade – excluídos e odiados pelos citadinos porque o rebanho era ameaça às lavouras dos proprietários de terra residentes na cidade. Não veio justificar a exclusão e a miséria que atingia (e atinge ainda hoje) a maior parte da humanidade. Nem muito menos endossar o assassinato de pequenos indefesos. – Isso foi atitude de Herodes, perseguidor de Jesus por medo de perder o poder –. Jesus, pelo contrário, veio para anunciar que o Reino de Deus é partilha, é respeito, é acolhida das diferenças, é vida em abundância para todos. E que todos nós que nos dizemos cristãos, só o seremos de fato quando nos comprometermos com o Evangelho que ele veio anunciar.

O “Filho de Davi” nasce entre os pastores na cidade de Belém, a cidade de Davi. Este rei, quando menino, era pastor. Foi consagrado para ser o pastor de Israel. Porém, assediado pelo poder, assumiu uma postura de rei poderoso. E perpetrou muitos atos de maldade e de infidelidade, muito embora tenha pedido perdão. Porém, aquele que devia ser a salvação de Israel descenderia de Davi. Ao nascer, o faz em meio aos pastores para lembrar que veio para ser pastor do rebanho, e não para se servir das ovelhas (cf. Ez 34). – Quando olhamos para os dirigentes e legisladores de nosso País (e quase todos se dizem cristãos!), que metem a mão no dinheiro público para fazerem lobby (influência) junto ao grande capital e aos eleitores, somos acometidos por uma grande decepção e indignação: as ovelhas estão sendo devoradas e/ou abandonadas pelos lobos travestidos de pastores!

O sinal para identificar o menino é também interessante: “Um recém-nascido envolto em faixas e deitado numa manjedoura”. É o sinal da mudança de valores: aqueles que esperavam um Messias poderoso não poderão encontrá-lo. A salvação brota do meio dos marginalizados, dos simples, dos pequeninos. Os sinais para encontrá-lo não são luzes brilhantes, nem milagres estupendos, nem roupas de grife. Mas “um recém-nascido envolto em faixas”. Ademais os primeiros a visitá-lo não são os dignitários da cidade, mas os simples pastores. Sua presença como primeiras testemunhas do nascimento do Salvador evidencia a gratuidade e simplicidade de Deus, que dispensa aparatos oficiais.

Eis, pois, a grande Luz que nos enche de alegria. Experimentar e contemplar a salvação de Deus, em Jesus, deve ser motivo de profunda alegria para todos nós: “Eis que eu vos anuncio uma grande alegria”. Renunciando às trevas do egoísmo, colocamo-nos na grande Luz de Deus. Nesse encontro amoroso e gratuito com o Senhor, somos fortalecidos para continuar trabalhando em favor dos excluídos, dissipando as trevas com a luz que recebemos de Deus na participação da vida divina que nos mereceu Jesus pela sua morte e ressurreição. Então não precisamos temer as trevas, pois em Jesus recebemos “graça sobre graça” (Jo 1,16).

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POR QUE 25 DE DEZEMBRO?

Muita gente pensa que o dia 25 de dezembro é a data do aniversário de Jesus. Porém é preciso esclarecer que não se tem nenhum registro do dia nem do mês em que Jesus nasceu. O que se sabe com bastante certeza é que terá nascido entre os anos 04 e 06 antes da Era Cristã.

E como se estabeleceu o dia 25 de dezembro para celebrar o Natal do Senhor? É que em Roma, nesta data, se celebrava o “Nascimento do Sol Invicto”. Ou seja, na noite mais longa e no dia mais curto, devido à distância entre o sol e a linha do equador, acreditava-se que o sol “renascia”. Era o solstício do inverno, ou seja, a volta do sol que marcava o fim do inverno e início do verão. Como o sol representava uma divindade pagã, 25 de dezembro era dia de festa religiosa. Ora, a Igreja, com a sabedoria que lhe é própria, valeu-se deste fato para introduzir os cristãos na celebração daquele que é o Sol que não tem ocaso, a Luz definitiva da vida do fiel, o “Sol Invicto”. Assim, os pagãos que se convertiam à fé eram introduzidos na celebração de Jesus Cristo, a “Sol nascente que brilha nas trevas” (cf. Lc 1, 78-79). A festa pagã foi cristianizada.

Se na Igreja Romana se celebra o Natal no dia 25 de dezembro pelas razões aludidas, a Igreja Oriental celebra esta mesma solenidade no dia 06 de janeiro, denominando-a Epifania, Manifestação do Senhor. Neste dia os cristãos de rito oriental celebram numa mesma liturgia o nascimento do Salvador e a visita dos Reis Magos (Dia de Reis).

O que tudo isso importa para nós? Que a liturgia da Igreja é sempre uma busca de inculturar a fé na realidade que vivemos. Símbolos e celebrações pagãs foram cristianizados e introduzidos na liturgia cristã para que o ensinamento e a vida de Jesus encontrem ressonância dentro de nós e nos ajudem a transparecer na vida cotidiana as realidades que celebramos na liturgia.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

Uma grande alegria: Deus no meio de nós!

aureliano, 24.12.20

Natal 2020.JPG

Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo [25 de dezembro de 2020]

[Lc 2,1-14]

Durante quatro semanas viemos nos preparando para a celebração do Natal. A cada domingo uma vela era acesa na Coroa do Advento. O acender progressivo das velas – uma por semana – quis significar a Luz que brilhou progressivamente nas trevas. A expectativa dessa Luz vem de longa data. No século VIII a. C., o Primeiro Isaías já a anunciava: “O povo que andava na escuridão viu uma grande luz; para os que habitavam as sombras da morte uma luz resplandeceu” (Is 9,10).

As trevas são o egoísmo que insiste em impedir a entrada da Luz de Deus na história, no coração humano. A força da luz, porém, é maior do que as trevas do pecado. Embora este insista em prevalecer através da ganância, do consumismo, da competição desleal, da exploração, do desrespeito, da corrupção, do preconceito, da indiferença. Porém, “A graça de Deus se manifestou trazendo salvação para todos os homens” (Tt 2,11). Para que a luz vença as trevas é preciso, porém, que o ser humano abandone a “impiedade e as paixões mundanas” vivendo “neste mundo com equilíbrio, justiça e piedade” (Tt 2,12).

A sociedade pós-moderna e neoliberal sufoca o sentido do Natal. E os cristãos vão perdendo de vista seu sentido verdadeiro. As compras de presentes e mais presentes, despesas inúteis, gastos e festas com verniz de generosidade, bondade e emoção. Ações de momento que não trazem a libertação verdadeira do ser humano. Pelo contrário, costuma aprisioná-lo ainda mais nas malhas de uma ideologia assistencialista, por vezes marcada por um espiritualismo alienante ou uma fé emocionalista que proclama: “Deus mandou isso para você!”. “Tenha fé que você vai conseguir!”. “Levante a mão quem aceita a salvação”. “Tive uma revelação: você está sendo curado nesse momento”. Fica parecendo que as dificuldades da vida se resolvem como num passe de mágica! Espere aí, gente! Vamos sair dessa fé infantil e artificial e viver uma fé mais madura, mais consistente! Chega de enganar as pessoas ou de iludir-se a si mesmo! Há programas religiosos de rádio, televisão e internet que se dizem cristãos, mas que não têm nada a ver com o Evangelho, com Jesus de Nazaré! Insistem em mensagens que alimentam uma fé infantil, uma fé com capa cristã, mas com miolo pagão.

O Jesus que celebramos neste Natal é gente de verdade. Um menino pobre, filho de um casal de trabalhadores anônimos da Galiléia. Experimenta a condição dos excluídos: nasce entre os pastores – pois não havia lugar na hospedaria da cidade – excluídos e odiados pelos citadinos porque o rebanho era ameaça às lavouras dos proprietários de terra residentes na cidade. Não veio justificar a exclusão e a miséria que atingia (e atinge ainda hoje) a maior parte da humanidade. Nem muito menos endossar o assassinato de pequenos indefesos. – Isso foi atitude de Herodes, perseguidor de Jesus por medo de perder o poder –. Jesus, pelo contrário, veio para anunciar que o Reino de Deus é partilha, é respeito, é acolhida das diferenças, é vida em abundância para todos. E que todos nós que nos dizemos cristãos, só o seremos de fato quando nos comprometermos com o Evangelho que ele veio anunciar.

O “Filho de Davi” nasce entre os pastores na cidade de Belém, a cidade de Davi. Este rei, quando menino, era pastor. Foi consagrado para ser o pastor de Israel. Porém, assediado pelo poder, assumiu uma postura de rei poderoso. E perpetrou muitos atos de maldade e de infidelidade, muito embora tenha pedido perdão. Porém, aquele que devia ser a salvação de Israel descenderia de Davi. Ao nascer, o faz em meio aos pastores para lembrar que veio para ser pastor do rebanho, e não para se servir das ovelhas (cf. Ez 34). – Quando olhamos para os dirigentes e legisladores de nosso País (e quase todos se dizem cristãos!), que metem a mão no dinheiro público para fazerem lobby (influência) junto ao grande capital e aos eleitores, somos acometidos por uma grande decepção e indignação: as ovelhas estão sendo devoradas e/ou abandonadas pelos lobos travestidos de pastores!

O sinal para identificar o menino é também interessante: “Um recém-nascido envolto em faixas e deitado numa manjedoura”. É o sinal da mudança de valores: aqueles que esperavam um Messias poderoso não poderão encontrá-lo. A salvação brota do meio dos marginalizados, dos simples, dos pequeninos. Os sinais para encontrá-lo não são luzes brilhantes, nem milagres estupendos, nem roupas de grife. Mas “um recém-nascido envolto em faixas”. Ademais os primeiros a visitá-lo não são os dignitários da cidade, mas os simples pastores. Sua presença como primeiras testemunhas do nascimento do Salvador evidencia a gratuidade e simplicidade de Deus, que dispensa aparatos oficiais.

Eis, pois, a grande Luz que nos enche de alegria. Experimentar e contemplar a salvação de Deus, em Jesus, deve ser motivo de profunda alegria para todos nós: “Eis que eu vos anuncio uma grande alegria”. Renunciando às trevas do egoísmo, colocamo-nos na grande Luz de Deus. Nesse encontro amoroso e gratuito com o Senhor, somos fortalecidos para continuar trabalhando em favor dos excluídos, dissipando as trevas com a luz que recebemos de Deus na participação da vida divina que nos mereceu Jesus pela sua morte e ressurreição. Então não precisamos temer as trevas, pois em Jesus recebemos “graça sobre graça” (Jo 1,16).

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POR QUE 25 DE DEZEMBRO?

Muita gente pensa que o dia 25 de dezembro é a data do aniversário de Jesus. Porém é preciso esclarecer que não se tem nenhum registro do dia nem do mês em que Jesus nasceu. O que se sabe com bastante certeza é que terá nascido entre os anos 04 e 06 antes da Era Cristã.

E como se estabeleceu o dia 25 de dezembro para celebrar o Natal do Senhor? É que em Roma, nesta data, se celebrava o “Nascimento do Sol invicto”. Ou seja, na noite mais longa e no dia mais curto, devido à distância entre o sol e a linha do equador, acreditava-se que o sol “renascia”. Era o solstício do inverno, ou seja, a volta do sol que marcava o fim do inverno e início do verão. Como o sol representava uma divindade pagã, 25 de dezembro era dia de festa religiosa. Ora, a Igreja, com a sabedoria que lhe é própria, valeu-se deste fato para introduzir os cristãos na celebração daquele que é o Sol que não tem ocaso, a Luz definitiva da vida do fiel, o “Sol Invicto”. Assim, os pagãos que se convertiam à fé eram introduzidos na celebração de Jesus Cristo, a “Sol nascente que brilha nas trevas” (cf. Lc 1, 78-79). A festa pagã foi cristianizada.

Se na Igreja Romana se celebra o Natal no dia 25 de dezembro pelas razões aludidas, a Igreja Oriental celebra esta mesma solenidade no dia 06 de janeiro, denominando-a Epifania, Manifestação do Senhor. Neste dia os cristãos de rito oriental celebram numa mesma liturgia o nascimento do Salvador e a visita dos Reis Magos (Dia de Reis).

O que tudo isso importa para nós? Que a liturgia da Igreja é sempre uma busca de inculturar a fé na realidade que vivemos. Símbolos e celebrações pagãs foram cristianizados e introduzidos na liturgia cristã para que o ensinamento e a vida de Jesus encontrem ressonância dentro de nós e nos ajudem a transparecer na vida cotidiana as realidades que celebramos na liturgia.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

Uma luz brilhou nas trevas

aureliano, 24.12.19

Natal 2019.jpg

Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo [25 de dezembro de 2019]

[Lc 2,1-14]

Durante quatro semanas viemos nos preparando para a celebração do Natal. A cada domingo uma vela era acesa na Coroa do Advento. O acender progressivo das velas – uma por semana – quis significar a Luz que brilhou progressivamente nas trevas. A expectativa dessa Luz vem de longa data. No século VIII a. C., o Primeiro Isaías já a anunciava: “O povo que andava na escuridão viu uma grande luz; para os que habitavam as sombras da morte uma luz resplandeceu” (Is 9,10).

As trevas são o egoísmo que insiste em impedir a entrada da Luz de Deus na história, no coração humano. A força da luz, porém, é maior do que as trevas do pecado. Embora este insista em prevalecer através da ganância, do consumismo, da competição desleal, da exploração, do desrespeito, da corrupção, do preconceito, da indiferença. Porém, “A graça de Deus se manifestou trazendo salvação para todos os homens” (Tt 2,11). Para que a luz vença as trevas é preciso, porém, que o ser humano abandone a “impiedade e as paixões mundanas” vivendo “neste mundo com equilíbrio, justiça e piedade” (Tt 2,12).

A sociedade pós-moderna e neoliberal sufoca o sentido do Natal. E os cristãos vão perdendo de vista seu sentido verdadeiro. As compras de presentes e mais presentes, despesas inúteis, gastos e festas com verniz de generosidade, bondade e emoção. Ações de momento que não trazem a libertação verdadeira do ser humano. Pelo contrário, costuma aprisioná-lo ainda mais nas malhas de uma ideologia assistencialista, por vezes marcada por um espiritualismo alienante ou uma fé emocionalista que proclama: “Deus mandou isso para você!”. “Tenha fé que você vai conseguir!”. “Levante a mão quem aceita a salvação”. “Tive uma revelação: você está sendo curado nesse momento”. Fica parecendo que as dificuldades da vida se resolvem como num passe de mágica! Espere aí, gente! Vamos sair dessa fé infantil e artificial e viver uma fé mais madura, mais consistente! Chega de enganar as pessoas ou de iludir-se a si mesmo! Há programas religiosos de rádio e televisão que se dizem cristãos, mas que não têm nada a ver com o Evangelho, com Jesus de Nazaré! Insistem em mensagens que alimentam uma fé infantil, uma fé com capa cristã, mas com miolo pagão.

O Jesus que celebramos neste Natal é gente de verdade. Um menino pobre, filho de um casal de trabalhadores anônimos da Galiléia. Experimenta a condição dos excluídos: nasce entre os pastores – pois não havia lugar na hospedaria da cidade – excluídos e odiados pelos citadinos porque o rebanho era ameaça às lavouras dos proprietários de terra residentes na cidade. Não veio justificar a exclusão e a miséria que atingia (e atinge ainda hoje) a maior parte da humanidade. Nem muito menos endossar o assassinato de pequenos indefesos. – Isso foi atitude de Herodes, perseguidor de Jesus por medo de perder o poder –. Jesus, pelo contrário, veio para anunciar que o Reino de Deus é partilha, é respeito, é acolhida das diferenças, é vida em abundância para todos. E que todos nós que nos dizemos cristãos, só o seremos de fato quando nos comprometermos com o Evangelho que ele veio anunciar.

O “Filho de Davi” nasce entre os pastores na cidade de Belém, a cidade de Davi. Este rei, quando menino, era pastor. Foi consagrado para ser o pastor de Israel. Porém, assediado pelo poder, assumiu uma postura de rei poderoso. E perpetrou muitos atos de maldade e de infidelidade, muito embora tenha pedido perdão. Porém, aquele que devia ser a salvação de Israel descenderia de Davi. Ao nascer, o faz em meio aos pastores para lembrar que veio para ser pastor do rebanho, e não para se servir das ovelhas (cf. Ez 34). – Quando olhamos para os dirigentes e legisladores de nosso País (e quase todos se dizem cristãos!), que metem a mão no dinheiro público para fazerem lobby (influência) junto ao grande capital e aos eleitores, somos acometidos por uma grande decepção e indignação: as ovelhas estão sendo devoradas e/ou abandonadas pelos lobos travestidos de pastores!

O sinal para identificar o menino é também interessante: “Um recém-nascido envolto em faixas e deitado numa manjedoura”. É o sinal da mudança de valores: aqueles que esperavam um Messias poderoso não poderão encontrá-lo. A salvação brota do meio dos marginalizados, dos simples, dos pequeninos. Os sinais para encontrá-lo não são luzes brilhantes, nem milagres estupendos, nem roupas de grife. Mas “um recém-nascido envolto em faixas”. Ademais os primeiros a visitá-lo não são os dignitários da cidade, mas os simples pastores. Sua presença como primeiras testemunhas do nascimento do Salvador evidencia a gratuidade e simplicidade de Deus, que dispensa aparatos oficiais.

Eis, pois, a grande Luz que nos enche de alegria. Experimentar e contemplar a salvação de Deus, em Jesus, deve ser motivo de profunda alegria para todos nós: “Eis que eu vos anuncio uma grande alegria”. Renunciando às trevas do egoísmo, colocamo-nos na grande Luz de Deus. Nesse encontro amoroso e gratuito com o Senhor, somos fortalecidos para continuar trabalhando em favor dos excluídos, dissipando as trevas com a luz que recebemos de Deus na participação da vida divina que nos mereceu Jesus pela sua morte e ressurreição. Então não precisamos temer as trevas, pois em Jesus recebemos “graça sobre graça” (Jo 1,16).

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POR QUE 25 DE DEZEMBRO?

Muita gente pensa que o dia 25 de dezembro é a data do aniversário de Jesus. Porém é preciso esclarecer que não se tem nenhum registro do dia nem do mês em que Jesus nasceu. O que se sabe com bastante certeza é que terá nascido entre os anos 04 e 06 antes da Era Cristã.

E como se estabeleceu o dia 25 de dezembro para celebrar o Natal do Senhor? É que em Roma, nesta data, se celebrava o “Nascimento do Sol invicto”. Ou seja, na noite mais longa e no dia mais curto, devido à distância entre o sol e a linha do equador, acreditava-se que o sol “renascia”. Era o solstício do inverno, ou seja, a volta do sol que marcava o fim do inverno e início do verão. Como o sol representava uma divindade pagã, 25 de dezembro era dia de festa religiosa. Ora, a Igreja, com a sabedoria que lhe é própria, valeu-se deste fato para introduzir os cristãos na celebração daquele que é o Sol que não tem ocaso, a Luz definitiva da vida do fiel, o “Sol Invicto”. Assim, os pagãos que se convertiam à fé eram introduzidos na celebração de Jesus Cristo, a “Sol nascente que brilha nas trevas” (cf. Lc 1, 78-79). A festa pagã foi cristianizada.

Se na Igreja Romana se celebra o Natal no dia 25 de dezembro pelas razões aludidas, a Igreja Oriental celebra esta mesma solenidade no dia 06 de janeiro, denominando-a Epifania, Manifestação do Senhor. Neste dia os cristãos de rito ortodoxo celebram numa mesma liturgia o nascimento do Salvador e a visita dos Reis Magos (Dia de Reis).

O que tudo isso importa para nós? Que a liturgia da Igreja é sempre uma busca de inculturar a fé na realidade que vivemos. Símbolos e celebrações pagãs foram cristianizados e introduzidos na liturgia cristã para que o ensinamento e a vida de Jesus encontrem ressonância dentro de nós e nos ajudem a transparecer na vida cotidiana as realidades que celebramos na liturgia.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

Viver preparados para o Juízo

aureliano, 29.11.19

1º Domingo do Advento - 1º de dezembro - A.jpg

1º Domingo do Advento [1º de dezembro de 2019]

[Mt 24,37-44]

Estamos no Advento! Tempo litúrgico conhecido como preparação para o Natal. Mas na verdade é um tempo de celebrar a vinda do Senhor. Ele veio uma primeira vez historicamente, na Palestina. Ele virá uma segunda vez em sua glória para “julgar os vivos e os mortos”. E ele continua vindo no presente da Igreja, que deve se empenhar para ser sinal de sua presença no mundo.

O comércio se vale deste momento para vender, comprar, ganhar dinheiro. É preciso, porém, ter cuidado para não fazer deste tempo uma ocasião de festas sem aquela preocupação basilar de que falam as leituras da liturgia deste domingo: “Deixemos as obras das trevas e vistamos a armadura da luz... andemos decentemente; não em orgias e bebedeiras, nem em devassidão e libertinagem, nem em rixas e ciúmes” (Rm 13,12-13). E ainda: “Ficai preparados, porque o Filho do Homem virá numa hora que não pensais” (Mt 24,44).

Não quero, com isso, negar a importância da festa, do encontro familiar, do descanso, da dança, da música, das alegrias ao redor da mesa. O que deve, porém, caracterizar nossas festas é a dimensão cristã destas festividades. Não perder o sentimento de solidariedade: não esbanjar, desperdiçar; não fechar o coração ao pobre e necessitado; buscar a reconciliação, o perdão, a celebração, a partilha. São elementos que “batizam” as nossas festas natalinas.

O Evangelho fala de três situações que mostram a importância de estarmos preparados. No episódio bíblico do dilúvio ninguém se interessou pela arca que Noé preparava. É uma advertência para estarmos conscientes de que o fim é inevitável. É preciso ouvir e ver os sinais de Deus manifestos nos gestos das pessoas. Sobre a narrativa em que as mulheres e os homens estão trabalhando (cf. Mt 24,40-41), é interessante notar que as pessoas estavam fazendo as mesmas atividades, no entanto “uma será tirada e outra será deixada”. Jesus quer dizer que o importante não é o que se está fazendo, mas o modo como cada um age no seu cotidiano. O cristão faz o mesmo que todos fazem, mas com o diferencial de fazê-lo à maneira de Jesus. Não há necessidade de ações heróicas, mirabolantes, de propósitos impossíveis de serem cumpridos. O que o Senhor quer é que nossas atitudes sejam regadas de fraternidade, de sinceridade, de compreensão, de perdão, de ajuda mútua, de solidariedade, de verdade.

Finalmente o ladrão, que sempre surpreende. Para não ser pego de surpresa é preciso vigiar, estar acordado, atento, alerta. Não podemos estar dormindo, mas viver em estado desperto à luz do Dia de Cristo, para que ele nos possa encontrar dispostos para a vida de incansável caridade que ele nos ensinou: “Tudo o que fizestes a um desses meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes” (Mt 25, 40).

Esta vigilância de que fala o evangelho deve ser carregada de esperança. Então não se pode compreender uma espera vigilante que descarta aqueles que estão ao meu lado precisando de minha colaboração. O Papa Francisco chama-nos a atenção: "Não podemos dormir tranquilos enquanto houver crianças que morrem de fome e idosos que não têm assistência médica" (17/08/2013). Então a vigilância que Jesus pede deve ser inquieta. Não basta rezar, ir à Igreja, pedir isso ou aquilo a Deus. É preciso assumir uma atitude de fiel discípulo de Jesus.

Meu pensamento e minhas ações estão voltados para Deus e seu projeto ou voltados para mim mesmo? Isso é que decide a sorte de cada um no juízo de Deus.

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“NÃO PEGARÃO EM ARMAS”

“Ele há de julgar as nações e arguir numerosos povos; estes transformarão suas espadas em arados e suas lanças em foices: não pegarão em armas contra os outros e não mais travarão combate. Vinde, todos da casa de Jacó, e deixemo-nos guiar pela luz do Senhor” (Is 2,4-5).

O texto está tratando de uma situação vivida por Israel e provocada por governantes que fazem alianças perigosas com reis de nações vizinhas. Depositam assim a confiança nas forças humanas e não em Deus. O abandono de Deus e a confiança nas próprias forças colocam em risco toda a comunidade israelita.

O profeta intervém alertando sobre a necessidade de se voltar para Deus e depositar nele a confiança e a esperança. Sobretudo de não pensar que vencerão pela força do exército e das armas. O capítulo VII de Isaías aprofunda essa temática: “Se não o crerdes não vos mantereis firmes” (Is 7,9).

Quero aqui, mais uma vez, chamar a atenção a respeito de projetos propulsores de violência como o da posse e porte de armas de fogo e de outras ações violentas defendidas por pessoas que se dizem cristãs. Esse relato da Escritura convida a transformar as armas de guerra em instrumento de produção de alimento: espadas em arados e lanças em foices.

Como é que alguém que se diz temente a Deus e que cita a Sagrada Escritura como verdade revelada por Deus, pode defender a matança, a eliminação do ser humano? Está faltando em nossa Igreja e nos cristãos de modo geral uma volta para Deus, um processo de conversão do coração. O caminho do combate à violência deve passar pelos valores do Evangelho. Jesus deve ser a meta, o horizonte, o foco, a mira do cristão. “A essas palavras, um dos guardas, que ali se achavam, deu uma bofetada em Jesus, dizendo: ‘Assim respondes ao Sumo Sacerdote?’. Respondeu Jesus: ‘Se falei mal, testemunha sobre o mal; mas, se falei bem, por que me bates?’”(Jo 18, 22-23). A contemplação dessa cena da Paixão do Senhor pode nos ajudar a aprender do Mestre de Nazaré a atitude de reconciliação e de paz já recomendada pelo profeta: “Eles não pegarão mais em armas uns contra os outros” (Is 2,4).

Como estamos nos preparando para celebrar o Natal do Senhor, do Príncipe da Paz? Com pensamentos de paz, de reconciliação, de perdão? Ou de guerra, de ódio, de vingança, de destruição?

Deixo com o Papa Francisco a palavra final:

“Com a convicção de que é possível e necessário um mundo sem armas nucleares, peço aos líderes políticos para não se esquecerem de que as mesmas não nos defendem das ameaças à segurança nacional e internacional do nosso tempo.

Um dos anseios mais profundos do coração humano é o desejo de paz e estabilidade. A posse de armas nucleares e outras armas de destruição de massa não é a melhor resposta a este desejo; antes, parecem pô-lo continuamente à prova. O nosso mundo vive a dicotomia perversa de querer defender e garantir a estabilidade e a paz com base numa falsa segurança sustentada por uma mentalidade de medo e desconfiança, que acaba por envenenar as relações entre os povos e impedir a possibilidade de qualquer diálogo.

No mundo atual, onde milhões de crianças e famílias vivem em condições desumanas, o dinheiro gasto e as fortunas obtidas no fabrico, modernização, manutenção e venda de armas, cada vez mais destrutivas, são um atentado contínuo que brada ao céu.

Em 1963, o Papa São João XXIII, na Encíclica Pacem in terris, solicitando também a proibição das armas atômicas (cf. n. 112), afirmou que «a verdadeira paz entre os povos não se baseia em tal equilíbrio [em armamentos], mas sim e exclusivamente na confiança mútua» (n. 113).

Oxalá a oração, a busca incansável de promover acordos, a insistência no diálogo sejam as «armas» em que deponhamos a nossa confiança e também a fonte de inspiração dos esforços para construir um mundo de justiça e solidariedade que forneça reais garantias para a paz.

Peço-vos para nos unirmos em oração diária pela conversão das consciências e pelo triunfo duma cultura da vida, da reconciliação e da fraternidade; uma fraternidade que saiba reconhecer e garantir as diferenças na busca dum destino comum” (Excertos do discurso do Papa Francisco no Japão, em 24 de novembro de 2019).

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN

Uma luz brilhou nas trevas

aureliano, 24.12.17

Natal.jpg

Natal de Nosso Senhor Jesus Cristo [25 de dezembro de 2017]

[Lc 2,1-14]

Durante quatro semanas viemos nos preparando para a celebração do Natal. A cada domingo uma vela era acesa na Coroa do Advento. O acender progressivo das velas – uma por semana – quis significar a Luz que brilhou progressivamente nas trevas. A expectativa dessa Luz vem de longa data. No século VIII a. C. o Primeiro Isaías já a anunciava: “O povo que andava na escuridão viu uma grande luz; para os que habitavam as sombras da morte uma luz resplandeceu” (Is 9,10).

As trevas são o egoísmo que insiste em impedir a entrada da Luz de Deus na história, no coração humano. A força da luz, porém é maior do que as trevas do pecado. Embora este insista em prevalecer através da ganância, do consumismo, da competição desleal, da exploração, do desrespeito, da corrupção, do preconceito, da indiferença. Porém, “A graça de Deus se manifestou trazendo salvação para todos os homens” (Tt 2,11). Para que a luz vença as trevas é preciso, porém, que o ser humano abandone a “impiedade e as paixões mundanas” vivendo “neste mundo com equilíbrio, justiça e piedade” (Tt 2,12).

A sociedade pós-moderna e neoliberal sufoca o sentido do Natal. E os cristãos vão perdendo de vista seu sentido verdadeiro. As compras de presentes e mais presentes, despesas inúteis, gastos e festas com verniz de generosidade, bondade e emoção. Ações de momento que não trazem a libertação verdadeira do ser humano. Pelo contrário, costuma aprisioná-lo ainda mais nas malhas de uma ideologia assistencialista, por vezes marcada por um espiritualismo alienante ou uma fé emocionalista que proclama: “Deus mandou isso para você!”. “Tenha fé que você vai conseguir!”. “Levante as mãos quem aceita a salvação”. “Tive uma revelação: você está sendo curado nesse momento”. Fica parecendo que as dificuldades da vida se resolvem como num passe de mágica! Espere aí, gente! Vamos sair dessa fé infantil e viver uma fé mais madura, mais consistente! Chega de enganar as pessoas ou de iludir-se a si mesmo! Há programas de televisão que se dizem cristãos, mas que não têm nada a ver com o Evangelho, com Jesus de Nazaré.

O Jesus que celebramos neste Natal é gente de verdade. Um menino pobre, filho de um casal de trabalhadores anônimos da Galiléia. Experimenta a condição dos excluídos: nasce entre os pastores – pois não havia lugar na hospedaria da cidade – excluídos e odiados pelos citadinos porque o rebanho era ameaça às lavouras dos proprietários de terra residentes na cidade. Não veio justificar a exclusão e a miséria que atingia (e atinge ainda hoje) a maior parte da humanidade. Pelo contrário, veio para anunciar que o Reino de Deus é partilha, é vida em abundância para todos. E que todos nós que nos dizemos cristãos, só o seremos de fato quando nos comprometermos com Evangelho que ele veio anunciar.

O “Filho de Davi” nasce entre os pastores na cidade de Belém, a cidade de Davi. Este rei, quando menino, era pastor. Foi consagrado para ser o pastor de Israel. Porém, assediado pelo poder, assumiu uma postura de rei poderoso. E perpetrou muitos atos de maldade e de infidelidade, muito embora tenha pedido perdão. Porém, aquele que devia ser a salvação de Israel descenderia de Davi. Ao nascer, o faz em meio aos pastores para lembrar que veio para ser pastor do rebanho, e não para se servir das ovelhas (cf. Ez 34). – Quando olhamos para os dirigentes e legisladores de nosso País (e quase todos se dizem cristãos!), que metem a mão no dinheiro público para fazerem lobby (influência) junto ao grande capital e aos eleitores, somos acometidos por uma grande decepção e indignação: as ovelhas estão sendo devoradas e/ou abandonadas pelos lobos travestidos de pastores!

O sinal para identificar o menino é também interessante: “Um recém-nascido envolto em faixas e deitado numa manjedoura”. É o sinal da mudança de valores: aqueles que esperavam um Messias poderoso não poderão encontrá-lo. A salvação brota do meio dos marginalizados, dos simples, dos pequeninos. Os sinais para encontrá-lo não são luzes brilhantes, nem milagres estupendos, nem roupas de grife. Mas “um recém-nascido envolto em faixas”. Ademais os primeiros a visitá-lo não são os dignitários da cidade, mas os simples pastores. Sua presença como primeiras testemunhas do nascimento do Salvador evidencia a gratuidade e simplicidade de Deus, que dispensa aparatos oficiais.

Eis, pois, a grande Luz que nos enche de alegria. Experimentar e contemplar a salvação de Deus, em Jesus, deve ser motivo de profunda alegria para todos nós: “Eis que eu vos anuncio uma grande alegria”. Renunciando às trevas do egoísmo, colocamo-nos na grande Luz de Deus. Nesse encontro amoroso e gratuito com o Senhor, somos fortalecidos para continuar trabalhando em favor dos excluídos, dissipando as trevas com a luz que recebemos de Deus na participação da vida divina que nos mereceu Jesus pela sua morte e ressurreição. Então não precisamos temer as trevas, pois em Jesus recebemos “graça sobre graça” (Jo 1,16).

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POR QUE 25 DE DEZEMBRO?

Muita gente pensa que o dia 25 de dezembro é a data do aniversário de Jesus. Porém é preciso esclarecer que não se tem nenhum registro do dia nem do mês em que Jesus nasceu. O que se sabe com bastante certeza é que terá nascido entre os anos 04 e 06 antes da Era Cristã.

E como se estabeleceu o dia 25 de dezembro para celebrar o Natal do Senhor? É que em Roma, nesta data, se celebrava o “Nascimento do Sol invicto”. Ou seja, na noite mais longa e no dia mais curto, devido à distância entre o sol e a linha do equador, acreditava-se que o sol “renascia”. Era o solstício do inverno, ou seja, a volta do sol que marcava o fim do inverno e início do verão. Como o sol representava uma divindade pagã, 25 de dezembro era dia de festa religiosa. Ora, a Igreja, com a sabedoria que lhe é própria, valeu-se deste fato para introduzir os cristãos na celebração daquele que é o Sol que não tem ocaso, a Luz definitiva da vida do fiel, o “Sol Invicto”. Assim, os pagãos que se convertiam à fé eram introduzidos na celebração de Jesus Cristo, a “Sol nascente que brilha nas trevas” (cf. Lc 1, 78-79). A festa pagã foi cristianizada.

Se na Igreja Romana se celebra o Natal no dia 25 de dezembro pelas razões aludidas, a Igreja Oriental celebra esta mesma solenidade no dia 06 de janeiro, denominando-a Epifania, manifestação do Senhor. Neste dia os cristãos de rito ortodoxo celebram numa mesma liturgia o nascimento do Salvador e a visita dos Reis Magos (Dia de Reis).

O que tudo isso importa para nós? Que a liturgia da Igreja é sempre uma busca de inculturar a fé na realidade que vivemos. Símbolos e celebrações pagãs foram cristianizados e introduzidos na liturgia cristã para que o ensinamento e a vida de Jesus encontrem ressonância dentro de nós e nos ajudem a transparecer na vida cotidiana as realidades que celebramos na liturgia.

Pe. Aureliano de Moura Lima, SDN